O que evitar no trabalho pedagógico coletivo
Como tornar produtivo o horário de trabalho pedagógico coletivo, conhecido como HTPC em diversos estados
POR: Noêmia LopesPergunte a qualquer diretor ou coordenador pedagógico: "A sua escola tem um horário reservado para a formação de professores?" Dificilmente a resposta será negativa. Contudo, se esse assunto for investigado com um pouco mais de critério, é possível perceber que esses momentos de interação entre o coordenador pedagógico e o corpo docente - tão importantes para a melhoria da prática em sala de aula e, consequentemente, o processo de ensino e aprendizagem - não se realizam como deveriam. Em 2009, o estudo Práticas Comuns à Gestão Escolar Eficaz, realizado pela Fundação Victor Civita (FVC), acompanhou o horário de trabalho pedagógico coletivo (HTPC) em 15 escolas estaduais e municipais do Estado de São Paulo. Em 11 delas, os assuntos tratados estavam longe de ser pedagógicos. A frequência desse erro faz muita gente apelidar o tempo das reuniões, debochadamente, de "horário de trabalho perdido coletivo".
As equipes de NOVA ESCOLA GESTÃO ESCOLAR, NOVA ESCOLA e do site foram conferir esse dado entre maio e julho do ano passado, ao investigar como eram organizados os encontros chamados de formação em escolas de 17 cidades das cinco regiões brasileiras. O resultado mostra que muitos gestores até acreditam fazer um bom trabalho. Contudo, alguns deslizes na organização - ou na falta dela - comprometem até mesmo as melhores intenções. Listamos, aqui, os sete pecados capitais:
- Participação facultativa
- Ausência de regularidade das reuniões
- Falta de plano anual de formação
- Indefinição de pautas
- Inadequação do espaço
- Uso de atividades de motivação
- Dispensa de alunos
"A importância que a escola dá ao trabalho pedagógico coletivo revela a concepção que o grupo tem sobre o papel docente: o professor deve entrar e sair da sala de aula sem planejar as aulas nem avaliar o trabalho com os pares? Ou é imprescindível que ele reflita e troque experiências com os colegas sobre as práticas docentes?", questiona Regina Scarpa, coordenadora pedagógica da FVC.
Para que a formação na escola aconteça de verdade, é preciso acabar com todos os equívocos listados acima e investir na formação permanente do coordenador pedagógico, o responsável direto por essa função. "Quem ocupa esse cargo também precisa de capacitação constante, acompanhamento e apoio", afirma Telma Weisz, educadora e doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo (leia entrevista na página seguinte).
Para tanto, é válido buscar ajuda na Secretaria de Educação e em instituições parceiras que atuem na cidade. O único cuidado a tomar, nesse caso, é não deixar que formadores externos substituam o interno. "O especialista pode ajudar trazendo informações sobre pesquisas recentes. Contudo, é o coordenador pedagógico que deve ser o par mais experiente do grupo, o interlocutor que leva à reflexão sobre a prática e o corresponsável pela aprendizagem dos alunos", aponta Beatriz Gouveia, coordenadora de projetos do Instituto Avisa Lá, em São Paulo.
O que diz a lei sobre o HTPC
A dedicação coletiva de algumas horas semanais para estudo é, inclusive, um direito dos profissionais da Educação e uma forma de valorizá-los prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996. Já o Plano Nacional de Educação (PNE), de 2001, recomendou reservar de 20 a 25% da jornada para o aperfeiçoamento fora de sala de aula - e o próximo PNE, ainda em tramitação no Congresso Nacional, tem entre suas principais diretrizes a formação em serviço. Outra tentativa de tornar o HTPC obrigatório foi a lei do piso salarial do Magistério, de 2008, que propunha um terço da carga horária para atividades extraclasse. Porém esse artigo não entrou em vigor e está em apreciação judicial. Se implantada, a medida destinará 33% da jornada para realização de projetos, planejamento individual, correção de provas e a tão necessária formação coletiva.
Enquanto a regulamentação não vem, é indispensável conferir se o horário reservado ao trabalho pedagógico coletivo é bem utilizado e tomar medidas para evitar os sete pecados listados a seguir, fazendo da formação uma ferramenta eficiente no planejamento e na avaliação das atividades escolares.
A educadora e doutora em psicologia pela Universidade de São Paulo (USP) fala sobre a importância da formação continuada.
Qual é a relação entre a melhoria do ensino e a formação de professores?
Telma Weisz A melhoria da Educação, no geral, é uma trama que envolve investir em uma série de ações de longa duração sem perder o foco e a direção de onde se deseja ir. Uma delas é a formação em serviço - o tempo de estudo em que o docente conhece práticas de boa qualidade, troca experiências com os colegas e tem acesso a novos conhecimentos. Esse momento se faz ainda mais necessário por causa das graves deficiências que temos na formação inicial. Quando saem das universidades, os professores nem sequer têm claro o compromisso de garantir a aprendizagem dos alunos. Ainda que tivessem tal clareza, entrariam em pânico, já que ninguém os ensinou a fazer isso.
O que é imprescindível para que o trabalho pedagógico coletivo seja implantado com eficiência?
Telma É preciso antes de tudo que ele seja devidamente regulamentado e organizado e que o Estado crie condições e bases legais para que ele de fato aconteça. Ou são criadas políticas públicas que realmente favoreçam o aumento da qualidade do ensino, ou vamos continuar lamentando não ter uma Educação semelhante à da Finlândia.
Como os coordenadores pedagógicos podem se preparar para ajudar os professores?
Telma Eles precisam ter consciência de que também necessitam de formação permanente, acompanhamento e apoio pedagógico - e devem buscar isso junto à equipe técnica da Secretaria de Educação. É somente dessa maneira que podem ganhar condições de conscientizar a equipe de professores a respeito da importância dos momentos de estudo e reflexão e de auxiliá-los na tarefa de ensinar.
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CONTATOS
Beatriz Gouveia
Inês Assunção de Castro Teixeira
Marisa Garcia
Telma Weisz
BIBLIOGRAFIA
Ensinar - Tarefa para Profissionais, Beatriz Cardoso, Delia Lerner, Neide Nogueira e Tereza Perez (orgs.),
406 págs., Ed. Record, tel. (21) 2585 2000, 47,90 reais
Mediação Dialética na Educação Escolar - Teoria e Prática, José Luiz Vieira de Almeida, Maria Eliza Brefere Arnoni e Edílson Moreira de Oliveira, 184 págs., Ed. Loyola, tel. (11) 2063-4275, 26,50 reais
Questões da Formação Continuada de Professores, Paulo César Géglio, 104 págs., Ed. Alfa-Omega,
tel. (11) 3062-6400, 46 reais
Teorias e Práticas na Formação de Professores, Maria Antonia Granville (org.), 240 págs., Ed. Papirus,
tel. (19) 3272-4500 44,90 reais