Brian Perkins discute a influência do clima escolar na aprendizagem
Pesquisador norte-americano afirma que desempenho melhora quando o gestor confia na equipe, nos professores e nos alunos
POR: Aurélio AmaralPreocupados com a qualidade do ensino, muitos diretores concentram sua atenção na resolução de problemas relacionados a formação de professores, aquisição de material didático, infraestrutura etc. Tudo isso é muito importante. Contudo, questões que não são tão facilmente mensuráveis às vezes são deixadas de lado. Alguns exemplos: os docentes acreditam no potencial dos estudantes? E a capacidade dos professores em bem ensinar é reconhecida? O que os jovens comentam sobre o local em que estudam quando estão em casa ou com os amigos? Diretor do programa de liderança de Educação Urbana na Universidade de Columbia, Brian Perkins analisou as impressões de cerca de 30 mil alunos e cinco mil professores e gestores de instituições norte-americanas. Ele constatou que o bom desempenho dos estudantes também depende da confiança que diretores e professores têm na capacidade de eles aprenderem e das impressões positivas que têm da escola em que estudam.
Na definição de Perkins, o clima escolar depende de três fatores: da estrutura física, das relações entre as pessoas e do que ele chama de atmosfera psicológica. Compõem esses dois últimos itens o respeito, a confiança entre os pares, o acolhimento e a sensação de segurança. Claro que a construção de um bom ambiente depende da atitude de todos e de cada um. Porém cabe ao diretor reforçar a ideia de que todos são capazes de aprender e incentivar a boa convivência. "Quando há uma liderança e ela é bem exercida, a harmonia vira parte da cultura do lugar e continua mesmo depois de o gestor deixar o cargo", explica o pesquisador. Em maio, Perkins esteve no Brasil para participar do seminário Impacto do Clima Escolar no Aprendizado, organizado pela Fundação Lemann, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, e concedeu a seguinte entrevista à GESTÃO ESCOLAR.
O que mais afeta o aprendizado: a qualidade do ensino ou o clima?
BRIAN PERKINS O ambiente não é mais importante do que o ensino em si, mas é tão importante quanto. Se alguém me perguntar se é possível ter bons resultados sem um bom clima escolar, respondo que sim. Excelência, no entanto, acho pouco provável. O ambiente harmonioso pressupõe relações saudáveis entre professores, estudantes e funcionários. Sem esse elemento, as crianças e os jovens podem até dominar a leitura e a escrita, mas terão dificuldade em desenvolver habilidades sociais, tão requisitadas no mercado de trabalho. Alunos de escolas pouco acolhedoras tendem a se comunicar mal e a não saber trabalhar em equipe. Se o ensino cultiva os hábitos da mente, o ambiente é o responsável pelos hábitos do coração. E ambos são imprescindíveis para a formação do ser humano.
É o ambiente que contribui para a melhoria do ensino ou vice-versa?
PERKINS Eles andam juntos. Porém, se a situação geral da escola não é boa, recomendo começar investindo na mudança do clima. É mais fácil planejar ações para incentivar a boa convivência ou aprimorá-la. As mudanças no ensino devem ser concomitantes, mas demoram mais para se concretizar. Imagine um hotel, por exemplo. Antes de começar a construí-lo, o dono deve ter em mente qual a imagem que ele quer passar aos hóspedes: se a de um espaço aconchegante, opulento ou moderno. Só então ele vai decidir a decoração da recepção e dos quartos e o cardápio do restaurante - tudo em função do ambiente que quer criar. No caso da escola, o diretor deve antes observar as particularidades da comunidade e definir as condições ideais para que os alunos aprendam. Com base nisso, é possível elaborar o projeto político-pedagógico escolhendo os conteúdos relevantes e a melhor maneira de ensiná-los.
Como medir um conceito tão subjetivo como clima de trabalho?
PERKINS Não existem índices concretos. Nesse caso, a percepção é que se torna realidade. O diretor pode até estar equivocado, mas, se ele acreditar que o ambiente não vai bem, vai agir como se isso fosse verdade. O mesmo vale para professores e alunos. Por isso, o diretor deve procurar saber se eles se sentem seguros, respeitados e envolvidos com o trabalho e com a aprendizagem. Foram basicamente perguntas relacionadas a esses aspectos que fiz na minha pesquisa. As questões podem ser adaptadas de acordo com as necessidades da escola. O importante é perguntar e debater para que todos compartilhem as impressões.
Que leitura deve ser feita com base nas impressões da comunidade?
PERKINS Deve-se cruzar as respostas e observar as diferenças de percepção entre os grupos. Por exemplo, se boa parte dos estudantes aponta que o bullying é frequente enquanto os professores dizem ser esporádico, isso revela uma falha de comunicação. Ou os jovens não estão se sentindo à vontade para expor os problemas - e aí é preciso investigar o motivo - ou os docentes não estão com a atenção direcionada aos desrespeitos que acontecem na classe ou no pátio - e, nesse caso, cabe ao diretor alertá-los. Quanto mais uniforme é a impressão que gestores, professores e alunos têm, melhor. O ideal, claro, é que além de consensual, a impressão geral seja positiva.
A expectativa em relação ao potencial dos alunos é maior entre gestores do que entre professores: entre os primeiros, 94,6% acreditam que os jovens são capazes de alcançar bons resultados em exames, contra 77,2% dos docentes. Por que isso acontece?
PERKINS Os professores estão em contato direto com as turmas e isso pode levar a um desgaste maior - deles próprios e da relação. Muitos até acusam os diretores de não terem uma opinião muito realista. Prefiro não achar que o otimismo dos gestores seja fruto do pouco envolvimento com os alunos. Creio que eles observam mais os detalhes positivos que costumam escapar do olhar de quem está diariamente dentro de sala de aula. Nesse caso, o diretor precisa apresentar sua percepção e mostrar à equipe e aos funcionários por que aposta nela. E o professor também deve apontar quais são os recursos necessários para que ele possa fazer com que a turma alcance resultados cada vez mais altos.
O que acontece quando o gestor deixa de acreditar nos estudantes?
PERKINS Tudo degringola. A função maior do diretor (principal, em inglês) está na raiz do nome: ele é o principal professor da escola. Ou seja, ele não deve apenas gerenciar. Suas atitudes e opiniões servem de exemplo para os docentes e para a comunidade em geral. Quando existe liderança, diminui muito o risco de um diretor engajado ser sucedido por um que não tenha expectativas tão boas sobre os alunos. É assim que se mantém o bom clima escolar.
Segundo a pesquisa, 86% dos gestores confiam no trabalho dos professores, enquanto só 76% desses professores acham que eles têm o respaldo do superior. O que o diretor deve fazer para deixar claro que confia no docente?
PERKINS Em primeiro lugar, é necessário dizer isso com todas as letras. Parece óbvio, mas muitos gestores nunca falaram à sua equipe: ?Eu acredito na capacidade profissional de vocês?. Depois, é importante demonstrar isso em ações, permitindo a criação, fazendo mudanças e assumindo riscos. Um diretor que confia em um professor não o pune por uma iniciativa que deu errado, mas o incentiva a pôr em prática projetos que possam dar certo. É verdade que existe um currículo preestabelecido e um projeto político-pedagógico que precisa se concretizar. Contudo, as aulas não precisam ser engessadas. Se uma estratégia para que os alunos aprendam melhor é sugerida, o bom gestor compra a ideia, ajuda no planejamento, avalia o que deu certo e o que é passível de melhoria, e a divulga.
Como criar, também entre os pais, uma boa impressão sobre a escola?
PERKINS Deve-se conversar com eles com frequência. Se eles não vêm às reuniões porque estão trabalhando, é possível marcá-las em horários compatíveis com a rotina deles. Se ainda assim não aparecem, a escola pode ir até eles. Existem várias maneiras de fazer isso. Incentivar a equipe docente a visitar a casa dos alunos é uma delas. Os resultados da minha pesquisa mostram que o rendimento é melhor em ambientes em que pais, professores e diretores se conhecem.
A segurança é um item importante no clima escolar. O que o gestor deve fazer para controlar um fator que foge aos limites da instituição de ensino?
PERKINS A escola não pode controlar o que acontece fora dela, mas tem força para pressionar as autoridades a fim de que tomem providências. Foi o que fez um gestor do Bronx, um bairro de Nova York considerado violento. Ele recebia muitas queixas de alunos que eram roubados nos arredores do prédio. Essas informações foram levadas à polícia, que mapeou os pontos mais perigosos e reforçou a segurança nos arredores. Pode parecer pouco, mas, nesse caso, a simples comunicação do problema ajudou a resolvê-lo.
Então é possível criar um bom ambiente mesmo onde as condições do entorno não são as melhores?
PERKINS Com certeza. Há oásis no meio de áreas degradadas. Conheci uma escola na África do Sul que era alvo de pichações. O diretor decidiu não tolerar mais agressões ao patrimônio e passou a limpar as paredes sempre que elas eram pichadas - o que acontecia praticamente todo dia. A mensagem que ele passou foi bem clara: a de que aquele espaço seria bem cuidado a qualquer custo e que depredações não durariam muito. Com o tempo, ele venceu os vândalos por cansaço. O respeito que a instituição ganhou se refletiu na equipe e nos alunos, que também passaram a se sentir respeitados.
O senhor visitou três escolas no Rio de Janeiro. Quão diferentes são os desafios enfrentados por educadores no Brasil e nos Estados Unidos?
PERKINS Notei algumas questões pontuais. No Brasil, os relatos de bullying são de casos praticados eminentemente dentro de sala de aula, enquanto nos Estados Unidos o cyberbullying - ameaças via internet e mensagens no celular - é mais frequente. O preconceito racial é uma questão recorrente que afeta negativamente o ambiente de muitas escolas norte-americanas, o que não é tão presente no Brasil. Aqui, a classe social parece ser o motivo de discriminação. No Rio, visitei uma instituição privada em bairro de classe média, uma federal de renome e uma estadual localizada em uma favela. Em termos de estrutura, são três realidades bem diferentes. Certamente, o clima pode ser afetado se o corpo docente não está suficientemente bem preparado ou a família não dá o devido apoio, e isso varia de acordo com o entorno social e as condições financeiras. Mas, nas três escolas, percebi entusiasmo dos estudantes e dos professores, o que mostra que elas são bem geridas e existe um trabalho de liderança. No fundo, o desafio é um só: como fazer com que os alunos aprendam cada vez mais? É esse o objetivo de cultivar um bom clima. Não existe fórmula, mas a resposta deve passar pela confiança e pela boa relação entre todas as pessoas que convivem diariamente na escola.
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Brian Perkins