O que saber antes de fazer o diagnóstico inicial das turmas
O coordenador pedagógico pode auxiliar esse processo orientando os professores sobre o que buscar na construção das sondagens
POR: Ewerton de Souza“Colégio. Indignado me chamam pelo número, detesto a hierarquia.” Dessa forma o poeta mineiro Murilo Mendes relembra sua passagem pela escola. Quem já não compartilhou do sentimento ao responder a chamada em sua passagem pelo colégio? Esse gesto, muitas vezes impensado, é realizado sob a pressão da burocracia, que exige do professor colocar um oceano de conteúdos em 45, 50 minutos de aula. O movimento sugere a ausência de uma preocupação que a escola sempre deveria sempre ter no horizonte: quem é o meu aluno?
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Procedimentos massificantes tendem, muitas vezes, a revelar um projeto pedagógico no qual, na verdade, não importa muito quem está lá, sentado no banco e assistindo às aulas. Assim como as chamadas, outros processos correm sério risco de desconsiderar quem é o sujeito ao qual direcionamos nosso ato de ensinar. Um desses casos é a avaliação diagnóstica. Parece paradoxal, mas a avaliação diagnóstica, quando realizada sem consciência do processo, pode desconsiderar o educando real.
A sondagem
Início de ano letivo é sempre um momento em que as escolas costumam dar atenção à sondagem, processo que visa avaliar o que nossos educandos sabem. E é por este caminho que talvez devamos começar nossa reflexão: o que realmente eu quero saber, o que me importa saber, quando realizo um processo para conhecer o que meu aluno já sabe.
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Não nego a importância dos diagnósticos iniciais. Pelo contrário, é essencial ao professor conhecer quais são os saberes e habilidades que cada educando já domina. E isso em todas as áreas do conhecimento. Sem essas informações não haverá um processo de ensino e aprendizagem no qual realmente se parta do educando para a construção do conhecimento. Daí que os diagnósticos iniciais devem ter o cuidado em seu preparo de contemplar a variedade de habilidades e saberes que uma área compreende. Quanto mais informações obtivermos, mais sucesso teremos em nossas futuras intervenções e na construção de nossos planos de trabalho.
Contudo, além de saberes e habilidades desta ou daquela área, é importante identificar nos educandos quais são aquelas competências gerais que eles já dominam, pensando nos processos cognitivos que são comuns a diversas áreas. Sob essa perspectiva haverá um olhar mais abrangente do diagnóstico inicial do meu educando. Como exemplo, poderíamos nos referir ao domínio das diversas linguagens para a comunicação de ideias ou à capacidade de raciocínio e de compreensão de conceitos.
O que evitar e o que mapear
Um risco é basear o diagnóstico inicial naquilo que pressupostamente falta aos educandos. Dessa forma, meu objetivo será fatalmente saber o que o educando não sabe, quando seria bem mais interessante pensar num processo de avaliação diagnóstica no qual o educador, ao fim e ao cabo, consiga identificar as potencialidades dos seus educandos.
Quando pensamos por esse viés, o diagnóstico inicial pode ser bem mais interessante, principalmente porque ele será construído – e aqui fica uma sugestão e uma possibilidade – a partir do projeto que a escola deseja desenvolver com seus educandos. Temáticas podem surgir dessa avaliação diagnóstica, mas só surgirão se o processo de diagnóstico inicial prever situações que busquem o diálogo entre educador e educando, não para aferir somente o que eles sabem, mas para saber quem eles efetivamente são: suas preocupações, motivações, trajetórias.
Nesse processo de conhecimento do educando, o professor terá a chance de identificar quais são aquelas habilidades que eles já detêm e com as quais poderão contribuir com a proposta de ensino e aprendizagem a ser desenvolvida. E como ninguém é igual, certamente muitas habilidades diferentes surgirão aos olhos do educador.
Assim, a proposta que deixo para este início de ano letivo não consiste numa lista de tarefas ou tópicos que os diagnósticos iniciais devam contemplar, mas sim – e principalmente – na reconfiguração do olhar do educador – e da escola – para o educando, de modo que a preocupação principal seja conhecer o educando como um todo, e não somente aquilo que diz respeito ao seu cognitivo ou à sua dimensão intelectual. Na verdadeira Educação, nós sabemos, todas as dimensões do sujeito contam.
Ainda vale recordar dois pontos importantes em relação aos diagnósticos iniciais. Primeiramente, o processo pressupõe um registro amiudado das observações do professor. Isso inclui não somente aquilo que ele conseguiu aferir por meio de instrumentos e tempos formais da avaliação diagnóstica, mas sobretudo suas observações naqueles momentos menos planejados das aulas iniciais.
Em segundo lugar, esse processo inicial não pode desconsiderar que o primeiro momento do ano deve ser marcado pela criação da empatia entre educador e educando. É também importante que o professor reflita como está se dando a construção dos laços afetivos que se desenvolverão ao longo do ano letivo. É o que popularmente se diz: a primeira impressão é a que fica. Então, compensa ter cuidado com ela antes que o caldo entorne de vez.
Enfim, mais que uma receita – o que é fácil obter quando se trata de avaliação diagnóstica –, o fundamental é a reflexão e o (auto)conhecimento dos sujeitos que um começo de ano letivo pode oportunizar.
Um bom início de ano para todos,
Ewerton
Ewerton Fernandes de Souza é coordenador geral no CIEJA Clóvis Caitano Miquelazzo, escola da prefeitura de São Paulo que lida exclusivamente com Educação de Jovens e Adultos, especialmente na faixa etária dos 15 aos 18 anos. Foi um dos 50 finalistas do Prêmio Educador Nota 10 de 2017.
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