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Leia dicas e respostas da especialista em Psicologia da Educação, Catarina Iavelberg, sobre a vida escolar dos alunos e sobre a relação entre a instituição e a família

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Catarina Iavelberg
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Atenção ao amigo-oculto

Rituais de fim de ano, como essa antiga brincadeira, têm de ser bem conduzidos para evitar constrangimentos

POR:
Catarina Iavelberg
Catarina Iavelberg. Foto: Tamires Kopp Nosso Aluno

Catarina Iavelberg é assessora psicoeducacional especializada em Psicologia da Educação

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O mês de dezembro é marcado por uma série de comemorações. As escolas costumam realizar festas, mostras de trabalhos, campeonatos esportivos e apresentações de espetáculos. Esses momentos são importantes por divulgar a produção das turmas e propiciar uma experiência de confraternização. Ao mesmo tempo, representam o encerramento de uma etapa da escolaridade - o que favorece a abertura de um espaço simbólico para a construção do próximo ano letivo. Além dos eventos organizados pela instituição, estão os solicitados pelos alunos que, embora possam parecer mais simples, exigem um planejamento da equipe gestora.

Um ritual muito aguardado é o amigo-secreto, também conhecido como amigo-oculto. O jogo funciona assim: o nome dos participantes é escrito em pequenos papéis, postos em uma caixa. Cada pessoa retira um para saber quem é o seu amigo -secreto e, a partir daí, passa a se corresponder com ele sem se identificar. A ideia é promover a interação entre a turma, criando um clima de suspense por meio da troca de mensagens anônimas - hoje, feitas também pela internet -, que devem dar pistas sobre o autor, porém sem revelá-lo. Dessa forma, os alunos têm de escolher bem o que escrevem para não acabar com o mistério, que vai, em geral, até o último dia de aula. No dia combinado, cada estudante deve falar sobre seu parceiro para a classe, descrevendo suas características, de modo que ele possa ser descoberto. Feito isso, normalmente há a troca de presentes entre os pares.

Parece uma brincadeira singela, mas, acreditem, ela pode gerar alguns problemas. Há quem não aceite o companheiro sorteado, receba bilhetes com conteúdos ofensivos, esqueça de comprar ou de levar o presente. Há até os que ficam frustrados com o que ganham. Já ouvi histórias de pais que foram se queixar com a direção porque gastaram muito dinheiro na compra de uma lembrancinha e ficaram decepcionados quando viram o que o filho recebeu. A situação pode piorar ainda mais quando um grupo cria, paralelamente, o amigo-da-onça - modalidade que sugere fazer um recorte bem-humorado da versão original do jogo, em que o amigo é, na verdade, um inimigo, e o objeto ofertado deve ter caráter cômico. Contudo, na escola, tal proposta acaba por gerar constrangimentos.

Como qualquer atividade coletiva, o jogo pode revelar conflitos, por isso precisa ser mediado pelo professor. É necessário esclarecer qual é o seu objetivo e fazer acordos sobre as regras. Também é válido antecipar eventuais problemas e discutir soluções. Várias escolas estipulam o preço mínimo e máximo das lembranças ou combinam um valor simbólico - baixo, para que todos participem. Há ainda instituições que promovem oficinas artísticas de criação, em que os estudantes produzem os presentes - como um cartão, uma pintura ou um objeto de decoração - para brindar o colega.

Infelizmente, há gestores que proíbem recreações desse tipo por receio de ter de gerenciar possíveis tensões. É uma ilusão acreditar que dá para se esquivar delas no espaço educacional. A cultura escolar é uma teia complexa constituída por saberes e poderes. Os conflitos são inerentes a essa cultura e temos que nos preparar para lidar com eles diariamente.