Ir ao conteúdo principal Ir ao menu Principal Ir ao menu de Guias
Notícias
5 4 3 2 1

Um mergulho em busca da própria história

Como resgatar a identidade da escola e valorizar sua imagem

POR:
Aurélio Amaral
Ex-alunos da ETE Fernando Prestes, em Sorocaba (SP), doaram fotos para o Centro de Memória. Foto: Marina Piedade
Participação das famílias Ex-alunos da ETE Fernando Prestes, em Sorocaba (SP), doaram fotos para o Centro de Memória

Qual a origem do nome da sua escola? A arquitetura do prédio tem características de determinado período? Há registros sobre a rotina na época em que ela foi fundada? Quem foram os ex-alunos que se destacaram na vida social e política da cidade? As respostas a essas perguntas não são só curiosidades. Recontituir essa memória contribui para a formação de uma identidade e a percepção do contexto social da instituição. Isso vale também para alunos, professores, gestores, funcionários e a comunidade. "Conhecer a história do lugar que se frequenta quase todos os dias faz com que as pessoas se sintam pertencentes a ele", explica Juliano Sobrinho, professor da Universidade Nove de Julho, em São Paulo, e selecionador do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.

A biografia da escola é constituída de registros produzidos nas atividades letivas (regimentos internos, dossiês dos alunos, álbuns fotográficos, boletins e periódicos), como destaca o livro Inventários de Fontes Documentais, de Carmen Sylvia Vidigal Moraes e Júlia Falivene Alves. Outros itens, como os programas de ensino, as provas, os relatórios e os planos de aula, são fontes para as propostas curriculares e proporcionam à equipe reflexões sobre as atividades pedagógicas desenvolvidas na unidade ao longo do tempo.

Muitas vezes, porém, esse tipo de memorial fica trancado em armários. "Não existe arquivo morto, somente os malconservados e desorganizados, cujo potencial, infelizmente, é desperdiçado", diz Iomar Barbosa Zaia, pesquisadora do Centro de Memória da Universidade de São Paulo (USP).

O processo de investigação sobre o passado também favorece a descoberta e a valorização da história da própria cidade. Afinal, as mudanças ocorridas em uma escola nada mais são do que o reflexo das transformações do entorno. O crescimento demográfico provocado pela instalação de uma indústria, por exemplo, pode implicar na ampliação do prédio e em mudanças no perfil das famílias atendidas. Faz todo sentido, portanto, que o levantamento das informações envolva a comunidade. Para isso, além de se debruçar sobre os próprios arquivos, a instituição deve ir atrás de imagens e depoimentos de moradores do bairro que tenham fotos e objetos guardados em casa e que sejam relacionados à escola.

Documentos, fotos e conversas resgatam a história da comunidade

Os registros orientaram a reorganização dos espaços na EE Coronel João Pedro, em Pedreira (SP). Foto: Marina Piedade
Referência histórica Os registros orientaram a reorganização dos espaços na EE Coronel João Pedro, em Pedreira (SP)

A ETE Fernando Prestes, em Sorocaba, a 95 quilômetros de São Paulo, foi fundada em 1929 para formar alunos especializados em tecelagem - uma decorrência da forte industrialização do município. Na época, chamava-se Escola Profissional Mista e funcionava em um prédio alugado. De lá pra cá, trocou de nome quatro vezes e de endereço outras três. As mudanças alteraram a imagem que os moradores tinham dela. "Os sorocabanos já não a associavam àquela instituição que teve tanto prestígio no passado", explica Leila Rolin, diretora em 1988, quando o projeto institucional de resgate da memória teve início.

Trazer ao ambiente escolar testemunhas desse processo foi um dos caminhos para reconstruir a história e resgatar alguns valores. A direção passou a organizar periodicamente eventos com a participação de antigos alunos e professores. Os matriculados no ainda ativo - e concorrido - curso curricular de bordado receberam a visita de senhoras que haviam se sentado naquelas carteiras há 30 anos.

Além das atividades envolvendo alunos de todas as séries e professores de várias disciplinas, os gestores organizaram uma força-tarefa no contraturno para recuperar os arquivos. Sob a orientação de um professor e com a consultoria do Centro de Memória da Universidade de São Paulo, alunos se revezaram para organizar os documentos. Durante a leitura de boletins e listas de chamadas, alguns voluntários descobriram familiares que haviam estudado ali. Imediatamente, receberam a orientação para agendar entrevistas e pedir a doação de fotos e registros pessoais. Tudo isso ajudou a formar o Centro de Memória, ação que materializou o projeto institucional e hoje ocupa o antigo depósito dos instrumentos da fanfarra. "Estamos permanentemente atualizando o acervo, que está sempre disponível para a comunidade", conta Stella Maris Ronzani, professora que coordenou as atividades durante sete anos.

O reforço da identidade e a valorização da história da instituição podem ser ferramentas de planejamento da gestão. Isso ocorreu com Ilma Manhani, a quarta diretora da EE Coronel João Pedro de Godoy Moreira, em Pedreira, a 144 quilômetros de São Paulo, desde que o projeto de recuperação de memória começou, em 2004.

Um livro sobre a escola, publicado em 2010, revela detalhes arquitetônicos e artísticos da sede centenária - tombada pelo patrimônio histórico - e das intervenções realizadas desde então. Graças a esses dados, Ilma conseguiu planejar melhor as reformas feitas na parte não preservada do prédio. Além de observar os padrões e as cores adotados anteriormente, a diretora se preocupou em fazer fotos para documentar os espaços antes de as obras começarem, alimentando assim o acervo para as futuras gerações. "Hoje temos a cultura de registrar o presente para que a memória não se perca", explica a diretora.

Viver experiências como as das escolas citadas não é privilégio das mais antigas. As novas também podem desenvolver esse tipo de ação. Uma opção é começar tentando descobrir quando e como surgiu a demanda por mais vagas na região - o que certamente gerou a inauguração de outra unidade de ensino. Levantar como foi escolhido o nome da escola é um bom início para a pesquisa.

Caso a equipe gestora entenda que não é viável ter um espaço específico para guardar o acervo, é possível pensar em alternativas como publicar um livro ou uma revista, organizar uma exposição permanente ou itinerante ou mesmo criar um arquivo digital em forma de site na internet. Ao se envolver nesse tipo de pesquisa, funcionários, alunos, gestores e professores começam também a tomar consciência de seu papel na construção da história - da escola, da comunidade e da sociedade em geral.

Quer saber mais?

BIBLIOGRAFIA
Inventário de Fontes Documentais
, Carmen Sylvia Vidigal Moraes e Júlia Falivene (orgs.), Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e Centro Paula Souza, edição esgotada
O Acervo Escolar: Manual de Organização e Cuidados Básicos, Iomar Barbosa Zaia, Centro de Memória da Universidade de São Paulo, edição esgotada

CONTATOS
EE Coronel João Pedro de Godoy Moreira, tel. (19) 3893-2782
ETE Fernando Prestes, tel. (15) 3221-9677

INTERNET
Orientações sobre museologia e programas de apoio a ações de recuperação de memória.
Coletânea virtual com vários textos específicos para consulta

Tags