Nesta semana, nossa reflexão será sobre o episódio que causou polêmica e provocou sentimentos ambíguos em muitos educadores: o vídeo que mostra a atitude do aluno de sete anos quebrando o que vê pela frente e a postura dos adultos em uma escola do município de Macaé, no Rio de Janeiro.
Após a perplexidade que nos rouba durante alguns segundos nossa capacidade de raciocinar, enquanto assistia ao vídeo eu dizia (para mim mesma): “Não o deixem continuar! Contenham-no! Acolham-no!”. E imediatamente me dei conta de que, se os adultos presentes naquele triste episódio pudessem me ouvir, perguntariam: “Mas o que fazer? Como contê-lo?”. Junto com as questões, viriam observações do tipo: “Se colocarmos a mão em uma criança nesse estado certamente seremos acusados por maus tratos, violência, abuso etc.”. O fato é que, mais uma vez, constatamos que a formação e o preparo dos profissionais da Educação nem sempre são compatíveis com os novos desafios do cotidiano escolar.
Ficou claro que, ao não terem o domínio da situação, os adultos e profissionais presentes na sala com o garoto tomaram atitudes erradas. Eles assistiram, registraram e, de certa maneira, incentivaram a criança a extravasar sua raiva da pior maneira possível. Não saber o que fazer não pode justificar fazer o que não se deve. E divulgar as imagens, expondo um menor de idade, é um dos exemplos de algo que não se deve fazer. Da mesma maneira, incitar o menino a continuar quebrando e derrubando tudo também entra na lista. Mais desolador é justificar tais atitudes alegando a necessidade de a mãe ter conhecimento de que precisa tomar providências quanto ao filho.
A situação torna-se ainda mais grave quando, em nome da solidariedade e do corporativismo, educadores de todo o país posicionam-se contra o garoto e a sua família de maneira violenta, desrespeitosa e intolerante. Nos comentários que circularam na internet, faltou bem pouco para citarem a saudade da “palmatória” e do “joelho no milho”.
Não há como negar a complexidade de lidar com situações que envolvem explosões de fúria. A insegurança do inesperado é grande e tende a nos paralisar. No entanto, nada pode fazer o adulto deixar de agir em nome da segurança e do respeito ao próximo. Conter o garoto e acalmá-lo teria evitado boa parte do estrago material e emocional gerado pelo incidente. Quando um dos adultos chega por trás do garoto, acreditei, por um momento, que isso seria feito. Mas, infelizmente, ele é orientado e alertado para não tocá-lo. O que seria adequado? Posicionado atrás do menino, era possível abraçá-lo. Dessa maneira, ele ficaria imobilizado e falas de acolhimento poderiam ser ditas. “Acalme-se, vou te ajudar. Estou com você, não vou deixar que se machuque”.
Mas pelo que parece houve uma interpretação equivocada do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Os profissionais acreditaram que a contenção do menino seria interpretada como uma violência, sem, contudo, perceber e reconhecer como violência a exposição da imagem ou os riscos físicos oferecidos por aquele comportamento. Uma visão reducionista de um documento que visa, sobretudo, proteger a integridade física, moral e psicológica das crianças e adolescentes.
Recentemente, a especialista Adriana Ramos, minha colega do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral da Universidade de Campinas (Gepem/Unicamp) e coordenadora do curso de pós-graduação A convivência ética na escola no Instituto Vera Cruz, orientou uma turma de leitores da revista Nova Escola no estudo sobre o tema Violência Institucional na Escola. Nele, ela abordou aspectos importantes e levantou questões que podemos relacionar a esse episódio: Como um fato tão grave chega a esse ponto – trata-se de uma criança com algum diagnóstico patológico? Houve algum disparador? Será que atitudes e comportamentos inadequados dos alunos são de responsabilidade somente da Educação familiar? Qual a representação de respeito presente na escola: a concepção de obediência unilateral à autoridade ou a de que respeito é uma via de mão dupla e deve partir sempre do adulto?
Disso tudo, chegamos à conclusão de que é necessário a escola oficializar um espaço permanente de formação de seus profissionais, bem como, estender essa formação às famílias que se encontram cada vez mais perdidas em relação à Educação dos filhos. Embora diferentes, os papéis de ambas as instituições não devem ser excludentes, mas sim complementares. Se é inegável que uma Educação familiar excessivamente negligente, permissiva e/ou autoritária pode dificultar e comprometer a convivência social do sujeito, é igualmente inegável que a Educação escolar pode – e deve – ser uma alternativa (talvez a única) de instrumentalizar adequadamente esses mesmos sujeitos para uma convivência respeitosa, justa e solidária. Afinal, são os alunos que recebem uma Educação insuficiente da família os que, justamente, mais precisam de bons exemplos na unidade de ensino. Como, sabiamente, afirma a pesquisadora Telma Vinha, coordenadora do Gepem/Unicamp: “O fracasso da família não pode significar o fracasso da escola”.
Então, colegas, quais alternativas vocês têm para o trabalho da escola diante desses novos desafios que tanto desestabilizam o ambiente educacional? Compartilhe conosco.
Cumprimentos mineiros e até a próxima sexta-feira!
Flávia Vivaldi