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Tempo para pensar ou tempo para ficar jovem? O tempo do coordenador na escola

A escola precisa de pessoas que queiram entender os estudantes e o mundo atual, sem julgar ou desmerecer ninguém

POR:
Joice Lamb
Você tem tempo para quê?      Foto: Sonja Langford/Unsplash

Quem tem tempo para pensar hoje em dia? “Não estamos pensando o tempo todo?”, diriam meus filhos bem diretamente porque eles não dão passe para minhas bobagens. Não, eles não são desrespeitosos, eles são jovens. Quando eu disse ao meu filho mais velho (quase 18 anos) que uma coisa era tão velha que era do tempo do guaraná com rolha, ele não entendeu. Quando eu expliquei a analogia, ele disse que uma coisa muito velha para ele seria do tempo da internet discada. Internet discada! Isso foi ontem.

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Mas voltando à pergunta: quem tem tempo para pensar hoje em dia? Parece que os coordenadores não têm. O tempo todo a escola traz demandas e os coordenadores precisam tomar decisões o tempo todo, resolver situações e ouvir pessoas. Uma vez me perguntaram como eu me sentia na escola e respondi que sentia que era “pega no turbilhão assim que pisava no portão” e só “descia” quando ia para casa. Muitas vezes, agindo no automático. Totalmente sem tempo para pensar. Mesmo saindo da escola, a escola não sai da gente, não é? Parece que até tomando banho ou assistindo à novela, as questões da escola aparecem na nossa mente. Uns dizem que precisamos “desligar” porque senão vamos ficar estressados. Outros afirmam que precisamos de “mais vida” do que só o trabalho. E todos estão com razão. Mas cadê o tempo?

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Eu digo que precisamos olhar para a escola a partir do tempo dos estudantes. Crianças ou jovens, os estudantes de hoje têm muito para nos ensinar, principalmente porque estamos administrando uma escola para eles, não para nós. Talvez seja este o maior problema que enfrentamos ao coordenar uma escola, fazer com que os professores possam perceber que os alunos não são só seres que recebem o conhecimento acumulado pela humanidade, mas indivíduos que interagem com este conhecimento, dão sentido a ele e constroem outros saberes.

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E para além disso, entender que as crianças e jovens de hoje não percebem o mundo da mesma forma que nós quando éramos jovens e que a nossa função não é ensiná-los ou domesticá-los para que eles sejam como nós éramos. Não existe nada de idílico ou glamuroso no “nosso tempo” que justifique que ele seja recriado, até porque esse tempo não existe mais.

Isso não é bom, nem ruim, é apenas realidade.

Voltando à questão inicial e a direta afirmação de meu filho: a gente não precisa de tempo para pensar porque a gente pensa o tempo todo. Precisamos de tempo para observar, tempo para ouvir, tempo para falar com os estudantes, tenham eles 4 ou 15 anos, tempo para tornar físicos estes pensamentos que nos permeiam. A escola hoje não pode mais se sustentar no passado, precisa se reconhecer no nosso presente.

Dizendo isso, quero afirmar que os movimentos de gestão democrática, assembleias e protagonismo dos alunos são um dos pontos principais para a criação desta escola, uma escola com pensamento e ação coletivos. Não dá mais para ficar só pensando sem agir. A ação efetiva é que nos ajuda a não nos perder nesse labirinto que pode ser a coordenação pedagógica, quando muitos projetos são idealizados e poucos postos em prática.

Outro tempo para pensar pode ser o tempo de escrita. Escrever sobre as experiências, solicitar que os alunos escrevam, que os professores escrevam, ajuda a materializar o que se sente. Os sentimentos materializados pela escrita tornam os projetos palpáveis e mensuráveis. O tempo toma forma e não nos falta, nem nos sobra. É a justa medida que precisamos.

Fica então o tempo de nos tornarmos jovens. Sei que nem todas as coordenadoras e coordenadores são desse tempo jurássico como eu, mas temo que, para integrar-se nessa hierarquia, muitos jovens coordenadores acham que precisam ir junto com a fala hegemônica de que “no meu tempo” tudo era melhor. Pelo contrário, a escola precisa de pessoas que queiram entender os estudantes e o mundo atual, sem julgar ou desmerecer, aceitando simplesmente que precisamos construir a partir daqui, do tempo e do espaço onde estamos.

Joice Maria Lamb é professora da rede municipal de Novo Hamburgo-RS desde 1991 e já teve turmas em quase todos os anos do Fundamental I e II. Atualmente, atua como coordenadora pedagógica da EMEF Profª Adolfina J. M. Dienfenthäler. É formada em Letras, tem especialização em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica e foi uma das 50 finalistas do Prêmio Educador Nota 10 2017.

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