Manter os jovens na escola, uma obrigação
Mudança na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) amplia a escolaridade obrigatória de 6 a 14 anos para 4 a 17 anos. Só entre os jovens, são 2 milhões fora da escola. Concretizar um ensino que os motive a aprender é uma tarefa urgente, mas que está longe de virar realidade
POR: GESTÃO ESCOLAREm 2009, foi dado um passo importante para ampliar a escolaridade média do brasileiro.
Naquele ano, a Emenda Constitucional 59 determinou que, até 2016, todas as pessoas de 4 a 17 anos devem estar matriculadas na escola, ampliando a obrigatoriedade que antes era de 6 a 14 anos. Passados três anos, pouco foi feito para garantir esse direito. Mas, em abril 2013, houve um avanço: finalmente foi sancionada uma modificação na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que regulamenta o assunto. O desafio é enorme. É preciso incluir 3,5 milhões de pessoas. E só entre os jovens são 2 milhões longe dos bancos escolares.
Nos últimos anos, a matrícula no Ensino Médio permanece estável: em 2012 o número de
alunos nessa etapa de ensino é de 8,37 milhões, praticamente o mesmo valor de 2007.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2012, apenas a
metade (51,6%) da população de 15 a 17 anos está no Ensino Médio. 32,1% estão atrasados,
ainda no Ensino Fundamental. Para 16,3%, a situação é ainda pior: são jovens fora da escola.
As razões da desistência são bem conhecidas. A pesquisa Determinantes do Abandono do
Ensino Médio 2009, encomendada pelo Instituto Unibanco e realizada no estado de Minas
Gerais, elencou as mais prevalentes: gravidez precoce, necessidade de trabalhar e desestímulo pela defasagem idade-série. O levantamento, porém, encontrou motivos dentro da própria escola, como excesso de matérias e desinteresse tanto da parte do professor quanto da parte do aluno para com o conteúdo.
Como trazer esses jovens de volta? E como não perder os que seguem estudando?
A falta de estímulo dos adolescentes se dá principalmente pela falta de utilidade que o
aluno enxerga em seu tempo dedicado ao estudo (a mesma pesquisa conclui que acreditar
que estudar proporcionará melhores oportunidades na vida aumentam em 50% as chances
de o aluno permanecer na escola). O problema atinge com mais força os alunos da rede
pública. Não é de se espantar: é realmente difícil encontrar sentido em ir a escola quando as opções se limitam a um ensino tradicional para o vestibular (que não oferece condições de competitividade com os alunos da rede privada) e o técnico (ainda altamente excludente, já que muitas escolas ainda praticam a seleção prévia de seus alunos).
Uma mudança consistente precisa passar pela reavaliação da relação entre o aluno e o saber, como defende o francês Bernard Charlot. De acordo com o pesquisador, o estudante só se motiva para aprender se enxergar significado no que faz. A escola deve oferecer aos alunos
ferramentas para que eles construam uma trajetória de vida, buscando um equilíbrio entre
suas necessidades imediatas e seus planos futuros (competição do mercado de trabalho e
seleções para universidades).
O Ministério da Educação (MEC) tenta atacar o problema com a criação do Ensino Médio
Inovador. Implementado em 2010, o programa propõe aumento na carga horária, matérias
optativas, foco na leitura, abertura de espaço para as artes e maior participação da
comunidade. Mas, as dimensões do programa ainda são pequenas, o investimento necessário
é muito grande - e claro, não é uma solução mágica, já que outras persistem outras graves
dificuldades que precisam ser atacadas.
Uma delas é o currículo. O atual - extenso, generalista e obrigatório - não parece um bom
aliado para a mudança. Melhor optar por uma flexibilidade curricular que leve em conta
o diálogo e a participação dos estudantes. "Não podemos distanciar a escola do mundo
interativo rodeado de tecnologias e com inúmeros conflitos, em que esses jovens vivem",
afirma Maria Nilene Badeca da Costa, presidente do Conselho Nacional de Secretários da
Educação (Consed).
Outra opção possível é uma mudança no modo de construção da grade e de avaliação dos
alunos. "O agrupamento das matérias em grandes áreas em que o aluno possa escolher e se
aprofundar no que mais lhe interessa para que posteriormente seja avaliado a partir dessa
escolha é uma mudança possível", comenta Ricardo Henriques, superintendente do Instituto Unibanco.
Por fim, não se pode menosprezar a importância do clima escolar. O ambiente da instituição deve ser acolhedor ao aluno, dando voz ativa a ele, tratando de assuntos da sua realidade e explorando a sua própria linguagem. Assim, será mais fácil defender a esses jovens que estudar vale a pena.
Com reportagem de Anna Rachel Ferreira. Colaborou Elisângela Fernandes