Falta de foco
Pesquisa mostra a opinião de gestores sobre a profissão e comprova: eles gastam mais tempo com burocracia do que com ações pedagógicas
POR: Cinthia RodriguesNo dicionário, entre os significados da palavra diretor, vê-se: "que faz a administração" e "que orienta, fundamenta, norteia". Com base no consenso de que o objetivo principal da escola é ensinar, espera-se que o gestor de uma unidade de ensino dê ênfase ao que se refere à segunda definição. Mas não é o que ocorre na prática. Levantamento realizado pelo Ibope a pedido da Fundação Victor Civita (FVC) mostra que a maioria dos diretores de escolas públicas gasta muito tempo com questões administrativas e se dedica pouco à melhoria da aprendizagem (leia dados da pesquisa Perfil dos Diretores de Escola da Rede Pública nos gráficos dos quadros).
Foram entrevistados 400 gestores em 13 capitais (Belém, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Luís e São Paulo) sobre temas como rotina de trabalho e políticas educacionais. Mesmo com 91% dos diretores sendo formados em Pedagogia ou licenciados em uma das disciplinas da Educação Básica, ou seja, professores de fato, vê-se que a maioria se distancia das necessidades da sala de aula ao mudar de função. "Muitos diretores cuidam da burocracia como se fosse um fim em si e se esquecem de que ela é apenas uma etapa para tornar o aprendizado mais eficiente", diz Maria Luiza Alessio, diretora de Fortalecimento Institucional e Gestão da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC).
A julgar pelas observações registradas na pesquisa Práticas Comuns à Gestão Escolar Eficaz, também da FVC (leia a reportagem), a ideia de que há demandas mais importantes do que o processo de ensino e aprendizagem também é posta em prática nos Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC). A comprovação ocorreu no acompanhamento de 14 desses encontros. Em apenas quatro, foram abordados assuntos ligados ao ensino. Nos demais, as discussões giraram em torno de pendências administrativas diversas e de outros debates sem relação com a sala de aula.
O que pensa o diretor
Profissionais da rede pública respondem sobre rotina e políticas governamentais
Quem são os responsáveis...
Notas e aprendizagem
Os diretores ouvidos apontam o governo como o principal responsável pelo mau desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Os entrevistados atribuem bem pouco da culpa pelas notas baixas - apenas 2% - a eles próprios. Contraditoriamente, quando questionados sobre os verdadeiros agentes da aprendizagem, colocam os principais membros de sua equipe, os professores, no topo da lista.
Cabe ao gestor levar a equipe a enfatizar a aprendizagem
Para a professora Claudia de Oliveira Fernandes, pesquisadora de Avaliação e Currículo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o diretor tem uma posição privilegiada para evitar esse tipo de distorção. Uma administração com foco ajustado orienta as atividades dos professores para que eles consigam realizar um bom trabalho com os alunos. "Normalmente o gestor é eleito ou nomeado porque as pessoas acreditam no talento dele como educador. Essa experiência deve ser usada para delinear o melhor projeto possível para a unidade de ensino", diz.
Os destaques na rotina
Dividir os compromissos
Os gestores se dedicam mais a tarefas administrativas. Cuidar da merenda é uma preocupação diária quase unânime. Todavia, 40% fazem reuniões apenas semanais com os coordenadores pedagógicos. Pior que isso: poucos sugerem melhorias pedagógicas. Fica evidente que os diretores não privilegiam questões ligadas ao ensino. Delegar algumas demandas abriria espaço na agenda para cuidar de aspectos pedagógicos.
Os resultados da pesquisa indicam ainda que experiência e formação não faltam a esses profissionais. A maioria se torna diretor por volta dos 40 anos - a média de idade dos entrevistados foi de 46 anos e a de tempo no cargo é de quase oito anos. Além da graduação em Pedagogia ou licenciatura em uma das disciplinas básicas do currículo, 72% tem alguma pós-graduação, sendo que as mais recorrentes são Pedagogia, Gestão Escolar e Psicopedagogia. Há que se pensar, então, em uma melhor organização da agenda. Cabe ao diretor analisar se suas escolhas equilibram o tempo dedicado à burocracia e às ações pedagógicas. Sempre lembrando que são essas últimas que, de fato, levam a avanços na aprendizagem.
A opinião sobre a educação no Brasil
Visão otimista
Convidados a pensar no presente e no futuro da Educação brasileira, os diretores demonstram uma atitude positiva. Hoje, a maioria (53%) considera que o sistema é regular. Apenas 13% veem a situação como boa e não houve quem atribuísse a condição de excelente ao panorama atual. Em dez anos, entretanto, a maioria (58%) consegue vislumbrar uma Educação boa. A crença na evolução permite que 6% acreditem na chegada a um nível de excelência.
Fonte Pesquisa Perfil dos diretores de escola da rede pública (FVC/IBOPE)