Novos espaços para novas práticas
Néia Correia conta como a EM Sebastiana Luiza de Oliveira envolveu a comunidade para aumentar o tempo de ensino e ampliar as atividades oferecidas
POR: Néia Correia"Em 2010, quando eu era diretora da EM Sebastiana Luiza de Oliveira, em Ubatuba, convoquei a comunidade interna e externa para discutir a alta taxa de evasão e a violência na região. Naquele ano, um de nossos estudantes foi assassinado por envolvimento com o tráfico. A ideia era ouvir pais, professores, alunos, funcionários, lideranças locais e comerciantes, e colocar algumas questões que nos ajudariam a pensar em alternativas e amenizar esses problemas. Entre as perguntas, estavam que tipo de ensino queríamos oferecer para aquelas crianças e que cidadãos gostaríamos de formar. O resultado da conversa foi a criação do Projeto Araribá, que tem como objetivo tornar a escola mais democrática, dando mais voz a todos.
Para planejar as mudanças, comecei a estudar modelos diferenciados de organização. Minhas principais influências foram os educadores Paulo Freire (1921-1997) e José Pacheco. Com base na discussão e nos meus estudos e com o aval da Secretaria de Educação de Ubatuba, propus adotar um novo desenho de escola, com a ampliação do período de permanência dos alunos e alteração nas formas de agrupá-los - a partir de então, eles não precisariam estar necessariamente dentro da sala de aula desenvolvendo a mesma atividade que os colegas.
O primeiro passo foi repensar a rotina diária para implantar o tempo integral. Nosso objetivo com isso era incentivar que as crianças se envolvessem em diferentes práticas. Durante a manhã, elas são organizadas em grupos de trabalho e fazem projetos propostos por elas mesmas e gerenciados pelos professores, que planejam os conteúdos que podem ser trabalhados de acordo com as diretrizes curriculares do município. À tarde, os alunos participam, por exemplo, de oficinas de Música, Matemática e leitura, oferecidas pelo programa Mais Educação, do Ministério da Educação (MEC). Um cronograma semanal preparado pela equipe pedagógica indica o que será desenvolvido em cada horário.
Com a extensão do tempo e a mudança dos agrupamentos, sentimos necessidade de criar novos espaços de aprendizagem que dessem conta de atender à diversidade de atividades. Como a secretaria já nos ajudava com a estrutura física, recorremos aos pais. Foram eles que doaram os materiais de construção utilizados e deram ideias sobre o que era possível fazer.
Juntos, erguemos a Casa da Cultura, uma pequena construção feita de barro, seguindo uma técnica que era comum na nossa região antigamente. Nela, são realizadas atividades de Arte. Fizemos, também, uma sala de leitura com as paredes pela metade e uma arena onde acontecem as plenárias. Nesses encontros, as crianças expõem o resultado dos trabalhos e discutem o que consideram bom, o que vai mal e o que precisa melhorar.
Muitos familiares vieram me dizer que, antes do projeto, se consideravam excluídos da escola, mas, após começar a participar ativamente das transformações, se perceberam parte da instituição. Além de colaborar com a criação desse sentimento de pertencimento, com a adoção desse novo modelo, acabamos com a evasão e conseguimos fazer com que os estudantes ganhassem mais autonomia e dessem a cara deles aos espaços."
Néia Correia é ex-diretora da EM Sebastiana Luiza de Oliveira, em Ubatuba, a 234 quilômetros de São Paulo.
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