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O primeiro inspetor

No século 19, gestor enfrentou problemas parecidos aos de hoje

POR:
Gustavo Heidrich
Ilustração: Kako
Ilustração: Kako

Com pressa, o homem austero entra em um cubículo no palácio do governo da província de São Paulo. Ajeita o laço da gravata de cetim e se prepara para mais um dia de trabalho. Na mesa, lê-se o nome do cargo que Diogo de Mendonça Pinto, retratado na ilustração acima com base em daguerreótipo da época, exerceu de 1851 a 1872: Inspetor Geral de Instrução Pública.

Em meados do século 19, Mendonça começava o dia lendo os relatórios dos cerca de 90 funcionários que fiscalizavam as escolas provinciais. Em todos os textos, uma tônica dominante: falta de professores, escolas, recursos, regulamentos, códigos e organização administrativa.

Foi em 1824, com a promulgação da Constituição do Império, que a instrução primária gratuita se tornou obrigatória "para todos os cidadãos" (menos os escravos). Três anos mais tarde, surgiu a legislação pioneira do ensino público nacional. Ela instituiu o concurso público para professor, uma política salarial para a categoria e a obrigatoriedade de escolas de "primeiras letras" (o correspondente hoje às series iniciais do Ensino Fundamental) em todas as cidades e vilas.

Porém qualquer cidadão sem formação específica, comprovando certas habilidades intelectuais e idoneidade moral, podia se tornar professor. Ele recebia ordenado do governo local e tinha de garantir o funcionamento de salas de aula, geralmente instaladas em prédios públicos em mau estado de conservação. Não era o caso de Diogo de Mendonça Pinto. Ele tinha uma sólida formação jurídica e iluminista e experiência como delegado e juiz - que, na época, eram credenciais para exercer a tarefa de uniformizar e fiscalizar a instrução pública e privada.

Mecanismo de controle do Estado

Com a publicação de um ato adicional à Constituição, em 1834, a responsabilidade pelo então Ensino Primário foi transferida para as províncias (o Superior era prerrogativa do poder central e o Secundário estava oferecido por instituições particulares e apenas um colégio público, o Pedro II, que funciona até hoje no Rio de Janeiro). Cargos como o de Mendonça foram criados para que o Estado controlasse a Educação. Cabia aos inspetores dar unidade aos modelos de organização das aulas e aos métodos de ensino. "Eles foram os primeiros gestores escolares do país", diz Maria Lucia Spedo Hilsdorf, da Universidade de São Paulo.

Durante o período em que ficou à frente da inspeção geral em São Paulo, Diogo de Mendonça Pinto dividiu o ensino paulista em módulos, instalou unidades distritais de fiscalização e defendeu a obrigatoriedade da Educação em todo o país, preocupando-se em colocar os interesses públicos acima dos privados. Diante dos problemas enfrentados - curiosamente próximos dos atuais -, o inspetor geral manteve certo otimismo consciente: "A distância a transpor ainda é incomensurável e permanecerá imensa enquanto altamente não nos interessarmos pelos desenvolvimentos intelectual e moral do nosso povo. Mesmo que se conquiste a liberdade e se proclame nossa emancipação política, o que se fará se não formos educados para o seu exercício?", questionou o inspetor geral num relatório de 1854.

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BIBLIOGRAFIA
Escola Normal da Praça: o Lado Noturno das Luzes
, Carlos Monarcha, 428 págs., Ed. Unicamp, tel. (19) 3521-7728, 40,50 reais
História da Educação Brasileira: Leituras, Maria Lucia Spedo Hilsdorf, 135 págs., Ed. Thomson Learning, tel. (11) 3665-9900, 35,90 reais 

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