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9 dicas para planejar uma formação sobre jogos

Como um recurso que apoia a aprendizagem de conteúdos, os jogos também favorecem a socialização e o desenvolvimento de habilidades socioemocionais

POR:
Letícia Ferreira
Crédito: Getty Images

A experiência da brincadeira e do lúdico faz parte da trajetória de contato das crianças entre o mundo, as sensações, os espaços. É assim que os pequenos, nas suas primeiras experiências de socialização, conhecem os outros, criam habilidades socioemocionais, aprendem a lidar com o diferente e com o trabalho coletivo. Nas fases de aprendizagem e desenvolvimento, o uso pedagógico de recursos lúdicos é uma das primeiras estratégias de aprendizagem educacionais para crianças.

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Muito presentes na Educação Infantil, as brincadeiras ainda fazem parte do cotidiano das crianças nos anos iniciais do Ensino Fundamental, quando os alunos têm entre 6 e 10 anos. “A brincadeira é a forma, é a linguagem dela se organizar, se expressar e captar informações”, explica Maria Célia Rabello Malta Campos, doutora em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (USP) e membro do grupo de trabalho "Jogos e sua importância na Psicologia e na Educação”. A brincadeira é uma linguagem que pode fazer parte do processo da transição entre a Educação Infantil e o Fundamental dentro da sala de aula, indo além da maneira tradicional de ensinar, com fundamentos pedagógicos e resultados práticos no processo de ensino.

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Para Evandro Tortora, doutorando em Educação para a Ciência e professor de Educação Infantil do time de Autores NOVA ESCOLA, a brincadeira como estratégia pedagógica coloca o aluno no centro do processo de aprendizagem. “É uma situação lúdica em que a criança ou o adolescente pode executar uma atividade de forma ativa, em que ele é o protagonista daquela situação. Ele se coloca perante os problemas que surgem durante o jogo de uma maneira prazerosa, por meio de uma brincadeira que aborda conceitos que a escola precisa ensinar”.

O coordenador pedagógico, como um dos atores responsáveis pela articulação do corpo escolar no processo de aprendizagem, pode oferecer aos professores mecanismos e estratégias para colocar em prática o projeto político pedagógico (PPP) da escola. A introdução de jogos no ambiente da sala de aula pode ser uma dessas estratégias trabalhadas em espaços de formação dos professores, nos horários de trabalho coletivo pedagógico (HTPC) ou em reuniões pedagógicas. Confira abaixo algumas dicas para planejar sua formação: 

  1. Considere as necessidades docentes

 “Quando um coordenador vai propor uma prática diferente daquela que os professores tenham, ele tem que partir da própria necessidade dos professores”, explica o professor Evandro. Só assim, ele conseguirá planejar uma formação que atenda às necessidades de aprendizagem dos estudantes. Mesmo que a formação inclua os professores de toda a etapa, mapear quais são os desafios que os professores estão enfrentando em cada ano pode ajudar a mostrar pontos em comum a serem aprimorados pelo grupo. O acompanhamento dos planos de ensino é um dos instrumentos que o coordenador tem para perceber como os professores estão atuando em sala de aula. Ele verifica se o jogo como ferramenta pedagógica já faz parte do cotidiano de alguns docentes ou não e se existem outras práticas inovadoras.

  1. Mapeie o que eles sabem sobre o tema e como usam os jogos

Para Evandro, o professor precisa ser visto como alguém que também tem seus referenciais e experiências de como os jogos podem ser aplicados na sala de aula como um recurso de aprendizagem. São conhecimentos e perspectivas que poderão ser compartilhadas no ambiente de formação dos professores. Criar um ambiente de compartilhamento de práticas pode ser produtivo para inspirar outros professores nesse trabalho. Em sua experiência como docente universitária e como pesquisadora, Maria Célia Campos avalia que os jogos estão longe da prática pedagógica dos professores. “Eu percebia um grande desconhecimento sobre jogos, sobre a variedade de jogos que podem ser usados nas diferentes fases do desenvolvimento”.

  1. Proporcione a experiência dos jogos durante a formação

O espaço de formação pedagógica pode reproduzir o que a coordenação pretende que seus professores realizem nas salas de aulas. Isso é possível quando o professor joga e reconhece em si o efeito didático dessa estratégia. “É interessante que o coordenador consiga alinhar momentos e práticas e traga esse professor de volta, tente resgatar a criança que gosta de brincar dentro desse professor e ganhá-lo a partir desse sentimento bom, porque é ele, na verdade, que pode ganhar o docente, trazê-lo para perto”, avalia Evandro.

A prática do jogo vai além de pôr o jogo em prática. O coordenador pode sugerir dinâmicas em que os professores poderão criá-los, reproduzir modelos que já existem e assim eles poderão conhecer a estrutura desse recurso pedagógico. “O profissional vai se apropriando da lógica daquele jogo, da sua estrutura e pratica os jogos pra ampliar esses recursos”, afirma a doutora em psicologia escolar Maria Célia. 

  1. Use a prática para embasar a teoria e quebrar resistências

 Colocar a mão na massa desperta o professor e quebra barreiras que vem das formações iniciais dos docentes mais familiarizados com o modelo de aulas expositivas. “Quando existe uma maneira nova de trabalhar e que foge dessa ideia expositiva, há uma resistência, mas o coordenador precisa ganhar o professor de alguma forma”, ressalta Evandro. Colocar o professor dentro de uma metodologia que é ativa, segundo a especialista Maria Célia, é um ganho para a coordenação pedagógica. “Em várias linhas de metodologia ativa o aluno está no centro, é a atividade do aluno que constrói o conhecimento”. A experiência prática é um caminho de oportunidades para trazer os professores para uma reflexão teórica do que eles absorveram criando e jogando uns com os outros. É nesse momento que o coordenador pode apresentar os referenciais teóricos para aplicar jogos nas salas de aula, mostrar iniciativas bem-sucedidas, discutir os fundamentos didáticos dos jogos utilizados e fazer associações entre a prática que os professores tiveram e a teoria que a escola considera adequada para a prática proposta.

  1. Planeje para provocar reflexões (e para ir além das soluções prontas)

Para Maria Célia, seriam três momentos de formação. “O primeiro é entrar em contato com o jogo e a sua reconstrução, praticar o jogo, sentir o jogo na pele. Depois, partir para uma análise, refletir sobre isso, fazer uma leitura nesse sentido e, por fim, voltar para o jogo e fazer essa análise, assim a professora se apropria”. É uma maneira de evitar que os professores usem o jogo como uma solução pronta sem reflexão. “Não é só jogar. É ter estratégias, dependendo da intencionalidade da professora naquele momento junto ao grupo”, completa.

  1. Apresente a didática por trás dos jogos

De acordo com Patrícia Cândido, profissional do Centro de Estudos e Formação de Professores do Colégio Santa Maria (Prisma), a coordenação pedagógica pode discutir os jogos com os professores como um recurso que vai além do lúdico, como um caminho para aprender. Assim,  os coordenadores precisam transmitir aos professores o processo de aprendizagem para que estes possam aplicar com os estudantes. “Como o jogo é um recurso para o aluno aprender Matemática (ou outro componente curricular), é necessário olhar para ele como etapa de planejamento. Então não só é vê-lo uma única vez, mas trabalhar o conceito várias vezes”. Segundo Patrícia, o trabalho da coordenação é mostrar os jogos como uma sequência de etapas de aprendizado que o professor deve transmitir. Apresentar didáticas, orientações de observação e estratégias de intervenções possibilita que os professores se apropriem mais da dinâmica e benefícios dos jogos – o que pode mobilizar os docentes mais resistentes à novas práticas e também garantir que a aplicação dos jogos em sala traga resultados positivos para a aprendizagem e o engajamento da turma.

  1. Leve em conta as características do grupo na duração da formação

O coordenador precisa conhecer as características do grupo de professores que poderão ser formados para avaliar as necessidades e estabelecer um período de formação. “Se ele percebe que um grupo de professores nunca teve contato com jogos e que ele precisa realmente começar do zero, trazer a necessidade para os professores vai demandar um tempo maior”, pontua Evandro. “Se ele chega e conversa com os professores, alguns têm práticas muito interessantes para serem compartilhadas, ele pode programar momentos em que essas práticas possam ser socializadas”. Segundo Evandro, com essa mesma avaliação, se o coordenador tiver um tempo restrito, ele terá subsídios para tirar o melhor proveito do tempo disponível com os professores, mesmo que não seja o ideal.

  1. Desconstrua ideias errôneas sobre o uso dos jogos

O professor Evandro também chama atenção para a maneira muitas vezes negligente que os jogos são aplicados no contexto de aprendizagem. “Ele é sempre visto como um pagamento ou como uma forma de premiar as crianças e os adolescentes por uma tarefa realizada de acordo com as regras da turma”. O que reduz a função didática da proposta, segundo o professor. Outro ponto de atenção entre os coordenadores que pretendem compartilhar o jogo como uma ferramenta didática entre os professores do seu grupo de trabalho é quando o jogo é baseado apenas em um conteúdo curricular. “Se só ganha quem souber fazer bem uma conta, quem tiver o conceito, onde está a estratégia, o raciocínio do jogador? Fica em segundo plano”, questiona Maria Célia. As crianças podem criar aversão aos jogos se não tiverem familiaridade com o conteúdo.

  1. Apoie os professores no desenvolvimento das ações

O coordenador também tem o papel de acompanhar o desenvolvimento do professor nas suas novas práticas em sala de aula. “Pode ser combinado com o professor a observação de aplicações práticas”, explica Patrícia. Com a permissão do docente, o coordenador pode acompanhar a aplicação de uma atividade de jogos pensados a partir do momento de formação. O projeto de formação proposto por um coordenador pode incluir horários pedagógicos de esclarecimento de dúvidas, troca de experiências entre os docentes que participaram da formação, com espaço para comentários construtivos do coordenador pedagógico. Para o professor Evandro, o trabalho de acompanhamento do coordenador deve compreender o antes, durante e depois da prática. “O antes pensando no contexto todo de avaliação e de levantamento das necessidades de novas práticas. O durante as formações, que ele proporcione momentos para a construção, para jogar e se relacionar com a teoria e, depois, o acompanhamento das práticas dos professores”.

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