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Menos desigualdade, mais qualidade

Pesquisa da FVC aponta caminhos para reduzir a diferença de desempenho entre os alunos de uma mesma escola

POR:
GESTÃO ESCOLAR, Aurélio Amaral, Karina Padial, Bianca Bibiano

Como você, gestor, avalia a aprendizagem dos alunos? Se o principal instrumento é o desempenho em avaliações externas, como a Prova Brasil, você pode estar deixando de dar atenção justamente aos que mais precisam. Isso porque as piores notas se diluem na média - o que dificulta a formação de um retrato preciso das dificuldades enfrentadas por cada estudante.

Se alguns se saem bem nos testes e outros não atingem nem os patamares mínimos, é sinal de que não há ensino adequado para todos - não há o que em Educação chama-se de equidade (leia os quadros abaixo). Em um sistema educacional equitativo, a maioria atinge os patamares mínimos de aprendizagem independentemente da classe social, do local de residência, do gênero ou da etnia.

Desigualdade em uma escola heterogênea

Acontece quando um grupo - do mesmo nível socioeconômico (NSE), raça, gênero ou outro - tem desempenho semelhante, mas a comparação entre eles aponta disparidades.

Desigualdade em uma escola heterogênea. Gráficos: Mário Kanno

Equidade

Há uma desigualdade pequena dentro dos grupos, mas a média entre eles é parecida. Todos atingem os patamares mínimos. É o ideal a ser perseguido por todas as escolas.

Equidade. Gráficos: Mário Kanno

Inevitavelmente, algumas diferenças nos resultados sempre existirão, mas elas vão ter como causa o empenho de cada um e até a afinidade pessoal com determinados conteúdos e procedimentos. O problema é que os que apresentam desempenho ruim têm perfis semelhantes: são filhos de famílias de nível socioeconômico baixo, negros e geralmente do sexo masculino - ou têm essas características combinadas. Isso acontece porque esses grupos já apresentam maior dificuldade de acesso à Educação ou são estigmatizados socialmente e até dentro da própria escola. Além disso, sabe-se que o aproveitamento é prejudicado por fatores externos, como viver em ambiente de alta vulnerabilidade e sem contato com bens culturais.

A desigualdade é revelada na pesquisa Análise das Desigualdades de Desempenho Intraescolares no Brasil, coordenada por Romualdo Portela de Oliveira, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), e encomendada pela Fundação Victor Civita (FVC), em parceria com a Fundação Itaú Social e o Itaú BBA, todas em São Paulo. A equipe de pesquisadores analisou as notas de Matemática da Prova Brasil de 2009 e aplicou um questionário em 252 escolas públicas urbanas do país, sendo 108 no município de São Paulo e 53 na cidade do Rio de Janeiro.

No recorte geográfico da pesquisa, constatou-se que as instituições localizadas na periferia apresentam um desempenho homogêneo, porém baixo. Já nas escolas das regiões centrais, as médias são maiores, há maior distância entre as notas altas e baixas. "Portanto, uma instituição bem avaliada nos testes não oferece necessariamente uma Educação de qualidade para todos. Não adianta ter poucos bons alunos no topo e a maioria estar na outra ponta", explica Romualdo (leia sobre as influências positivas para se atingir a equidade no quadro abaixo).

Infuências positivas

A proporção dos alunos que atingem ou superam os níveis adequados é maior nas instituições em que:

As condições de ensino (acesso a materiais, infraestrutura) são boas. 
40% Boas condições
35% Más condições

As famílias se envolvem na rotina escolar. 
40% Bastante envolvimento
37% Pouco envolvimento

Os alunos têm bom relacionamento entre si e com os professores. 
39% Bom relacionamento
36% Mau relacionamento

Há critérios para alocar professores nas turmas com mais dificuldades.
41% Com critério
38% Sem critério

Quando a diferença entre os resultados é gritante, cabe aos educadores tomarem medidas para que haja mais equidade e os fatores externos que influenciam as notas sejam amenizados. As decisões que levarão à solução do problema em todas as instituições do município ou do estado e implicam em investimentos de recursos financeiros - caso da contratação de mais docentes - dependem de políticas públicas (leia o quadro abaixo).

Equidade também depende de políticas públicas

Embora a escola tenha nas mãos vários instrumentos para reduzir a desigualdade, o apoio da rede de ensino é fundamental. Ela tem condições de replanejar gastos e rever a gestão de recursos humanos a fim de evitar a segregação entre as instituições e dar atenção ao estudantes menos favorecidos. A pesquisa aponta as seguintes sugestões para as Secretarias:

  • Definir expectativas de aprendizagem, ajudando a equipe gestora a estabelecer parâmetros abaixo dos quais nenhum aluno deve ficar.
  • Formar os coordenadores pedagógicos, de modo que eles tenham condições e se sintam seguros para elaborar as pautas de formação, observar a prática dos docentes e ajudá-los a aprimorar estratégias.
  • Qualificar os diretores para que acompanhem o trabalho desenvolvido pelo coordenador e pela equipe docente e mantenham boas relações com a comunidade.
  • Fixar os professores e gestores por meio de bônus por tempo de permanência na escola ou no cargo e incentivo para quem trabalha em regiões de alta vulnerabilidade e/ou com alunos com baixo desempenho.
  • Estender a jornada de trabalho dos professores, viabilizando a dedicação exclusiva em uma mesma escola, garantindo os horários para a participação dos encontros formativos.
  • Instituir o reforço para os estudantes com dificuldade, com a contratação de profissionais e garantindo estrutura - espaços, horários e materiais - para que ele aconteça.
  • Rever os critérios de matrícula, distribuindo os alunos de modo a garantir uma diversidade social e econômica nas escolas.

Muitas medidas para promover uma Educação que faça todos avançarem estão ao alcance da equipe gestora. São elas:

Pensar na turma para designar o docente 

Geralmente, os professores com mais tempo de atividade profissional têm preferência na escolha das turmas - e optam pelas mais "fáceis". Com isso, os novatos acabam assumindo desafios para os quais nem sempre estão preparados, o que vai comprometer o desempenho dos estudantes no futuro. Cabe ao diretor, portanto, alocar o docente com base no perfil dos profissionais que ele tem na equipe e das necessidades dos alunos. Uma turma de 1º ano, por exemplo, requer um professor especialista em Alfabetização ou com bastante experiência nessa área.

Garantir a formação continuada 

Sem uma rotina de formação, fica difícil lidar com a heterogeneidade e elaborar estratégias para superar o baixo desempenho. A experiência do docente influencia positivamente. Saber ensinar de diferentes maneiras quando parte da classe não aprendeu, promover a inclusão de todos nas atividades propostas e dar atenção especial a quem mais necessita são habilidades que têm de ser repensadas e compartilhadas com os novatos. Essas orientações vêm do trabalho atento de um coordenador pedagógico bem formado, que necessita do apoio do diretor para garantir tempo e espaço para o horário de trabalho coletivo e assegurar a participação dos professores.

Formar turmas diversificadas

Usar a nota como critério para organizar as classes leva ao aparecimento de turmas "fortes" e "fracas". A desigualdade tende a aumentar quando se depositam expectativas apenas nos melhores. A divisão também não pode ser feita com muitos alunos com faixa etária superior à média da série, pois haverá problemas de desempenho. A pesquisa aponta que em classes heterogêneas há mais chance de todos avançarem. Em vez de colocar os bons alunos em grupos distintos, é mais proveitoso que eles trabalhem juntos com os que necessitam de apoio.

Criar agrupamentos produtivos

Os critérios do item anterior servem para a organização da sala evitando que os alunos com mais facilidade se sentem somente na frente e os com baixo desempenho ocupem o fundo, recebendo menos atenção. Nos encontros formativos, a equipe gestora deve sugerir aos docentes montar grupos nos quais quem já avançou ajude os colegas com dúvidas.

Tornar a lição de casa um hábito

Durante as tarefas de casa, o aluno, sem a supervisão do professor, desenvolve a autonomia para estudar e sistematiza os conhecimentos. Por isso, essas atividades devem ser obrigatórias e corrigidas em sala de aula, para ajudar a consolidar a aprendizagem e contribuir na socialização das soluções dos problemas entre os colegas. A lição também ajuda os professores e coordenadores pedagógicos a diagnosticar quem precisa de mais atenção. Dessa forma, é possível planejar atividades específicas.

Melhorar o clima escolar

A desmotivação atinge as vítimas de qualquer tipo de preconceito - social, racial ou de gênero -, aumentando, assim, os riscos de reprovação e abandono. Investir em atividades que valorizem a diversidade e a tolerância, portanto, contribui para a construção de uma identidade coletiva e da sensação de pertencimento à instituição. Cabe ao gestor dar o primeiro passo para melhorar as relações interpessoais, demonstrando confiança na capacidade profissional dos docentes e acreditando no potencial dos alunos. Com altas expectativas, todos os estudantes, inclusive os menos privilegiados, terão incentivos para desenvolver seu potencial e buscar novos desafios.

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