Chegou a hora de compartilhar como acontece na prática o processo de implantação do plano de convivência – os primeiros passos, as necessidades, as ações oficiais da escola e a organização de tempo e espaço institucional para as práticas morais. Para colaborar com a reflexão de vocês, vou relatar o processo realizado em escolas voluntárias da rede municipal de Campinas, a 95 quilômetros de São Paulo.
No primeiro semestre do ano passado, o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral, da Universidade Estadual de Campinas (Gepem/Unicamp), do qual faço parte, com o apoio da Fundação Lemann em uma das etapas, aplicou em cinco instituições um questionário de clima escolar. De maneira resumida, os questionários têm como objetivo conhecer as percepções dos diferentes membros da escola – alunos, professores, gestores – acerca das seguintes dimensões: trabalho com o conhecimento; relações sociais e conflitos; regras, sanções e segurança; família e comunidade; infraestrutura; situações de intimidação; e gestão e participação. Por meio da análise das respostas é possível perceber quais são os pontos nevrálgicos a serem considerados pela instituição no planejamento de suas ações.
Identificados esses pontos, selecionamos duas escolas para dar início à segunda etapa do projeto, ainda em andamento, para a implantação da proposta “Em busca de caminhos que promovam a convivência respeitosa em sala de aula todos os dias”. Os critérios adotados para a escolha das instituições foram: possuir séries finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano); funcionar em apenas dois períodos; possuir equipe gestora; ter baixa rotatividade das equipes docente e gestora; realizar horário de trabalho coletivo com os professores; não representar extremos (nível socioeconômico muito baixo ou alto, graves problemas de violência etc.); ter entre 500 e 800 alunos; e aderir voluntariamente ao projeto.
O programa elaborado com base no diagnóstico prevê duas fases: a intervenção e, posteriormente, a avaliação. A intervenção é constituída por encontros semanais de estudo com a equipe da escola, inserção de uma disciplina específica na matriz curricular, com 90 minutos semanais, para que a convivência e a moral sejam sistematicamente discutidas, e formação quinzenal direcionada apenas aos gestores e professores de referência, que são os responsáveis pela nova disciplina.
Para que todas essas ações deem certo, é fundamental contar com a parceria de instâncias superiores. Nesse caso, a Secretaria Municipal de Educação, reconhecendo a relevância da proposta, apoiou e tem viabilizado o desenvolvimento do trabalho. Para que não haja a substituição de nenhuma disciplina e, portanto, evitando prejuízos acadêmicos e financeiros, reduzimos de 50 para 45 minutos o tempo de duração de cada aula. Assim, uma vez por semana, os alunos têm duas aulas seguidas da nova matéria (e nesse dia saem 15 minutos depois do horário normal).
Outra ação importante é a realização dos encontros semanais com os membros da equipe interna das escolas que aderiram à formação. Nesse momento, estudamos a fundamentação teórica para o trabalho direcionado à boa convivência: a construção da personalidade ética, as regras, os princípios e os valores, a comunicação construtiva, os diferentes tipos de conflitos e a violência. Todos esses são conteúdos que, seguramente, não foram contemplados na formação inicial dos educadores. Por sua vez, na formação quinzenal nosso foco são as práticas favoráveis ao desenvolvimento da autonomia moral, instrumentalizando os profissionais teórica e metodologicamente para sua atuação.
Além disso, sempre procuramos desenvolver outras atividades paralelas que contribuam e potencializem tanto o trabalho desenvolvido por nós, formadores, quanto o trabalho que passou a ser feito pela escola nessa área. Por isso, realizamos oficinas de tecnologia e auxiliamos na montagem de equipes de ajuda por meio das quais se busca trabalhar o protagonismo dos alunos – essencial para a proposta – qualificando-os para auxiliar na resolução de situações de conflitos.
Gostaria de destacar como fundamental é a disposição com que as sua escolas, a EMEF Violeta Dória Lins e a EMEF Maria Pavanatti Fávaro, demonstraram, e ainda demonstram, frente ao desafio de encarar suas fragilidades. Afinal, colegas, sabemos o quanto pode ser incômoda e angustiante a percepção de que nossa prática, em alguns momentos, encontra-se na contramão dos objetivos que ajudamos a traçar. A responsabilidade, o compromisso e a disponibilidade, portanto, são fatores essenciais para que a instituição reveja sua prática e caminhe em direção ao que tanto almeja: a formação de um ser humano melhor, mais justo e respeitoso.
Aproveito, então, para reiterar meu respeito e admiração às equipes dessas duas instituições que, certamente, não têm medido esforços para oferecer um ambiente escolar em que a vivência dos valores sociomorais possa, cada vez mais, favorecer a melhoria da convivência entre todos, todos os dias.
E então, você já pensou em implantar um plano de convivência na escola? Quais são suas dúvidas a respeito desse trabalho? Compartilhe nesse espaço. Ele é nosso!
Cumprimentos mineiros e até a próxima sexta-feira!
Flávia Vivaldi