Como o compromisso em educar ajuda a desenvolver a carreira de professores
Não se trata de ser Capitã Marvel ou Super Homem, mas de se envolver e ser referência para alunos e outros educadores
POR: Camila CecílioPaulo Airton Damasceno, 33, passou os últimos dois anos se desdobrando entre as aulas que dá em escolas de Fortaleza, onde vive com a esposa e o filho de 9 anos, e de Sobral, ambas no Ceará, e o mestrado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Uma vez por semana, ele viajava até Natal para um dia inteiro de estudos e voltava para casa no domingo. Na segunda-feira, a rotina voltava ao normal: ser professor de História em quatro escolas cearenses. A motivação para se dedicar tanto à carreira: proporcionar experiências que seus alunos levarão para a vida.
Mestre em Ensino de História, Paulo Airton afirma que o engajamento no exercício da profissão é o que o leva a buscar o aperfeiçoamento da carreira. Para o educador, a própria prática da sala de aula conduz a novos caminhos. “Ainda mais por trabalhar com outra geração, eu preciso me atualizar para partir da perspectiva e olhar dos alunos, pois não adianta eu formá-los com base em um mundo que não existe mais”, diz.
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A paixão pela Educação foi o que levou o professor a se inscrever, juntamente com seus alunos, na Olimpíada Nacional de História do Brasil, realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O projeto, que conta com participantes de todo o país, prevê em sua dinâmica a participação dos professores de História que atuam como orientadores das equipes compostas por mais três integrantes. O formato faz com que os participantes desempenhem o papel de historiadores por meio de pesquisa e análise de documentos, textos, imagens etc, impulsionando os docentes a buscarem projetos de pesquisas nas universidades do país.
O formato inspirou Paulo Airton a desenvolver um projeto olímpico em duas das quatro escolas onde atua, no Liceu do Conjunto Ceará e no Colégio Master. Referência no Ceará, o projeto propõe olimpíadas internas sobre Humanidades, pautadas em pesquisa e debate. “Esse modelo faz o aluno perceber que a educação não se divide em respostas certas e erradas, mas que existem níveis de compreensão e profundidade do saber. Ele vai perceber que, às vezes, ele entendeu apenas no nível superficial e que existem outros níveis de compreensão de uma mesma ideia”. O projeto, que usa o formato olímpico como modelo pedagógico válido e inovador dentro da Educação na era digital serviu, ainda, de base para a dissertação do mestrado do professor.
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Engajamento como inspiração
Nessa jornada pelo desenvolvimento profissional e pessoal, um professor engajado tende a levar outros professores com ele. É como uma “corrente do bem” na Educação e funciona assim: ao decidir vivenciar uma experiência diferenciada e compartilhá-la com os colegas, esse professor se torna uma referência, uma inspiração, de maneira que seu relato acaba se tornando o “empurrão” que faltava para outros.
Levantamento feito pela Comissão Acadêmica Nacional (CAN) do Programa de Mestrado Profissional de Ensino de História (ProfHistória) mostrou que, dos 507 professores participantes, a maioria respondeu que o principal estímulo para fazer o mestrado foi o desejo por melhoria profissional e, também, a troca de experiências com outros professores. Desse total, 10% foram inspirados pela Olimpíada Nacional de História do Brasil.
Quando a 2ª edição da Olimpíada Nacional foi realizada, em 2010, somente 14% dos professores participantes tinham título de mestrado. No ano passado, na 10ª edição, esse percentual subiu para 27%. O número de doutores também aumentou: de 2% para 6%. A Unicamp defende que a ONHB tem incentivado professores a voltarem às universidades para realização de pós-graduação, em especial mestrado e doutorado, e que a iniciativa dos docentes tem contribuído de forma significativa para a melhoria do ensino em sala de aula.
A coordenadora da Olimpíada de História e professora da Unicamp, Cristina Meneguello, acredita que esse modelo desafia os professores. Por ser uma prova feita coletivamente por alunos e professores e adotar um sistema que requer dias de pesquisas, estudos e busca por informações, o modelo serve para aprofundar o conhecimento histórico. Diante disso, o retorno dos professores é de que eles também se sentem desafiados e, nesse processo, acabam descobrindo novas abordagens. “Eles brincam que a olimpíada também é para eles, uma vez que precisam estudar. E nisso existe um ‘redescobrir’ que acaba por leva-los de volta à universidade”.
Efeitos do comprometimento
Os efeitos desse comprometimento não são sentidos apenas pelo profissional que se dedica, mas também pela comunidade escolar. Alunos mais engajados e melhores resultados no processo ensino-aprendizagem são as principais consequências, segundo a diretora de Projetos da Elos Educacional, Silvana Tamassia. “Um professor motivado busca cursos, conhece outros colegas inspiradores, descobre outras estratégias e amplia seu desenvolvimento pessoal. O reconhecimento acaba vindo, inclusive, da própria família do educador, que é visto como uma pessoa que está sempre buscando se aprimorar”, avalia.
E não para por aí. No caso das olimpíadas de História, por exemplo, como a prova é transdisciplinar – com questões que envolvem, por exemplo, interpretação de texto, Matemática, Geografia – acaba mobilizando outras áreas do conhecimento, o que também é um estímulo para a própria formação, segundo Cristina Meneguello.
O professor Paulo Airton, que acredita na prática da docência como uma forma de se reinventar diariamente, confirma que o impacto das olimpíadas foi positivo nas escolas onde trabalha. “O aluno olímpico entende que o processo de aprendizagem parte do professor, mas que necessita de uma participação ativa dos alunos, por isso se torna uma experiência compartilhada com também outros professores”.
Como ser um professor mais engajado
Mais do que gostar de dar aulas, para ser mais engajado é preciso, sobretudo, que o professor se enxergue na profissão e compreenda que essa visão vai ajudá-lo em seu desenvolvimento. Essa é a dica de Silvana Tamassia, que aposta na ideia de que se ver dentro da carreira como uma referência para seus alunos pode ser a grande motivação para que educadores busquem aperfeiçoamento. “O profissional deve enxergar o seu valor, embora ainda não tenha a valorização que deveria ter. Se ele não se enxergar como o líder que é pode acabar se desmotivando”, alerta a especialista, mestre em Educação e Currículo e doutoranda em Psicologia da Educação na PUC-SP.
Buscar novidades e deixar de lado metodologias de ensino tradicionais também é um caminho para ser um professor mais engajado, segundo a diretora de Projetos da Elos Educacional. “Hoje, quando a gente fala de metodologia ativa, temos o aluno no centro da aula, mas o professor é o grande articulador, então é uma forma de motivar mais os alunos porque eles também se sentem mais valorizados no seu saber e como centro do processo ensino-aprendizagem. É um ciclo que acaba, de fato, contaminando todos”.
Prova disso é o professor de História Jaison Simas, de São João Batista (SC). Com 20 anos de carreira, o educador conta que está sempre em busca de propostas pedagógicas que realmente coloquem seus alunos como protagonistas do processo de aprendizagem. “Primeiro é preciso gostar do que faz. Sendo assim, devemos estar nessa busca constante se quisermos continuar na profissão”.
Assim como Paulo Airton, Jaison foi inspirado pela ONHB a fazer mestrado na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), um desejo que carregava há muitos anos. “Antes não havia tido a oportunidade de fazer por conta da carga horária e acredito que essa é a dificuldade de muitos colegas”, comenta. Em sua dissertação, ele analisou o ensino de História Indígena para alunos do 9º ano, com aplicação de questionários para avaliar a visão dos jovens sobre a temática. As discussões e análises seguiram por dois meses, baseadas em documentos utilizados durante a Olimpíada de História.
Coordenadores têm papel fundamental
Nesse contexto, os coordenadores pedagógicos têm papel crucial: afinal, são eles os maiores articulares dentro da escola. Por estarem próximos aos professores, poderão auxiliar no processo de valorização de modo que, ao perceber uma boa prática, compartilhem com a escola. “Dar visibilidade ao que está sendo positivo não é apenas uma forma de valorizar o trabalho que vem sendo feito pelo professor, mas também de contagiar os demais”, observa Tamassia.
Por isso, é essencial que os coordenadores estejam cada vez mais perto do corpo docente da escola, atentos às novas práticas e abertos a enxergá-las. Segundo a diretora de Projetos da Elos Educacional, a ideia é que, como articulador, o gestor consiga aproveitar ao máximo o potencial que os professores têm e isso seja fortalecido no ambiente escolar.
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