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Infraestrutura: o péssimo estado de conservação das escolas

Números alarmantes revelam a falta de infraestrutura das escolas brasileiras. Os alunos são os mais prejudicados

POR:
Ocimara Balmant
Escolas em péssimo estado de conservação. Ilustração: João Pinheiro

Por falta de segurança, uma escola de São Paulo teve de adiar o início do calendário letivo depois que uma vistoria do Corpo de Bombeiros encontrou extintores vencidos e fiação exposta. Em Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá, até março os alunos de uma instituição tinham de sentar no chão para assistir as aulas porque não havia número suficiente de carteiras. Em Campo Alegre, a 88 quilômetros de Maceió, o teto de uma sala desabou e feriu 19 estudantes em julho de 2011.

E o mais grave é que estes não são casos isolados. Eles refletem a falta de infraestrutura básica de grande parte das escolas brasileiras. Sinais de depredação - como lâmpadas estouradas, portas e janelas quebradas e carteiras em mau estado de conservação - estão presentes em 23,5% das instituições. E, se o assunto é o telhado, a demanda cresce - 36,4% das escolas necessitam de reformas na cobertura. Os dados foram coletados entre as 58 mil escolas que responderam ao questionário que acompanha a inscrição da Prova Brasil 2009 e do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). A pedido de GESTÃO ESCOLAR, eles foram tabulados pelo economista Ernesto Martins Faria, especialista em cálculos e análises de indicadores educacionais e coordenador de projetos da Fundação Lemann, de São Paulo. Ernesto também investigou as respostas do Censo Escolar 2010 para mensurar o número de estabelecimentos públicos de Ensino Fundamental que funcionam de forma ainda mais precária: sem esgoto, energia elétrica ou banheiro. Segundo o levantamento, 8,8 mil unidades de ensino não têm nenhum sanitário, 11 mil não contam com rede de esgoto e mais de 12 mil delas dependem de geradores de energia (veja mais informações dos estudos nos boxes).

Situação das instalações físicas nas escolas

Telhado
36,4% precisam de reforma na cobertura
439 unidades não têm telhado

Sala de aula
35,6% das escolas necessitam reformar as salas de aula
10% afirmam que a iluminação não é adequada
19% relatam problemas de ventilação

Sinais de depredação
23,5% das instituições apresentam problemas como portas e janelas quebradas, brinquedos e carteiras mal conservados e paredes e muros pichados

Fonte: Dados do Questionário Saeb/Prova Brasil 2009, respondido por 58.374 escolas públicas de todo o país.

Ter um espaço acolhedor também é questão pedagógica

Diante de condições tão deficientes, não é difícil imaginar o quanto a Educação fica prejudicada. A organização e a manutenção do espaço demonstram o projeto político-pedagógico (PPP) da escola e, portanto, não podem ser ignoradas. "Para que o aluno valorize o ambiente de ensino e, logo, o conhecimento, é preciso dar atenção a esses aspectos", afirma Silvia Colello, professora da Faculdade da Educação da Universidade de São Paulo (USP). A influência das características físicas no desempenho escolar tem sido alvo de diversas pesquisas. Uma delas foi desenvolvida por Natália Sátyro, professora do departamento de ciência política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). "Na realidade brasileira, o espaço físico interfere muito no processo de aprendizagem, principalmente nas escolas mais precárias", afirma a pesquisadora. Coautor no projeto, o economista Sergei Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), é categórico: "Não dá para negar que aqueles que têm aulas no escuro ou sem o mínimo de higiene aprendem menos".

Outro estudo, que relacionou o rendimento dos alunos às instalações e aos materiais pedagógicos, chegou à conclusão semelhante. Gabriela Schneider, especialista em políticas, gestão e financiamento da Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR) criou o Índice de Condições Materiais da Escola (ICME) com base no cruzamento de dados do Saeb e da Prova Brasil. O levantamento, feito em 2010 para sua dissertação de mestrado, mostrou que as melhores médias estão nas escolas das redes estaduais, localizadas nas capitais urbanas, e nos estabelecimentos municipais da região Sul com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). "O sistema educacional brasileiro segue a mesma lógica da distribuição de renda e, por isso, temos unidades em patamares muito diferentes. Quanto mais humilde o local, pior a situação da escola", compara Gabriela. De fato, a maioria dos estabelecimentos sem energia, esgoto ou banheiro está localizada nos estados do Norte e Nordeste, principalmente na zona rural - que detém os piores números de IDH do país.

Condições precárias no ambiente de ensino

Números mostram que o Sul e o Sudeste têm as melhores infraestruturas e o Norte do país é a região mais carente

Sem energia elétrica
10% das escolas não possuem eletricidade (total de 13 mil)
17,5% das unidades da área rural enfrentam a falta de luz

Escolas afetadas por região
31,23% do Norte
10,29% do Nordeste
3,12% do Centro-Oeste
0,77% do Sudeste
0,32% do Sul

Sem esgoto
8,6% das escolas (total de 11.027)
14,7% das unidades da área rural

Escolas afetadas por região
22,67% do Norte
9,94% do Nordeste
2,25% do Centro-Oeste
1,11% do Sudeste
0,52% do Sul

Sem banheiro
6,87% das escolas (total de 8.805)
11,1% das unidades da área rural

Escolas afetadas por região
12,96% do Norte
9,4% do Nordeste
2,10% do Centro-Oeste
1,41% do Sudeste
0,65% do Sul

Fonte: Censo Escolar 2010

Avanços dependem de financiamento público e da autonomia do diretor

Mudar esse cenário de descaso é urgente e os pesquisadores são unânimes: a resolução dos problemas básicos, como falta de esgoto e água encanada, requer, principalmente, investimentos concentrados nas regiões mais desprovidas. "A Constituição estabelece o regime de cooperação. O Governo Federal faz repasses, mas em muitos casos eles são insuficientes. Principalmente nos pequenos municípios e naqueles com muitas unidades rurais", afirma Gabriela Schneider, da UFPR. "Nesses locais, as redes locais assumiram a responsabilidade pelo Ensino Fundamental, mas sem nenhuma estrutura. A falta de esgoto não se limita à escola, mas à cidade inteira."

E, nesse ponto, todos têm o seu quinhão de responsabilidade. O Governo Federal atua por meio do Plano de Ações Articuladas (PAR) - ferramenta de planejamento que ajuda as redes de ensino a avaliar seus problemas e, posteriormente, receber assessoria técnica e recursos do Ministério da Educação (MEC) para implementar as mudanças. O programa permite diagnosticar questões de infraestrutura por meio do Levantamento da Situação Escolar (LSE).

Para tanto, os secretários de Educação precisam responder a questionários com dados indicativos da realidade de cada instituição e as estimativas de investimentos para atender aos padrões mínimos de funcionamento - do abastecimento de água às condições de acessibilidade. Estados e municípios também devem disponibilizar programas voltados à infraestrutura: a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, por exemplo, atendeu 2,3 mil escolas em 2011 por meio do Plano de Manutenção. O projeto inclui visitas periódicas às unidades da rede para verificar telhados, instalações hidráulicas e elétricas, muros, pisos, janelas e vidros e identificar a necessidade de reparos.

E você, diretor, tem um papel fundamental nesse processo. Comunicar a rede de ensino sobre falhas na estrutura física, colaborar no levantamento dos dados e cobrar a aplicação adequada dos recursos são suas atribuições. "Como administrador político da escola, o diretor e sua equipe devem orquestrar a mobilização, promover uma comissão de pais e mesmo falar com as autoridades públicas para garantir o bom funcionamento da instituição", afirma Ângelo Ricardo de Souza, professor do Núcleo de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Nos casos dos consertos corriqueiros, a supervisão deve ser ainda mais rigorosa. Detalhes que podem parecer insignificantes, como um brinquedo enferrujado ou um fio desencapado, provocam a maioria dos acidentes graves - que, inclusive perante a lei, são de responsabilidade do gestor. Para esses serviços, existem recursos específicos. Um deles, o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), do MEC, é direcionado às instituições públicas de Educação Básica. A verba, estipulada pelo número de matriculados, deve ser utilizada na melhoria da estrutura pedagógica e em obras de conservação e manutenção.

O bom proveito dessas verbas, no entanto, depende da expansão dos programas de formação na área de administração financeira. "Diretores bem preparados sabem exigir melhorias nas políticas de repasse e fazer com que sejam aperfeiçoadas", diz Célio da Cunha, especialista em políticas educacionais da Universidade de Brasília (UnB). Ele acredita que, quanto mais autonomia a escola adquire na gestão, mais condições terá de resolver os seus problemas. A tarefa não é simples - mas também não é impossível. Prova disso são as histórias que você lerá nas páginas seguintes: quatro diretoras conseguiram, de formas distintas, superar problemas de infraestrutura e proporcionar melhorias à qualidade da Educação brasileira.