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Blog Aluno em Foco

Questões sobre orientação educacional, ética e relacionamentos na escola

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Como promover a interação entre diferentes idades

POR:
Flávia Vivaldi

Foto: Shutterstock

“Como organizar os horários das crianças de forma a garantir espaço e segurança para todos?” “Devo escalonar por turmas para que os pequenos não se misturem com os maiores?” “Mas e quando as turmas se revezam, o que fazer com o barulho do recreio que se prolonga por mais tempo e acaba comprometendo as salas que já estão em aula?” Todas essas questões permeiam muitas escolas, principalmente aquelas em que há um único pátio para a recreação dos alunos – ou seja, a maioria.

Considerando a atenção que devemos ter com as crianças e os adolescentes, vamos fazer uma revisão de alguns fundamentos imprescindíveis para a compreensão e a organização dos momentos de intervalo, que é quando os encontros citados acima acontecem.

No recreio dos alunos do Ensino Fundamental há muito barulho, correria, conflitos e machucados. Nessa fase, eles têm uma necessidade natural de liberar a energia acumulada durante o período em que ficam em sala de aula, mas a teoria do desenvolvimento nos ajuda a compreender outros motivos dessa agitação. É preciso considerar as diferenças significativas nas atitudes das crianças de 6 a 12 anos do ponto de vista das relações que estabelecem com as regras de convívio social.

Até por volta dos 8 anos, elas manifestam um egocentrismo intermediário entre as condutas socializadas e as puramente individuais. Isso significa que, embora acreditem que estejam respeitando os combinados de um jogo ou de qualquer outra brincadeira, sempre que preciso elas adaptam as regras aos seus interesses, sem que isso se traduza necessariamente em uma busca por vencer os pares. Nessa idade, o brincar é um prazer motor e não social, ou seja, os pequenos se divertem pela sensação física que a atividade provoca e não pela interação com os colegas. Além disso, nessa idade elas imitam intensamente os mais velhos.

A partir dos 8 anos, surge o desejo de ganhar o jogo ou ser o “dono” ou o “chefe” da brincadeira. Nessa fase, a garotada também passa a observar as regras com grande preocupação para que elas e os combinados sejam fixos e comuns a todos, o que dá origem à cooperação. Odivertimento já é social e, portanto, há uma tendência maior à regulação dos comportamentos de cada um ao jogar e brincar. No entanto, ainda encontramos desencontros consideráveis entre as informações sobre as regras e a forma como elas são seguidas, ou seja, os pequenos jogam e brincam como pensam ser o correto.

Já aos 10 anos, as crianças passam a apresentar uma maior capacidade de codificar as regras e os combinados. Por isso, aparecem as “discussões verdadeiras”, em que os sujeitos pensam em todos os casos possíveis do jogo, demorando mais tempo discutindo como deverá ser a partida do que propriamente jogando. Nessa etapa, Jean Piaget (1896-1980) explica que as relações sociais são formadoras dos sentimentos morais.

Com base nessa reflexão, podemos pensar em algumas estratégias favoráveis ao desenvolvimento de nossos alunos e à interação entre diferentes idades durante o momento de atividades livres, lembrando, é claro, que essas faixas etárias são apenas referências e que cada criança tem seu ritmo próprio de desenvolvimento. Uma das possibilidades é envolver os estudantes da primeira etapa do Ensino Fundamental com os da segunda na organização do intervalo, ou seja, uma monitoria de recreio.

Há algum tempo realizamos essa experiência na escola em que atuo. Nossa inciativa buscou agir em duas direções: auxiliar o intervalo dos pequenos, que regularmente se desentendiam e se machucavam e, ao mesmo tempo, oferecer aos alunos maiores vivências morais com o exercício concreto da responsabilidade, da generosidade, do respeito e da justiça, entre outros valores.

Nós tínhamos sido contemplados com uma doação de brinquedos, que foram separados em diferentes baldes e caixas de acordo com a faixa etária mais adequada. No entanto, não seria prudente nem responsável distribuí-los no pátio sem que houvesse uma preparação de quem iria acompanhar o momento de diversão das crianças, cuidando para que não houvesse agressão ou ferimentos.

O processo não foi tão simples. Mais do que simplesmente solicitar que alunos mais velhos vigiassem os menores para que não se machucassem, era necessário saber quem gostaria conhecer e ter a experiência de monitoria. Além disso, precisamos conversar com os participantes sobre as características dos pequenos e como era esperado que, de acordo com a etapa do seu desenvolvimento, eles reagissem. Também preparamos uma orientação com base em perguntas como: “De que maneira você poderia ajudar em determinada situação, garantindo os princípios de respeito e justiça para todos?” e “Qual seria o tom utilizado para falar com os pequenos e qual a maneira mais construtiva de se fazer isso?”. Dessa forma, os estudantes interessados em participar puderam se aprofundar ainda mais nas reflexões e práticas morais que já eram trabalhadas na escola. É importante ressaltar que os monitores estudavam no período contrário ao da experiência relatada, não afetando, portanto, suas atividades escolares.

O mais interessante dessa etapa de preparação foi conferir o quanto é positivo oferecer espaços de protagonismo para os alunos. Ao delegar a eles a tarefa de organizar as equipes de monitoria e os dias e horários mais compatíveis com a disponibilidade deles, fui surpreendida pelo senso de responsabilidade, compromisso e liderança dos adolescentes. Além de comparecerem aos nossos encontros de formação, eles me enviavam por e-mail os relatos do que tinham observado e como haviam agido diante das mais diversas situações vivenciadas. As professoras das salas dos primeiros anos do Ensino Fundamental também me davam notícias de como os alunos estavam reagindo em relação à convivência com os mais velhos.

Como os estudantes voluntários foram, em sua maioria, do 9º ano – a iniciativa aconteceu a partir de meados de setembro e eles sairiam da escola no final do ano – tivemos apenas alguns meses para avaliar a estratégia. Entretanto, o tempo foi suficiente para constatar que a interação no recreio entre turmas de diferentes faixas etárias pode ser extremamente saudável. A garantia da boa convivência não se dá por meio de doutrinação ou de discursos dos adultos, mas sim pelo exercício pleno de ao menos dois princípios morais: o do respeito e o da justiça, para todos e entre todos.

E você? O que pensa sobre o convívio de alunos de diversas idades nos momentos de recreio? Compartilhe conosco sua experiência.

Cumprimentos mineiros e até a próxima sexta-feira! Isso mesmo, a partir da semana que vem o dia do nosso encontro vai mudar. Espero você aqui, no mesmo local, no dia 21 de novembro.