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Como uma boa escola pode melhorar a rede

Sete estratégias para disseminar boas práticas por outras escolas

POR:
Laís Semis
No Laboratório de Mídia e Educação, os alunos têm espaço para se reunir e consultar livros e revistas, além de usar o laboratório (Foto: Lana Pinho)

A lista de prêmios da Escola Técnica Estadual Cícero Dias, em Recife, é extensa. São olimpíadas, mostras e festivais de animação, games, empreendedorismo, tecnologia com foco em meninas, Ciências, Química, Matemática. Além do Ensino Médio, a escola oferece dois cursos técnicos: um de Multimídia e outro de Programação de Jogos. A ETEC faz parte do Núcleo Avançado em Educação (Nave), um projeto de escola inovador que é fruto da parceria público-privada da Secretaria de Estado de Educação de Pernambuco com o Instituto Oi Futuro. Por isso, conta com laboratórios de Biologia e Química, Física e Matemática, Mídia e Educação, programação, multimídia, estúdio de rádio e de audiovisual.

Nesses 11 anos de existência, a Cícero Dias se consolidou como um laboratório de práticas pedagógicas e experiências bem-sucedidas, conseguindo encantar os jovens: a participação e o interesse deles nos estudos influenciam diretamente nos resultados e por isso a escola ocupa lugares de destaque nas avaliações externas. O modelo se apoia em três pilares: Ensino Médio integrado à formação profissional, pesquisa e disseminação. Vale ressaltar que o investimento no último pilar não teve a mesma intensidade que nos outros. "Quando completamos dez anos, decidimos investir na sistematização das práticas de impacto e olhar para elas com foco para colaborar com toda a rede", conta Roan Saraiva, analista de Educação do Oi Futuro e ex-aluno da ETEC.

Por conta da dificuldade de disseminação, que também acomete outras escolas-modelo, se perde conhecimento que poderia ajudar as demais instituições. "No dia a dia, falta tempo para sistematizar as práticas e não há método definido para isso", analisa Alexandre André dos Santos, pesquisador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e coordenador da iniciativa independente Laboratório de Inovação em Práticas de Gestão Educacional.

Mas dá para replicar os projetos sem o investimento que a Cícero Dias recebe da parceria, cujos valores não são divulgados? Segundo a gestão, a cultura organizacional é mais importante do que a infraestrutura. "Se eu pegasse minha equipe e aplicasse o conhecimento adquirido, teríamos o mesmo resultado em qualquer escola da rede", diz a diretora Aldineide de Queiroz.

Docentes do Ensino Médio e Técnico do Nave se reúnem em tardes de formação mensais focadas na produção do material que reunirá as melhores práticas da escola (Foto: Lana Pinho)

Ainda são poucos os exemplos positivos que influenciaram a rede. Ana Laudemira de Farias, analista educacional da Secretaria Executiva de Educação Profissional do Estado de Pernambuco, descreve um deles: ao longo dos anos, escolas da rede absorveram a prática da acolhida - no Nave, os alunos recebem os colegas recém-chegados, apresentam a escola e planejam atividades de integração - e a filosofia da Educação interdimensional. Nela, a preocupação com o jovem vai além do pedagógico, incentivando que ele seja protagonista e solidário. No Nave, parte disso é consequência de rotinas como rodas de conversas e atividades em grupo, mas a própria dinâmica de produção multimídia exige divisão responsável de tarefas e colaboração.

PARA DISSEMINAR BOAS PRÁTICAS

1 - Conscientize-se da qualidade
É preciso que os educadores tenham outro olhar sobre o que produzem e avaliem o que pode ajudar profissionais de outras escolas.

2 - Registre etapas do trabalho
A sistematização é essencial. Lembre-se de que o resgate de uma boa prática geralmente exige mais tempo do que fazer o registro durante a execução. Explique o passo a passo e como reproduzir o projeto.
3 - Não burocratize os processos
Formatos inflexíveis, documentos extensos e modelos prontos minam as chances da sistematização se manter a médio e longo prazo. Os educadores precisam ver propósito no que sistematizam, o ideal é que façam parte da construção.
4 - Seja fiel à experiência
Além de objetivo, passo a passo, material necessário e tempo estimado, considere também relatar pontos de atenção e até erros, para esclarecer melhor o processo.

5 - Considere o melhor meio

De acordo com a TIC Educação 2016, 96% dos professores se apoiam em recursos obtidos na internet para a preparação de aulas ou atividades. Mas não se deve descartar o valor das formações presenciais.
6 - Avalie a linguagem
Muitos trabalhos relevantes disponíveis na internet não conseguem impacto porque a forma como relatam não é adequada e atraente. Pensar na linguagem é importante para garantir que a mensagem seja bem compreendida.
7 - Não espere para tomar a iniciativa
O ideal é se reunir com pelo menos mais um educador ou um grupo pequeno para começar. Comunicar à gestão é importante para que ela acompanhe e apoie o processo e também o estimule entre outros membros da comunidade.

CONSULTORIA: Célia Senna, formadora de professores e facilitadora da sistematização de práticas no Nave Recife

Projeto-piloto testa a formação

Este ano, dez escolas da região metropolitana foram escaladas para a formação do educador-orientador. Esse profissional trabalha com os estudantes o projeto de vida deles. Quatro conjuntos de competências são desenvolvidos: pessoais (como autonomia, confiança e autoestima), relacionais (habilidades de relacionamento interpessoal e social), produtivas (capacidade de gestão) e cognitivas (como didáticas cooperativas).

Antes que o projeto possa ser replicado na rede, professores e gestores das escolas-piloto passaram por uma formação presencial no Nave. "Questionei se aquilo funcionava ou se era só da boca para fora," conta Valter Pessoa, professor da Escola Técnica Estadual Professor Agamenon Magalhães (ETEPAM). "Nos disseram para abordar qualquer aluno ou funcionário para tirar dúvidas. Falei com vários e pareciam empoderados do projeto.",

O Nave acompanha a implementação e recebe feedbacks das escolas participantes. "Estamos sempre revisitando os processos. Precisamos de uma linha de impacto e de outras escolas empoderadas para ganhar escala", avalia Roan. Outro ponto essencial para garantir que os projetos sejam replicados é avaliar o que é adaptavel, e como, para a infraestrutura das públicas. "Tudo que demanda investimento alto é complicado", diz Alexandre.

Miriam Fábia Alves, coordenadora de Licenciatura e Educação Básica da Universidade Federal de Goiás (UFG) diz que os educadores podem ser mais ativos no processo. "Apesar de as secretarias terem papel fundamental, acabam marcadas por grupos que estão no poder e as experiências exitosas não se tornam políticas que impactam a rede", diz. Miriam acredita que, mesmo com condições longe do ideal, se a divulgação das boas práticas for bem feita, ela pode reverter o discurso de que a escola pública não tem qualidade ao dar visibilidade ao trabalho de seus educadores.

FOTOS LANA PINHO