1º módulo: as concepções sobre a produção de texto
Formação continuada em produção de texto
POR: GESTÃO ESCOLAREstimular os estudantes a expressar as opiniões por meio da palavra escrita e, desse modo, elaborar um percurso como autor é uma das principais funções da escola. Para ajudar os educadores a realizar essa tarefa, os encartes de formação docente de GESTÃO ESCOLAR deste ano irão focar a produção de textos para as séries da primeira etapa do Ensino Fundamental. Maria Cristina Zelmanovits, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), de São Paulo, elaborou com exclusividade o conteúdo dos seis módulos, que serão publicados ao longo do ano. Neste primeiro, o objetivo é socializar diferentes concepções de ensino da produção textual e levar os professores a se posicionar diante delas para que você, coordenador, conheça as ideias deles e os convide a investigar o assunto.
Objetivo geral
Formar professores do 1º ao 5º ano para trabalhar com a produção textual escrita dos alunos.
Objetivos específicos deste módulo
- Socializar diferentes concepções de ensino da produção textual escrita e posicionar-se diante delas.
- Analisar diversas situações de produção escrita.
- Elaborar sugestões de alteração para uma proposta de produção escrita.
Conteúdos
- Condições de produção a serem garantidas quando os alunos escrevem textos.
Tempo estimado
Um mês (três reuniões de duas horas cada uma).
Material necessário
Cópia dos quadros 1 e 2 deste encarte.
Desenvolvimento
1ª reunião: Apresentação das práticas
Para iniciar a discussão, peça para que cada professor escreva duas perguntas sobre produção de textos que gostaria que fossem respondidas até o fim do estudo. Leia e guarde-as para uso durante e no fim do trabalho.
Coordenador, conhecendo as perguntas do grupo de professores, você poderá, no desenvolvimento das reuniões, chamar a atenção para as que forem sendo respondidas. No último módulo, elas serão retomadas.
No segundo momento, apresente aos professores as quatro situações propostas a seguir e convide-os a dizer o que pensam sobre cada uma:
Quadro 1
Situação 1
A professora escolhe uma ótima imagem de um índio e pede que os alunos escrevam no caderno tudo o que ela lhes suscitar.
Situação 2
Por ser 19 de abril, os alunos são solicitados a escrever sobre os índios em folhas soltas sabendo que as produções, devidamente ilustradas, serão expostas no mural da classe.
Situação 3
Depois de conversar com os alunos sobre os conhecimentos deles em relação aos índios, a professora pede que ditem um texto com as principais ideias sobre o tema. Ela o escreve em uma cartolina e o coloca no mural da escola.
Situação 4
No início de abril, a professora realiza um estudo sobre os índios, exibindo vídeos sobre os costumes de comunidades indígenas brasileiras, selecionando trechos de enciclopédias para serem lidos, distribuindo reportagens de jornal e revista sobre a situação de determinados povos para serem lidos em grupo, lendo em voz alta verbetes de dicionário de palavras do português com influência indígena e apresentando quatro lendas relacionadas ao tema. Ao longo do trabalho, a professora registra as descobertas dos alunos e pede que eles ditem o que estão aprendendo para ela escrever na lousa e eles copiarem no caderno. Duas semanas depois, ela retoma o resumo, forma duplas, e solicita que elaborem questões sobre o assunto que gostariam de esclarecer. Após ler as produções, a professora lista as principais perguntas e, com a turma, faz uma carta coletiva para a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Algumas propostas podem sofrer duras críticas. Escute atentamente os comentários feitos e finalize o encontro exercendo o papel de "advogado do diabo".
Coordenador, esse papel lhe está sendo sugerido por várias razões. Uma delas é que não há verdades incontestáveis e as práticas podem sofrer mudanças devido, por exemplo, a novos estudos e pesquisas. A outra é que não se trata de avaliar uma atividade como certa ou errada, boa ou má. É preciso encontrar critérios e argumentos para analisar potências e ausências em cada uma das propostas. Todas as situações apresentadas aparecem nas escolas e é essencial, portanto, ampliar a consciência a respeito do que está por trás de cada uma delas e saber acolhê-las.
Conclua a reunião com a leitura da definição de gêneros de discurso retirada do glossário do curso virtual Sequência Didática: Aprendendo por Meio de Resenhas, elaborado para a Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, promovido pelo Cenpec, pelo Ministério de Educação (MEC) e pela Fundação Itaú Social:
"Os gêneros do discurso são 'modos de dizer' apropriados para certas atividades e/ou situações, na medida em que permitem responder adequadamente às demandas de comunicação correspondentes. Na teoria do gênero do filósofo russo Mikhail Bakhtin, todo gênero: a) envolve um tema - o tipo de fato para o qual ele se volta; b) assume uma forma composicional - a organização geral do texto, como introdução, desenvolvimento e conclusão; c) define um estilo - o tom característico desse discurso, mais ou menos pessoal, mais ou menos formal etc".
Como tarefa de casa, sugira a leitura dos seguintes textos dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Língua Portuguesa (clique para abrir): Discurso e Suas Condições de Produção, Gênero e Texto e Condições para o Tratamento do Objeto de Ensino: O Texto Como Unidade e a Diversidade de Gêneros.
Túnel do tempo
Reconheça as regularidades, discordâncias e análises das observações dos professores e recorde as situações de ensino mais comuns relacionadas à produção de texto.
Anos 1950 Nessa época, as escolas costumavam pedir composições livres ou com base em imagens e no desenvolvimento de um tema em 30 linhas.
Anos 1960/1970 Predominaram as propostas de narração, descrição e dissertação.
Anos 1980 As redações foram reconhecidas como textos (com características semelhantes às dos textos que circulam socialmente), mas a ênfase voltou para a sequência (com começo, meio e fim) e a garantia do uso de aspectos formais que sustentassem a estrutura textual.
A partir de 1995 O trabalho com gêneros passou a predominar - e se mantém até hoje. Ao longo desse tempo, a prática docente tem revelado diferentes compreensões a respeito do que é ensinar a escrever baseando-se em gêneros discursivos.
2ª reunião: Análise das situações de escrita
Distribua a tabela abaixo e solicite aos professores que retomem as situações do encontro anterior para que cada uma delas seja analisada à luz dos itens da lista de checagem, assinalando sua presença quando for o caso. Peça que os professores apresentem suas listas e proponha a discussão entre os acordos e as discordâncias. Elabore na lousa ou em uma cartolina os resultados dessa análise. Para apoiá-lo, leia as antecipações que estão no quadro da página ao lado a respeito de alguns aspectos que podem enriquecer o debate.
Quadro 2
3ª reunião: Reelaboração de proposta
Comece pedindo que, em duplas, os professores retomem a situação 4, a lista de checagem e as anotações feitas. Em seguida, solicite que façam sugestões para avançar na proposta, considerando os itens não presentes e os assinalados mais discutidos. Proponha ao grupo que debata as ideias sugeridas. Seguem orientações sobre a situação 4:
- Item B: cabe informar aos alunos o que é a Funai, o seu papel etc., já que escrever para esse destinatário não é o mesmo que escrever para um amigo.
- Item C: embora a carta vá pelo correio, vale preencher com os alunos o envelope para explicar o que escrever nele e sobre o método de postagem.
- Item E: planejar momentos de discussão com a turma para que ela eleja os temas sobre os quais gostariam de saber mais. Além disso, a formulação de perguntas não é óbvia, o que indica a necessidade de exercitá-la com base nas hipóteses dos alunos.
- Item G: vale pensar em atividades que ajudem os alunos a se apropriar das características do gênero carta, composto de diversas faces (de reclamação, íntimas etc). O grupo pode sugerir como fazer isso.
- Item H: a turma pode conversar sobre como encaminhar o planejamento de um texto que será produzido coletivamente.
- Item I: encaminhamento de atividades de revisão e formulação.
Quadro 3
Situação 1:
- Presença do item D
- Se o item E for assinalado, proponha que os professores imaginem o que um aluno que pouco sabe sobre os índios escreveria tendo apenas uma imagem como referência. É provável que ele apenas a descreva, o que não dá conta da diversidade das comunidades indígenas, seus costumes e seus saberes.
Situação 2:
- Presença dos itens C e D
- Se alguém entender que o item A está presente, imaginando que a data comemorativa é em si um motivo para a escrita, você pode perguntar com que intenção se escreve normalmente (para informar, agradecer, elogiar, criticar etc.) e solicitar ao grupo que investigue se algum desses propósitos está presente na situação.
- Se alguém marcar o item B, lance a dúvida: será que o fato de os alunos saberem que suas produções irão para o mural garante a escrita pensando na comunicação com os colegas?
- Quanto ao item C, questione: será que o fato de os alunos poderem ver suas produções expostas no mural garante a leitura?
Situação 3:
- Presença dos itens: B, C, D e E.
- Se alguém marcar os itens A, B e C, as mesmas sugestões da situação 2 poderão ser retomadas.
- No item E, embora esteja presente devido à conversa em que se compartilharam ideias sobre os índios, cabe dizer que não é possível saber que ideias foram essas e o quanto elas ajudaram, de fato, os alunos na escrita.
Situação 4:
- Presença dos itens: A, B, C, D, E, F e I.
- O item A possibilita que o grupo discuta os diferentes propósitos que aparecem nessa situação - escrever para guardar informações e fazer perguntas para saber mais sobre o assunto e elaborar uma carta para encaminhá-las.
- Quanto ao item E, embora a professora tenha se preocupado em alimentar os alunos com informações, em nenhum momento se percebe uma discussão sobre a relevância e a pertinência das perguntas formuladas.
- Se o item G for assinalado, observe que ainda que a professora tenha utilizado diferentes fontes e gêneros para alimentar a produção dos alunos, não houve exploração dos gêneros estudados, inclusive da carta - gênero escolhido para a produção textual final.
- Quanto ao item I, mesmo tendo o cuidado de reunir o que apareceu nas diferentes produções das duplas, não fica claro como se deu a reformulação para que virasse coletivo e o trabalho com revisão não é mencionado.
Coordenador, o grupo não tem de chegar a conclusões finais, já que o planejamento das etapas do trabalho é tema dos próximos encontros. As conversas sugeridas são exercícios para o grupo e para você e elementos de diagnóstico. Como os professores fazem para que os alunos se apropriem das características de determinado gênero? Eles ajudam os alunos a planejar os textos? De que forma? Fazem atividades de revisão e reformulação?
No 2º módulo, o objetivo é que você, coordenador pedagógico, ajude os professores a aprofundar o olhar sobre as condições envolvidas na produção de textos - o trabalho com gêneros, a alimentação temática e os propósitos da escrita. Também será proposta uma análise da relação entre a produção escrita e os outros eixos do ensino da língua, como leitura, oralidade e análise linguística. Até lá!
Quer saber mais?
BIBLIOGRAFIA
Estética da Criação Verbal, Mikhail Bakhtin, 512 págs., Ed. Martins Fontes, tel. (11) 2167-9900, 86,50 reais
Introdução ao Pensamento de Bakhtin, José Luiz Fiorin, 144 págs., Ed. Ática, tel. 4003-3061, 30,50 reais.