Como uma nota que não esperávamos no Ideb revolucionou a nossa escola
Os resultados acenderam um alerta para a diretora Neliany Marinho sobre os problemas da instituição. A primeira ação foi unir forças com a comunidade interna e externa para implementar transformações
POR: Neliany Marinho"Quando participamos do primeiro Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o Colégio Estadual Waldemiro Pita, na zona rural de Cambuci (RJ), não teve uma nota muito boa. Como naquela época não se falava tanto no Ideb e não tínhamos grande entendimento do que era, aceitei aos poucos os resultados alcançados. Só que na edição seguinte, a nota também não foi tão boa. Fiquei surpresa e fui olhar os dados. Foi aí que descobri que nosso índice de evasão e reprovação estavam muito altos.
Estudando a situação percebi, juntamente com os docentes, que poderíamos melhorar o rendimento da escola e de tudo que gostaríamos que a instituição fosse. Dependia do nosso comprometimento. Para isso, procuramos entender como esses índices se desdobravam em nossa realidade e quais seriam os caminhos para revertê-los. Para começar, quisemos fortalecer o elo com a família. Fomos a campo visitar todas as famílias, saber quem eram, como viviam, quais eram os anseios e os sonhos para o futuro dos filhos. Foi um trabalho demorado de convocação, explicando que nada aconteceria sem o apoio deles e pedindo para que eles estivessem com a gente não só naquele momento, mas enquanto seus filhos estivessem na escola. Isso motivou as famílias a participarem desta corrente.
Ao dar esse primeiro passo, percebemos que os problemas de aprendizagem se conectavam e eram influenciados por outros. Descobrimos que muitos dos pais e responsáveis, por exemplo, não sabiam ler ou não tinham concluído o Ensino Fundamental. Então, os alunos levavam as tarefas e não podiam contar com ninguém em casa para ajudá-los. Iniciamos um projeto para resgatá-los de volta aos estudos. O fato de termos pais e filhos na mesma escola fez com que eles se interessassem e soubessem o que as crianças estavam estudando e o que precisavam entregar. Quase todo dia tínhamos uma espécie de 'reunião de pais'.
Outro ponto que descobrimos ao olhar de mais perto para a comunidade foi que muitas crianças vinham para a escola sem nem mesmo tomar café. Isso afetava o desempenho deles porque aluno alimentado consegue raciocinar bem melhor. Fomos atrás de apoio da Secretaria de Educação, da Regional Norte-Fluminense e outros que poderiam colaborar e conseguimos montar uma padaria na escola. Esse é um projeto que tem mais de 10 anos e continua tendo grande importância.
Como a evasão era um problema, criamos um grupo de visitadores (professores muitas vezes indicados pelos próprios alunos), com a ajuda da Secretaria, que monitora a frequência e vão atrás dos casos de alunos faltosos, o que favoreceu a permanência na escola. Para ajudar os que tinham dificuldade, disponibilizamos aulas de reforço. Para incentivar que vissem as oportunidades do futuro, engajamos ex-alunos que concluíram a faculdade para dar palestras relacionadas às suas áreas de formação no contra turno.
Mas não fui eu quem transformei o Colégio Estadual Waldemiro Pita, foi a comunidade escolar. O que buscamos de imediato foi unir forças para que a nossa escola tivesse bons resultados. Nada se faz sozinho. Em 2011, tivemos a felicidade ser a melhor nota do estado do Rio de Janeiro no Ideb e a segunda melhor do Brasil. Hoje batalhamos para manter e melhorar esse padrão, mas muito além das notas, focamos nos alunos.
Todos os projetos e olimpíadas que ficamos sabendo, a gente participa. Incentivo os docentes que já tem graduação que continuem os estudos. Todos nossos professores são graduados e a maioria tem pós-graduação ou mestrado. Tento resgatar neles e nos estudantes essa vontade de lugar por dias melhores e isso depende de bom conhecimento e entrega de cada um.
Eu tenho felicidade e satisfação de ter colocado a Educação como propósito na minha vida. De ter incentivado e de ter feito com que muitos professores que passaram pela minha escola se tornassem verdadeiros educadores que não apenas transmitem conteúdos, mas que são comprometidos a construir aprendizagem."
Neliany Marinho, funcionária há 32 anos (20 deles como diretora) do CE Waldemiro Pita, na zona rural de Cambuci/RJ
Depoimento a Laís Semis
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