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Entrevista com Vitor Paro, professor da Faculdade de Educação da USP

Professor defende a gestão coletiva como a forma de fazer com que todos sejam corresponsáveis pela aprendizagem

POR:
Ocimara Balmant
Vitor Paro. Foto: Marina Piedade
Vitor Paro

Diretor que não decide tudo sozinho, professores que trabalham em parceria e currículo que considera o aluno sujeito de seu próprio aprendizado. Para Vitor Paro, professor titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), esses são elementos fundamentais na construção de uma escola democrática. Um modelo de ensino que, ao estimular o trabalho coletivo, forma cidadãos autônomos e críticos.

"Isso contrasta com o que se vê na maioria das escolas, nas quais o poder é centralizado e se tem a falsa ideia de que basta que uma criança esteja na sala de aula para que ela aprenda", afirma o pesquisador, que falou à revista GESTÃO ESCOLAR em novembro por ocasião do lançamento de seu livro Crítica da Estrutura da Escola, escrito com base no trabalho de observação e entrevista em uma instituição pública de Ensino Fundamental da cidade de São Paulo.

Qual o principal problema da estrutura do nosso sistema escolar?
VITOR PARO
A escola brasileira erra ao definir seus objetivos. A Educação deve formar personalidades humanas, fazer com que os alunos se apropriem da cultura em seu sentido amplo: valores, Ciência, todos os tipos de Arte. Para isso, o educando deve ser sujeito do processo e precisa querer aprender. Principalmente na Educação Básica, quando a criança é obrigada a frequentar a escola. Nesse segmento, o sistema não se mostra preocupado se ele e sua família estão satisfeitos com o serviço que recebem. É um absurdo que hoje, com todo o desenvolvimento da Ciência, se faça o que se fazia há 200 anos: confinando crianças em um espaço restrito e imutável como a sala de aula.

É possível mudar isso?
PARO
As modificações só acontecem quando a Educação é entendida em sua especificidade. Escola não é uma empresa que cumpre metas para alcançar objetivos. Nosso sucesso é saber conviver com a subjetividade do outro, o que só é possível em um ambiente democrático.

De que forma o diretor pode realizar uma gestão democrática?
PARO
Abrindo mão de trabalhar num sistema de relação vertical. Gerir não é mandar no outro. Os meios têm de ser adequados aos fins. E a finalidade da Educação, para mim, é formar indivíduos e cidadãos. Ora, isso sim é um objetivo democrático. Então, as maneiras eleitas para atingi-lo não podem ser contraditórias a essa meta. Parece-me muito mais interessante uma escola em que as decisões e as responsabilidades estão a cargo de um coletivo - e não ter apenas uma pessoa respondendo por tudo. Minha proposta é a formação de um conselho com quatro coordenadores: administrativo, financeiro, pedagógico e comunitário. Vi uma estrutura parecida a essa numa instituição da rede pública na cidade de São Paulo no início dos anos 2000. A diretora montou um colegiado com as duas coordenadoras e a vice-diretora. Antes de tomar qualquer decisão, ela conversava com essa equipe.

O trabalho coletivo serve de inspiração também para os professores?
PARO
A direção tem de se propor a circular pela escola e ouvir os que nela transitam. Em uma reunião com os professores, por exemplo, deve escutar e considerar as inquietações e demandas. Isso já faz com que o grupo se sinta respeitado e valorizado profissionalmente. Outra ideia é promover a leitura de textos críticos entre os docentes e reservar um tempo para conversar sobre o tema com eles, colocando assim todos na posição de sujeitos. Sem imposição, o gestor começa a liderar tanto no sentido técnico como no político. Esse é o primeiro passo para uma estratégia mais ousada, como a de estimular que um professor assista à aula de outro. A resistência inicial é normal, mas, em pouco tempo, eles estarão convidando os colegas para avaliar o seu plano de ensino e dar sugestões.

Em efeito cascata, esse modo de ação coletiva atinge os alunos?
PARO
Claro, desde que se mude a forma de avaliar. O teste é um componente importante, mas não pode ser o único a medir o progresso do estudante. Atualmente, as provas oficiais que balizam as escolas do Brasil, como o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) não mostram se o aluno é um sujeito com conhecimento histórico e crítico, que entende de música e cultura. Afinal, é esse repertório que faz com que ele se aproprie dos conteúdos de Matemática e Língua Portuguesa com mais facilidade. Basta olhar as boas notas de estudantes suíços e belgas no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa).

Qual é a melhor forma de avaliar conhecimentos e habilidades?
PARO
O melhor avaliador é mesmo o professor, não por ser ele a aplicar as provas, mas por ser quem acompanha o aluno diariamente, em todas as suas manifestações, sendo ciente de seus avanços e suas dificuldades corriqueiras. Essa observação é muito mais rica do que qualquer prova escrita. Para que isso aconteça, além de o docente ser muito bem formado e preparado, é preciso que haja uma equipe mais perene nas escolas, capaz de compreender o desenvolvimento da criança ao longo do tempo.

A alta rotatividade de gestores e docentes nas escolas é um inimigo para a gestão democrática?
PARO
É um elemento importante. Isso é estimulado pela própria forma de prover o cargo. Nas redes que utilizam o concurso como forma de seleção, é comum o diretor começar sua carreira em uma unidade de periferia e acumular pontos para se transferir para um bairro mais seguro ou próximo da sua casa. Na escola que visitei para escrever meu livro, mesmo sendo em uma região central, isto aconteceu: comecei a pesquisa com uma diretora e terminei com outra.

Como sua pesquisa foi estruturada?
PARO
Acompanhei por um ano o dia a dia de uma escola de Ensino Fundamental de São Paulo. Durante esse tempo, assisti às aulas, observei o horário de trabalho pedagógico de professores e entrevistei a equipe gestora, os funcionários e os docentes. Meu objetivo foi, com base no material que já tenho publicado sobre gestão escolar, apontar os problemas e sugerir as possibilidades para que se estruture uma escola mais democrática.

Quer saber mais?

CONTATO
Vitor Paro

BIBLIOGRAFIA
Crítica da Estrutura da Escola
, Vitor Paro, 248 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3611-9616, 32,40 reais

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