O ponto central das nossas discussões tem sido uma Educação orientada para o desenvolvimento da autonomia moral dos alunos. No post de hoje, nosso foco é o trabalho com os pequenos da Educação Infantil, mais especificamente, como podemos planejar uma proposta que favoreça a autonomia das crianças.
É bom lembrar que o conceito de autonomia que adotamos é mais amplo do que a aquisição de independência. Nossa perspectiva é a de autogoverno, ou seja, saber fazer escolhas justas para si mesmo e para o coletivo. Nesse sentido, o desenvolvimento cognitivo é imprescindível, mas não suficiente. Somente quando há um raciocínio operatório em que haja a atuação da reversibilidade (leia aqui sobre os estágios do desenvolvimento do pensamento da criança segundo o biólogo Jean Piaget), o que acontece por volta dos 7 ou 8 anos, podemos esperar atitudes mais cooperativas, demonstrando, assim, uma evolução em direção à autonomia. Mas, então, quer dizer que não há nada o que fazer com as crianças da Educação Infantil além de esperar que cresçam? Óbvio que não! O fato de não ter a lógica necessária para o exercício espontâneo da reciprocidade não significa que não podemos realizar um trabalho que favoreça e, até mesmo, acelere o processo de desenvolvimento da autonomia dos pequenos. Vejamos, então, alguns princípios necessários que devemos considerar:
1 – Qualidade do ambiente sociomoral. Para favorecer a autonomia, as relações de cooperação são fundamentais. Portanto, o ambiente deve inspirar, desde cedo, o exercício do respeito mútuo, a discussão de regras e a resolução não violenta dos conflitos diários. Para isso, é preciso garantir o espaço para as crianças se expressarem sem, contudo, permitir atitudes que firam o princípio do respeito (bater, empurrar, morder etc.), mas sim as incentivando a mostrar o que sentem por meio das palavras.
2 – Estímulo à investigação. A criança é naturalmente curiosa e deseja conhecer cada vez mais as coisas e as pessoas. Infelizmente, muitas vezes, essa curiosidade não os acompanha durante seu crescimento – uma queixa muito presente na fala dos professores de Ensino Fundamental e Médio é o fato dos alunos não se interessarem por nada. Mas o que acontece com aquela sede por descobrir os mistérios de tudo? Certamente a explicação está em como se trabalha com o conhecimento desde a Educação Infantil. Atrair o interesse das crianças pressupõe observar o que elas fazem espontaneamente, pedir sua colaboração com ideias a respeito do que querem aprender, apresentar propostas instigantes que contemplem os diferentes tipos de conhecimento (físico, social e lógico-matemático). Dar oportunidades para os pequenos fazerem escolhas também é um incentivo ao raciocínio. Além disso, deixe de lado perguntas que atraem respostas fechadas – exemplo: “Por quê?” “Porque não”. Em vez disso, prefira perguntas com final aberto e incentive os alunos a se questionarem uns aos outros – exemplo: “O quê?”, “Como?”, “Qual?”. Durante as atividades também é válido instigá-los com indagações do tipo “O que você fez?”, “Como você conseguiu?”, “Como descobriu?” e “Alguém fez diferente?”, uma vez que a busca e a organização dessas respostas favorecem a novas tomadas de consciência.
3 – Tempo adequado. Já perceberam que no planejamento das atividades, na maioria das vezes, a previsão de duração delas leva mais em consideração o que o professor pretende desenvolver durante o dia do que propriamente o tempo da criança? Muitas vezes, justamente quando estão super empolgados com a atividade, os pequenos ouvem da professora: “Agora é hora de parar”. A sugestão épermitir um tempo para eles investigarem e se envolverem profundamente.
4 – Registros sistemáticos. Observar os pequenos com olhos de pesquisador permite ao docente avaliar as regularidades e as relações estabelecidas por eles. No entanto, isso demanda uma sistematização nos registros. Mas atenção: alguns modelos de fichas de avaliação engessam e reduzem o desenvolvimento infantil a critérios simplistas que não retratam a criança.
Esses princípios que devem nortear a Educação voltada para a construção da autonomia, por mais que para alguns pareçam óbvios, não foram considerados no processo de formação da maioria de nós – tanto escolar, como familiar. Isso exige de nós um esforço ainda maior na adoção de práticas e posturas nem sempre presentes em nossa experiência como aluno.
E então, colegas! O que pensam sobre o trabalho na Educação Infantil: devemos ou não semear a autonomia? Tenho certeza de que você tem algo valioso para compartilhar conosco. Estamos contando com isso.
Cumprimentos mineiros e até a próxima sexta-feira!
Flávia Vivaldi