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Educação do campo

Debate legal

POR:
Juca Gil
Juca Gil. Foto: Marcos Rosa Debate Legal

Juca Gil é professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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Embora sejam minoria no país, as escolas rurais precisam ter o seu funcionamento garantido

Em 2010, 88% dos estudantes da Educação Básica brasileira estavam matriculados em escolas urbanas. Deduz-se então que os 12% restantes estudam na zona rural. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9394/96) é clara na garantia dos direitos dessa minoria ao afirmar que, "na oferta de Educação Básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação, às peculiaridades da vida rural e de cada região" (art. 28). Segundo a legislação, os camponeses e seus filhos deveriam ter assegurados organização escolar própria, calendário escolar adaptado, conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses da zona rural (incisos I, II e III, art. 28).

Porém há fortes indícios de que os administradores públicos não estão respeitando esses preceitos. Entre 2002 e 2009, segundo dados do Ministério da Educação (MEC), mais de 24 mil escolas do campo foram fechadas no Brasil. Estamos assistindo ao extermínio do ensino voltado às populações historicamente mais pobres e condenadas à ignorância. Grande parte dos analfabetos brasileiros encontra-se justamente nas zonas rurais. Em vez de corrigir erros do passado e proporcionar condições dignas a esse público, a opção tem sido realocar esses estudantes em escolas urbanas, quilômetros e horas distantes de suas moradias. O principal argumento é financeiro: escolas no campo são muito caras.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (lei nº 8069/90) prevê o "acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência" (inciso V, art.53). Longas viagens em ônibus ou barcos não parecem respeitar essa legislação. Além de cansativas, as idas e vindas elevam o risco de acidentes.

Contudo, é importante notar os movimentos que operam pela reversão dessa tendência contra a Educação do campo. Primeiro, o projeto de lei nº 8035/2010, referente ao novo Plano Nacional de Educação (PNE), está permeado de propostas que valorizam o setor. Várias estratégias do documento são explícitas nesse sentido, como a que prevê o direito à Educação Infantil para as comunidades rurais. O projeto também propõe estimular a oferta dos anos iniciais do Ensino Fundamental nas próprias comunidades rurais, aprimorar o transporte escolar e garantir a formação de professores e equipamentos - estratégias relacionadas à meta de universalização do Ensino Fundamental de nove anos para toda população de 6 a 14 anos. O segundo movimento vem com a campanha Fechar Escolas É Crime!, na qual intelectuais, organizações não governamentais e sindicatos denunciam o ataque à Educação do campo, cobrando intervenção das autoridades para defender os direitos dos camponeses.

A população urbana não tem o direito de impor os seus modos de vida, objetivos e maneiras de se relacionar com o mundo a ninguém. A escola do e no campo é uma forma de assegurar o respeito às culturas locais. Constitui um espaço de valorização da história e da relevante função social do povo que vive na zona rural. Seja no cumprimento da legislação já existente, seja no aperfeiçoamento e no fortalecimento de novas normas, os gestores brasileiros podem e devem se posicionar nesse "campo" em disputa.

Um giro pelas leis do país

Cadastro dos sem-escola  
Lei nº 2.705/1997 do Estado do Rio de Janeiro

Objetivando mapear toda a população em idade escolar, essa lei determinou que todas as instituições de ensino das redes estadual e particular do estado do Rio de Janeiro são consideradas postos de cadastramento. Dessa forma, os responsáveis por crianças e adolescentes fora da escola ficaram obrigados a comparecer a uma delas e prestar as informações pedidas pela Secretaria de Educação. A lei também estendeu a obrigatoriedade de cadastramento a todos os já matriculados nas referidas escolas, criando assim um registro da população atendida. A legislação se propõe a ir além da simples contagem e catalogação de pessoas e criou "um serviço destinado a controlar, fiscalizar e supervisionar as ações relativas à obrigatoriedade escolar, notadamente para erradicar a evasão, que atuará em colaboração com o Município e com os demais órgãos e entidades que se destinam à proteção dos direitos da criança e do adolescente". Há ainda obrigações previstas para as escolas, que precisam comprovar a participação no censo escolar do MEC para se regularizar no sistema estadual de ensino. Com base nesse exemplo, os municípios poderiam criar normas parecidas, cadastrando as pessoas sem vagas na Educação Infantil, os analfabetos e os jovens e adultos que não têm a escolarização básica. Ter ciência das reais necessidades é um passo essencial para garantir o direito à Educação.

Juca Gil 
É professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

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