O preço da Educação
Debate legal
POR: Juca GilJuca Gil é professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
A escola pública, no Brasil, é gratuita, segundo a Constituição Federal (Art. 206, IV). Ninguém tem de pagar taxas ou mensalidades para ter acesso à Educação nos estabelecimentos geridos pelo poder público, em âmbito federal, estadual ou municipal. Mas nem sempre foi assim e, como ainda hoje há opositores a esse princípio, é muito importante refletir sobre o assunto.
Originalmente, no mundo ocidental, o ensino era privilégio das classes mais abastadas e poderosas. Quando o Estado passou a criar instituições escolares, eram os donos do poder econômico os que mais usufruíam desse serviço.
A ideia de gratuidade, porém, se baseia numa concepção igualitária de sociedade, na qual o governo deve oferecer uma Educação a que todos tenham acesso, ricos ou pobres, indistintamente. Se os mais abastados pagassem para frequentar a escola pública, isso romperia o preceito da igualdade. Talvez os pais e estudantes pagantes fossem mais bem tratados por gestores e professores, pois trariam recursos às escolas. Talvez se sentissem com mais direitos em relação aos demais, visto que contribuiriam mais que os outros para a manutenção das mesmas. E aquelas com maiores investimentos ou que atendessem a regiões mais endinheiradas teriam, consequentemente, melhores condições materiais de funcionamento.
Ainda hoje existem situações que ameaçam a gratuidade. Por exemplo, as Caixas Escolares e as Associações de Pais e Mestres (APMs), entidades privadas que, em princípio, são autorizadas a receber verbas públicas como forma de agilizar a burocracia e suprir necessidades básicas de manutenção, aquisição de material didático e formação. Porém, por vezes, essas associações se sentem no direito de arrecadar "contribuições" das famílias. Essa segunda prática é ilegal por afrontar o acesso sem custo ao ensino público, constrangendo e desrespeitando os que não têm condição ou não querem pagar. Os gestores têm papel crucial, podendo intervir decididamente pela garantia desse direito ou tendo de responder, inclusive judicialmente, pelo modo como agem ou se omitem em relação ao mesmo.
Outro elo essencial se faz entre gratuidade e obrigatoriedade. Como o Estado poderia obrigar alguém a estudar se condicionasse a matrícula a uma retribuição financeira? Uma vez mais, os pobres seriam punidos só por serem pobres.
As sociedades modernas levam seus cidadãos a estudar justamente para que esses possam, de fato, exercer sua cidadania, além de não atrapalhar o desenvolvimento da coletividade. Assim, temos o direito de forçar as novas gerações a estudar e propiciamos a elas o acesso independentemente de suas condições financeiras. A falta de Educação de um povo é demasiadamente cara e todos acabam pagando por isso.
A gratuidade é um dos pressupostos para que o direito ao ensino e ao aprendizado seja universalizado. Trata-se de uma peça-chave para que a obrigatoriedade seja plausível e para que se busquem condições de igualdade em nossa sociedade. Os gestores têm o dever de exigir que os governos ofereçam os recursos essenciais ao funcionamento das escolas e precisam zelar para que o acesso às mesmas de forma gratuita seja respeitado.
Juca Gil
É professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS).