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Aloizio Mercadante fala sobre salário e formação de docentes

Ministro aposta na aplicação da lei do piso, na meritocracia e no plano de carreira para estimular os bons alunos a abraçar a docência

POR:
Denise Pellegrini, Maggi Krause, GESTÃO ESCOLAR
Aloizio Mercadante. Foto: Carol de Góes
Aloizio Mercadante

A Educação envolve colaboração entre estados, municípios, secretários, gestores escolares, 2 milhões de professores e 56 milhões de alunos. Para Aloizio Mercadante, "o MEC é um oceano, pois abarca da pré-escola à pós-graduação". Transferido havia menos de dois meses do Ministério da Ciência e Tecnologia, o ministro da Educação recebeu GESTÃO ESCOLAR em um anexo ao seu gabinete, em Brasília, em meados de março. Casado com uma professora que trabalhou por 20 anos com alfabetização, antes da vida parlamentar, ele deu aulas de economia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Foi lá que teve o privilégio de conviver com Paulo Freire. "Ele era um educador em tempo integral. Em todos os gestos, palavras e frases. Para mim, é a melhor referência de professor. Foi uma figura humana extraordinária, com jeito de profeta das palavras e dos pobres." Como bom economista, Mercadante se mostrou afiado nos números e iniciou a conversa lembrando que o Brasil está caminhando para ser a quinta economia do mundo, mas jamais será um país desenvolvido se não tiver Educação de qualidade para todos.

O que fazer para tornar a carreira docente mais atrativa?
MERCADANTE
Não existe qualidade na Educação se a carreira não for valorizada. E isso começa por melhores salários. Reconheço que um reajuste de 22,2% parece alto e que alguns estados e municípios têm dificuldade no pagamento. Mas estamos falando de um pouco mais de dois salários mínimos. É fundamental que o piso seja atrativo, pois ele motiva o ingresso na carreira. Afinal, o jovem que sai da universidade tem outras opções. Também é importante na lei do piso a discussão sobre a hora-atividade. Ela não pode ser concebida apenas como uma reivindicação sindical. Precisa se traduzir em formação continuada, em troca de experiências na avaliação dos alunos e, principalmente, deve estar associada a um projeto pedagógico. Em algumas circunstâncias, não se deve forçar, mas dar um prazo para que a hora-atividade seja implantada. É preciso diálogo e esse será um esforço do MEC. O piso tem de continuar crescendo num ritmo compatível com a situação fiscal e orçamentária.

Atualmente, 57% dos municípios ainda não têm plano de carreira. O que pretende fazer quanto a isso?
MERCADANTE
Vamos vincular o acesso a vários programas do MEC à adoção do plano de carreira. Não queremos punir, mas incentivar boas práticas. Antes vamos equacionar o problema do piso. Superando isso, discutiremos a evolução da carreira. Como estamos em final de mandato nos municípios e esperamos novos prefeitos no fim do ano, essa pauta é prioritária em 2013. Além de ter um bom salário de ingresso, deve-se ter perspectiva de promoção, de crescimento.

Sabemos que os cursos de Licenciatura e de Pedagogia não formam os professores para a prática na sala de aula. Como resolver esse problema?
MERCADANTE
Estamos ampliando um programa de bolsa de estudos para os alunos de Licenciatura. Nós vamos oferecer 45 mil novas bolsas para que eles façam uma residência educacional, a exemplo do que é a residência médica. Ou seja, que, além da experiência teórica, não basta ler Piaget e ter uma reflexão sobre Pedagogia, ele precisa da experiência do dia a dia. Para quem já ingressou na carreira, estamos elaborando o programa Escola sem Fronteira, que permite aos professores fazer estágio nas melhores escolas e faculdades de Pedagogia do Brasil. A intenção é premiar com bolsas de estudos os profissionais cujas escolas tiveram melhor desempenho na alfabetização e evolução no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Professores do interior do Nordeste ou da Amazônia poderão cumprir estágio, por exemplo, no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, uma instituição-modelo, com 14 mil alunos. Queremos estimular os professores para que tenham bons resultados e dedicação na sala de aula.

E como fazer com as escolas que têm mau desempenho no Ideb?
MERCADANTE
Vários dos nossos programas estão focados nesse problema. Um deles é o Mais Educação, que é de ensino em tempo integral (sete horas por dia). A meta era chegar a 2014 com mais 32 mil escolas, mas vamos incluir mais 30 mil só em 2012. Exatamente para melhorar esses índices.

Na pesquisa O Coordenador Pedagógico e a Formação de Professores, da Fundação Victor Civita (FVC), em 2010, 47% dos entrevistados mostraram não saber o significado do Ideb. Em outro estudo da FVC, O Perfil dos Diretores de Escolas da Rede Pública, de 2009, 36% não conheciam a nota de sua instituição. Como fazer com que a avaliação externa se reverta em ações para a melhoria da Educação?
MERCADANTE
Ela serve para a melhoria porque os gestores, os responsáveis, sabem a importância da evolução dos indicadores, especialmente do Ideb. Precisamos divulgar melhor a metodologia e também o resultado da avaliação. Alguns estados têm feito grande publicidade na escola e precisamos reforçar essa cultura de divulgar o Ideb. É muito importante que cada pai saiba qual é o significado dele, se a escola está melhorando, se está acima da média e que os professores também se motivem. Quando o MEC oferecer uma bolsa de estudo atrelada à evolução do Ideb, eu acho que eles vão prestar mais atenção.

E o Plano Nacional de Educação (PNE), que não foi votado ainda? A grande questão é o percentual do Produto Interno Bruto (PIB)?
MERCADANTE
Essa é a maior questão sim, mas há outras relevantes. É fundamental que o PNE seja votado no primeiro semestre porque em ano eleitoral é mais difícil votar matérias complexas. No Senado e na Câmara, fiz um apelo para a votação, pois não podemos perder mais um ano. Em relação ao financiamento, o governo ofereceu a proposta de 7% do PIB de investimento direto. O relator fala em 8% de investimento total. A diferença não é grande. E eu tenho levantado um complemento a essa discussão: os recursos do pré-sal. É um equívoco desperdiçar os royalties na máquina de administração pública federal, estadual e municipal. Mesmo porque é uma riqueza não renovável, inacessível para as futuras gerações. Veja que dois países, a Noruega e a Venezuela, descobriram grandes campos de petróleo no início dos anos 1970. A Noruega vinculou os recursos do petróleo a um fundo soberano e os condicionou a investimentos. Hoje é o país que tem o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do mundo. E a Venezuela tem as dificuldades que sabemos. Então, o Brasil tem de escolher o seu caminho. Essa é uma proposta minha e não do governo neste momento, mas eu já a apresentei no Senado e na Câmara: temos de vincular pelo menos um terço do pré-sal à Educação, à Ciência e à Tecnologia. Se almejamos ter uma sociedade do conhecimento depois do pré-sal, ela só será possível se priorizarmos o financiamento da Educação agora.

Sabemos que o Ministério irá entregar tablets para os professores do Ensino Médio. Quais são os planos para o uso dessa tecnologia na escola?
MERCADANTE
Os professores são imigrantes digitais, e os alunos, nativos digitais. Se você começa pelo professor, dá a ele mais segurança no uso da tecnologia. Com um projetor digital, uma lousa interativa, ele leva a internet para a sala de aula. Quando os alunos tiverem acesso, o professor estará mais preparado, vai liderar o processo. A tecnologia não substitui a relação professor/aluno. Mas o professor, na sociedade contemporânea, deve funcionar como uma antena parabólica. Precisa captar mudanças, trazer novidades, se atualizar. Vamos começar a dar os tablets aos professores do Ensino Médio, pois é lá que está o maior nó do sistema hoje.

E qual o futuro do programa Um Computador por Aluno?
MERCADANTE
No caso do Programa Um Computador por Aluno (Prouca), fizemos uma experiência em cinco escolas por estado, em que distribuímos 150 mil computadores. Pesquisadores avaliaram o desempenho dos alunos, verificaram os maiores problemas de infraestrutura, as dificuldades dos professores, como aconteceu a relação professor/aluno, o impacto na comunidade. O resultado, em geral, é bastante positivo.

Falamos de computadores, mas muitas escolas não têm acesso à internet e carecem de infraestrutura básica.
MERCADANTE
Vamos dar recursos para obras de saneamento e água, que são elementares, e priorizamos 11 mil escolas no programa Luz para Todos. A meta é, em três anos, universalizar o acesso à energia elétrica. Além disso, precisamos construir mais de 3 mil escolas, algumas com alojamento para os alunos. As escolas no campo estão em pior situação: 94% não têm banda larga, 90% não têm internet, 15% das escolas não têm luz, 10,4% não têm água, 14,7% não têm esgoto sanitário e, nos últimos cinco anos, 13.691 escolas foram fechadas.

O que será feito para melhorar a Educação nas áreas rurais?
MERCADANTE
O Programa Nacional de Educação no Campo (Pronacampo) vai ser um grande programa. Ele inclui uma mudança importante curricular, em que o Mais Educação esteja associado às raízes e aos valores do campo. Além disso, cerca de 156 mil professores das áreas rurais só têm o Ensino Médio e mais de 4 mil só o Ensino Fundamental, o que pede esforço na formação de professores.

O Pronacampo priorizará as escolas maiores e fechará as pequenas?
MERCADANTE
Não. Hoje 22% das matrículas no campo são feitas em unidades multisseriadas e nosso esforço é que as crianças estudem assim só no primeiro ciclo. Para melhorar a mobilidade, 8 mil ônibus vão permitir o acesso a escolas de melhor qualidade. E também 2 mil lanchas, na Região Norte. Depois de implantado esse programa, os prefeitos não poderão fechar escolas culpando o custo de transporte. Terão de ter a aprovação do Conselho Municipal de Educação.

Quais os planos para o programa Alfabetização na Idade Certa?
MERCADANTE
Ele visa alfabetizar no primeiro ciclo, de 6 a 8 anos. As estratégias incluem produção de material didático de melhor qualidade, formação inicial e continuada, avaliações aos 7 e aos 8 anos de idade para verificar o aprendizado e orientar a coordenação pedagógica. Se não resolvermos a questão da alfabetização e dos fundamentos da matemática, todo o processo de aprendizado posterior ficará comprometido. O desajuste idade/série tem um custo maior para o sistema educacional e é um motivador de evasão. Os estudantes acabam abandonando a escola, em algum momento, principalmente no Ensino Médio. Para que isso não aconteça, precisamos do apoio da rede e do movimento Todos pela Educação. O objetivo é mobilizar a sociedade e convencer os gestores da importância de um pacto nacional que garanta a alfabetização na idade certa.

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