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As leis e a autonomia das escolas

Debate legal

POR:
Juca Gil
Juca Gil. Foto: Marcos Rosa Debate Legal

Juca Gil é professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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Vivemos no Brasil? Não, vivemos na República Federativa do Brasil! Um chileno nasce na República do Chile e um francês é pessoa natural da República Francesa. Por que, então, usamos o complemento federativa e esses países não? Detalhe sem sentido? Não. Na verdade, ele mostra que escolhemos outro jeito de ser país. Resolvemos organizar o Brasil de modo mais parecido com os argentinos, os alemães e os norte-americanos, constituindo uma federação, não um país unitário.

E o que isso tem a ver com a Educação? Tudo, em especial quando se pensa em gestão. No Chile, por exemplo, as negociações de aumento salarial dos professores de todas as escolas públicas são feitas diretamente com o Ministério da Educação. Da mesma forma, na França, esse mesmo órgão pode decidir sobre a abertura de cargos para professores ou o fechamento de vagas que considere desnecessárias em qualquer parte do país. Já o nosso MEC não tem o poder de agir da mesma maneira.

Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, quando nos tornamos uma federação, o governo central delegava parte de suas funções e de seu poder para as províncias (antigo nome dos atuais estados) como forma de garantir apoio político e manter a unidade nacional (entre outros motivos), evitando assim que regiões se separassem e formassem outros países. Na Constituição Federal de 1988, os municípios também passaram a ser considerados entes autônomos da nossa federação. Traduzindo: eles têm liberdade para tomar algumas decisões sem interferência dos governos federal ou estadual. Da mesma forma, os estados também não precisam prestar contas ou pedir autorização ao MEC ou aos municípios para gerir as próprias redes. Os limites dessa autonomia são determinados por leis nacionais, a começar pela Constituição Federal.

Para garantir que cada ente federado preserve o seu espaço de autonomia, muitas leis nacionais acabam sendo um tanto quanto genéricas e vagas, possibilitando interpretações diversas e deixando a definição a cargo dos estados e municípios. Tomemos como exemplo o princípio da "gestão democrática do ensino público, na forma da lei", inscrito na Constituição (artigo 206, VI). O que quer dizer a expressão "na forma da lei"? Simplesmente que a gestão democrática depende da elaboração de novas normatizações para que fique claro o que fazer e como proceder. Em jargão jurídico, esse trecho precisa ser regulamentado, ou seja, trocado em miúdos. Assim, o que quer dizer "gestão democrática"? O diretor escolar pode ou deve ser eleito pela comunidade? Qual é a composição dos Conselhos Municipais de Educação? O que um secretário de Educação pode decidir sem consultar a rede? Quais são as instâncias de decisão nos sistemas educacionais? A Constituição não responde a essas questões. Nem a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

A maioria das decisões sobre o funcionamento das escolas é tomada nas esferas estaduais e municipais, não no âmbito nacional. Estão nessa lista itens como a organização da escola, a definição do currículo, a jornada de trabalho, a divisão em séries ou ciclos e a forma de escolha dos diretores (eleição, indicação política ou concurso), entre outros.

Esse modelo jurídico nos protege de governos centrais autoritários, garantindo a pluralidade no país, e possibilita encontrar respostas compatíveis com cada realidade, sem padrões impostos por uma região mais rica, por exemplo. Por outro lado, as interpretações diferenciadas podem ser incoerentes entre si e até contraditórias. Leis nacionais genéricas muitas vezes geram imobilismo pela falta de instrumentos concretos para cobrar a realização de direitos conquistados. No limite, a lógica federativa pode ser entendida como bagunça por falta de certas estruturas comuns.

Note-se que os desafios educacionais de um país federativo são grandes e não podem ser diretamente comparados com os dos estados unitários. Por isso, os gestores educacionais devem ter especial atenção às constituições estaduais, às leis orgânicas municipais e às demais leis e regulamentações de seu estado e de sua cidade. É preciso ter claro que não temos um Brasil, mas vários Brasis. E cada educador deve buscar compreender e aprimorar sua realidade para que o conjunto do país se beneficie.


JUCA GIL é professor da Universidade de São Paulo e especialista em políticas educacionais.

 

Jornada de trabalho

O professor que trabalha dois turnos (40 horas semanais) deve ser lotado com quantas aulas por semana?
SANDRA CAVALCANTE, Anísio de Abreu, PI, via site

No Brasil, cada rede de ensino tem liberdade para decidir sobre a forma de atribuir aulas aos professores. Por isso, nem sempre trabalhar em dois turnos significa 40 horas semanais (em alguns casos, são 35, 30 ou outro número). Também não há necessariamente equivalência entre a hora-aula e a hora do relógio (60 minutos), pois em vários lugares a primeira tem 55, 50 ou 45 minutos.

Assim, para saber como a regra se aplica numa dada realidade, é essencial ter acesso às regulamentações da rede de ensino, estadual ou municipal. Sua pergunta, Sandra, chega em ótimo momento, pois o parecer 09/2009 do Conselho Nacional de Educação (aprovado em abril) trata justamente das novas Diretrizes dos Planos de Carreira e Remuneração do Magistério.

Até o fim deste ano, todas as redes de ensino devem montar ou adequar seus planos de carreira. Na pauta, além dos tópicos citados acima, estão as formas de evolução funcional, o piso salarial, a jornada de trabalho com tempo para hora-atividade, o incentivo à formação, o estabelecimento de um número máximo de alunos por sala de aula e muito mais. Aproveite e discuta com seus colegas essas questões.

Financiamento

Com a mudança do Fundef para Fundeb, que porcentual cada esfera do poder público deve aplicar em Educação?
VALDIRENE ARAÚJO, Dom Pedro, MA, via site

O Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb) não alterou os mínimos constitucionais de vinculação de recursos à Educação. Estão mantidos os 18% para o governo federal e os 25% para os governos estaduais, municipais e do Distrito Federal. Essa conta deve ser feita apenas com base na arrecadação de impostos e transferências (ficam de fora os recursos advindos de taxas e contribuições).

As constituições estaduais ou as leis orgânicas municipais podem determinar patamares superiores aos nacionais e esses novos percentuais devem ser os mínimos observados. O Fundeb é a maior fonte de verbas para a Educação nos estados e municípios e contempla toda a Educação Básica. Ele abrange mais impostos do que o antigo Fundef e conta ainda com uma contribuição maior do Ministério da Educação (antes, o MEC entrava com cerca de 1% dos recursos anuais e esse patamar deve chegar a 10% em 2010, sendo que os outros 90% sairão dos cofres estaduais e municipais).