Por que considero um privilégio ser professor da EJA
Há alguns aspectos na Educação de Jovens e Adultos que não podem ser deixados de lado
POR: Ewerton de SouzaA maioria dos coordenadores pedagógicos trabalhará ao longo de suas vidas com a Educação regular, seja para crianças pequenas, seja para adolescentes. No entanto, sempre há a possibilidade de vir a exercer a função em uma modalidade diferenciada, como a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Nesse caso, os conhecimentos e a experiência que o coordenador pedagógico acumulou ao longo de sua carreira no ensino regular são suficientes para que ele possa atuar com competência na EJA?
Em boa parte da minha carreira, tive o privilégio de atuar como professor e gestor na Educação de Jovens e Adultos. Não considero um privilégio por ter que lidar com pessoas mais velhas e que não apresentam problemas de disciplina ou coisa do tipo. Quem tem esta imagem da EJA está se enganando, pois a modalidade tem se transformado radicalmente, e os desafios que se apresentam são inúmeros e complexos. A EJA me atrai pelas relações humanas que construímos e pelo imenso prazer de estar constantemente aprendendo com meus educandos.
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É claro que um coordenador pedagógico que desempenhe seu trabalho na Educação de Jovens e Adultos deve estar atento a diversos aspectos que não se apresentam, ou se apresentam de forma menos complexa na educação regular. Chamo atenção para alguns que não podem ser deixados de lado.
Conheça o educando da EJA
Se a diversidade sempre estará presente em qualquer processo educativo, ela se fará ainda mais evidente na Educação de Jovens e Adultos. A modalidade atrai pessoas que, por diversas razões, tiveram seu direito à Educação negado. Muitas vezes essa exclusão se deve a algum aspecto que ressalta a diferença dessas pessoas em relação a imagens construídas pela sociedade. É inevitável que o coordenador pedagógico da EJA compreenda profundamente essas identidades e saiba construir com a equipe um processo de acolhida desses educandos. As relações entre educandos em sala de aula raramente são tranquilas – e o coordenador não poderá ignorar os conflitos de ordem geracional, de gênero, de etnia que certamente ocorrerão ora aqui ora acolá. Saber compreender, dialogar e mediar conflitos cuja origem está na identidade e na trajetória desses sujeitos é uma habilidade fundamental.
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Entenda qual professor você quer para a EJA
No Brasil (ignoro em outras partes do mundo), é muito raro sair da universidade tendo alguma ideia, por vaga que seja, do que é trabalhar com educandos jovens e adultos. Temos uma imagem, frequentemente romantizada, do analfabetismo e, quando assumimos um trabalho na EJA, tendemos a nos surpreender com as especificidades da modalidade. Poucas faculdades têm disciplinas voltadas à Educação de Jovens e Adultos, e o estágio infelizmente tem sido uma atividade com raras experiências significativas.
Diante disso, certamente o coordenador pedagógico lidará com professores que têm uma imagem equivocada da EJA e que, ao pisarem na sala, enfrentarão problemas referentes à presença de um público juvenil, cada vez maior, à diversidade de identidades e às dificuldades de aprendizagem. Sem saber como lidar com a situação, o professor recorrerá às mesmas estratégias do ensino regular, o que é um erro crasso. No caso dos adultos, os processos de aprendizagem não são os mesmos, uma vez que eles já trazem consigo uma experiência muito mais longa de vida, que deve ser potencializada na sala de aula. E no caso dos jovens, usar as mesmas estratégias é repetir um esquema que não deu certo, considerando que muitos deles vivenciaram uma experiência desastrosa com a escola regular.
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Ter a expectativa de receber um professor preparado para os desafios da EJA, portanto, é fazer uma aposta raramente acertada. Cabe ao coordenador pedagógico buscar formação específica, ler bibliografias que tratam da modalidade e desenhar um processo de formação e acompanhamento desses professores visando torná-los efetivamente professores da EJA. Essa proposta formativa não pode ignorar a necessidade de variar métodos de aprendizagem, linguagens e, não raramente, alertar para a infantilização dos educandos da EJA, que embora possa até ser bem recebida por alguns aluno desejoso de viver uma experiência de escola que lhe foi negada, é um desastre em termos de educação crítica e emancipatória.
Fique ligado nos problemas específicos da modalidade
Na rotina do coordenador pedagógico da EJA, haverá certamente um trabalho homérico com a gestão do acesso, da permanência e do sucesso do educando. As contingências muito comuns a esses sujeitos pressupõem baixa autoestima, dificuldades familiares, problemas de saúde, desemprego e trabalho precário, entre tantas outras.
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Mediante essas situações, será exigida do coordenador uma boa prática de escuta e a habilidade de criar diálogos entre professores e educandos pensando em soluções criativas para problemas como o absenteísmo e a evasão escolar. Saber ouvir e motivar os educandos, buscar estratégias que melhorem a frequência e acompanhar a aprendizagem juntamente com os professores é um trabalho crucial para evitar o fechamento de salas ou índices ainda maiores de retenção que aqueles já apresentados pela EJA.
Deixo essa reflexão, um abraço
Ewerton de Souza
Ewerton Fernandes de Souza é coordenador geral no CIEJA Clóvis Caitano Miquelazzo, escola da prefeitura de São Paulo que lida exclusivamente com Educação de Jovens e Adultos, especialmente na faixa etária dos 15 aos 18 anos. Foi um dos 50 finalistas do Prêmio Educador Nota 10 de 2017
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