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Parceria entre escola e conselho tutelar

Cabe aos gestores procurar os conselheiros para garantir os direitos da criança e do adolescente

POR:
Aurélio Amaral

Evasão, maus tratos, dependência química. Quando os problemas que envolvem os alunos fogem da competência da escola - seja porque se esgotaram todos os recursos para tentar solucioná-los internamente, seja porque as questões envolvem infrações penais e tratamentos de saúde -, a equipe gestora deve ter como parceiro de prontidão o conselho tutelar, órgão que tem como missão zelar pelos direitos da criança e do adolescente e com o qual a escola precisa buscar um diálogo permanente. Essa parceria, inclusive, está prevista em lei. O artigo 56 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) confere aos dirigentes de estabelecimentos de Ensino Fundamental e de Educação Infantil o dever de comunicar ao conselho tutelar os casos de faltas frequentes injustificadas, evasão escolar e repetência. Se necessário, é possível ter sempre conversas presenciais com a entidade (saiba o que fazer para ter uma boa parceria nas ilustrações abaixo). "É positivo que os conselheiros sejam convidados para discutir os casos com a equipe gestora e propor encaminhamentos. Quanto mais a escola buscar o órgão e exigir providências, mais sólida será a rede de proteção da criança e do adolescente", explica Raimunda Núbia Lopes da Silva, do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

O conselho tutelar costuma ter cinco membros, que podem ser eleitos pela comunidade ou indicados (saiba mais sobre a formação desse órgão no quadro da última página). Contudo, ele só deve ser acionado quando estiverem esgotados todos os recursos ao alcance dos gestores escolares e professores: conversar com o aluno e, se necessário, visitar a família. Só quando os responsáveis apresentam resistência ou são eles próprios o cerne do problema - como acontece nos casos de violência doméstica - é que ele vai entrar em ação. Quando há evasão escolar - considerado um dos exemplos mais graves de desrespeito aos direitos da criança e do adolescente -, a escola é a entidade que mais dispõe de ferramentas para localizar o aluno e trazê-lo de volta: além do telefone e do endereço residencial, ela tem o histórico escolar, os registros das conversas com os pais ou responsáveis, a frequência nas aulas e as notas dos últimos bimestres. Todos esses dados podem dar pistas sobre os motivos do abandono (saiba em que casos o conselho tutelar deve ser acionado no quadro da última página).

Para uma relação eficiente com o Conselho Tutelar

 Ilustração: Mario Kanno

1. Informar sobre faltas, evasão ou suspeitas de violência e definir com os conselheiros prazos para resolver os casos.

 Ilustração: Mario Kanno

2. Convidar os conselheiros a fazer palestras, participar de reuniões e conhecer o projeto político-pedagógico.

 Ilustração: Mario Kanno

3. Procurar saber sobre o andamento do processo por telefone ou indo pessoalmente à sede do conselho.

 

 Ilustração: Mario Kanno

4. Cobrar as instâncias locais se o órgão não tiver condições de trabalhar por falta de estrutura ou recursos humanos.

 Ilustração: Mario Kanno

5. Acionar a Procuradoria do Município ou, em último caso, o Ministério Público quando há omissão do órgão.

 

 

 

O excesso de demanda pode prejudicar o atendimento às escolas

Palestras aos alunos. Foto: Laura Fabricio
PALESTRAS AOS ALUNOS Conselheiras de São Borja visitam as escolas e explicam os conceitos do ECA aos alunos
Informações valiosas. Foto: Marina Piedade
INFORMAÇÕES VALIOSAS O trabalho da diretora Jurema (à esquerda) com membros do conselho, como Ednara, garante a inclusão

Quem consegue estabelecer um bom contato com o conselho só tem a ganhar. É o caso da EMEF República Argentina, em São Borja, a 584 quilômetros de Porto Alegre, que zerou a evasão escolar graças a um programa de palestras ministradas pelos conselheiros aos alunos. Uma vez por semestre, uma aula é reservada para que os jovens se interem dos fundamentos do ECA. "Bem informados sobre seus direitos e deveres, eles se sentem mais à vontade e seguros para relatar eventuais problemas e procurar ajuda", conta a diretora da escola, Rosa Maria Pimentel.

Para construir uma relação harmoniosa com os conselheiros, a diretora Jurema Dantas, da EMEB Assas Brancas, em Taboão da Serra, município da Grande São Paulo, fez questão de se aproximar do órgão assim que assumiu o cargo. A escola tem 16 alunos que são internos de um abrigo infantil, localizado no terreno ao lado. "Como eles não têm convívio familiar, o conselho é praticamente a única fonte de informações sobre o histórico dessas crianças. Conhecê-lo é fundamental para desenvolver um trabalho de integração", explica Jurema. O contato constante, por ofício e telefone, contribuiu para que o caso de maus tratos do qual um estudante de 8 anos era vítima fosse investigado e resolvido rapidamente. Em poucos dias, a criança foi levada a local seguro.

O conselho tutelar de Taboão da Serra atende até quatro chamados em um dia. Apesar do movimento intenso, chegou a ficar meses com dois membros a menos por causa de um pedido de exoneração feito muito antes das eleições para uma nova formação do conselho e uma licença médica. "Em todos as ocasiões, procuramos responder prontamente às escolas. Porém, por conta da demanda, nem sempre isso é possível", reconhece a conselheira Ednara Matos.

O discernimento do diretor é fundamental na hora de denunciar

Situações que configuram infração penal por parte dos responsáveis devem ser reportadas imediatamente ao órgão para que ele faça a intermediação com a assistência social, a Justiça ou as delegacias especializadas. Para casos de indisciplina e questões familiares, vale a regra de usar todos os recursos para resolvê-los internamente. "O gestor tem de saber distinguir problemas internos de crimes", enfatiza Fábio Meirelles, coordenador-geral de direitos humanos do Ministério da Educação. Porém nem tudo é tão claro e evidente. Um episódio envolvendo o uso de armas brancas ou de fogo configura claramente infração penal. Mas se o caso for uma briga, ainda que violenta? Vale a pena acionar o conselho? "Depende do histórico dos estudantes envolvidos e das causas que motivaram a agressão. O poder de discernimento do diretor é fundamental nessas horas", pondera Miriam Abramovay, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), de Brasília.

Embora não seja necessário contatar o conselho em situações que possam ser resolvidas internamente, a escola pode incluir no seu relatório periódico - a recomendação é enviá-lo a cada mês ou bimestre - as preocupações da equipe gestora com algum aluno. Dessa forma, o órgão fica por dentro do histórico recente do estudante tem mais ferramentas para solucionar o caso se as preocupações tiverem fundamento. "Os relatos funcionam como um controle para o gestor e para os conselheiros", afirma Adriana de Fátima Santos, professora-mediadora da EE Ernesto Quissak, em Guaratinguetá, a 174 quilômetros de São Paulo, encarregada de fazer a comunicação entre a escola e o conselho.

Dentre as funções do órgão está a verificação do aproveitamento escolar a fim de determinar aos pais ou ao responsável as medidas para solucionar os problemas que estejam atrapalhando o desempenho e exigir a matrícula de alunos com base em decisões judiciais. Ele só não tem competência para interferir em assuntos internos da instituição, como propor mudanças pedagógicas. Dependendo da relação construída com os gestores, os representantes podem participar de algumas reuniões internas como observador. "Escola e conselho existem para o bem da criança e do adolescente. Desde que eles não interfiram em suas respectivas funções, as atividades conjuntas são positivas", diz Fábio Meirelles.

Mais sobre o Conselho Tutelar

O que é Órgão municipal que passou a existir com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para zelar pelos direitos dos menores em casos de omissão do Estado, dos responsáveis ou desvios de conduta dos próprios jovens.

Onde encontrá-lo Geralmente fica instalado em uma dependência da prefeitura. É obrigatório que toda cidade tenha pelo menos um conselho tutelar. Em cidades grandes, deve existir um para cada 200 mil habitantes. No entanto, o órgão não está presente em 2% dos municípios brasileiros.

Quem são os conselheiros Pode ser qualquer cidadão maior de 21 anos que tenha idoneidade moral, ou seja, que demonstre integridade. Os municípios têm a liberdade de incluir outras exigências, como ter diploma de Ensino Superior ou formação específica em Pedagogia, Direito ou Psicologia.

Como são escolhidos os membros São cinco conselheiros que podem ser eleitos ou indicados. Eles cumprem um mandato de três anos e é permitida uma recondução. O pleito é convocado e divulgado pelo próprio conselho, mas a regulamentação depende do município.

Casos para acionar o Conselho

Evasão escolar Desde que esgotados os recursos escolares.

Abandono familiar Quando a criança ou adolescente não se encontram inseridos num contexto familiar, evadiram-se de casa ou em qualquer outra situação que demanda um acolhimento de curta duração.

Violência doméstica Não é necessário ter a confirmação. A simples suspeita de maus tratos deve ser comunicada ao conselho tutelar (ou ao Ministério Público e Juizado da Infância e Juventude).

Dependência química Esgotados os recursos previstos no regimento escolar, o conselho deve ser informado para que os adolescentes sejam encaminhados aos programas de atendimento específico.

Porte de armas ou tráfico de drogas dentro da escola Após seguir as normas internas, os adolescentes deverão ser encaminhados para uma delegacia especializada, e as crianças, aos programas que adotam as providências sociais, pedagógicas, psicológicas e administrativas adequadas

Quer saber mais?

CONTATOS
Conselho Tutelar de Guaratinguetá, tel. (12) 3133-2791
Conselho Tutelar de Taboão da Serra, tel. (11) 4701-1618
Conselho Tutelar de São Borja, tel. (55) 3431-1480
EE Ernesto Quissak, tel. (12) 3122-2807
EMEB Asas Brancas, tel. (11) 4701-4942
EMEF República Argentina, tel. (55) 3431-5250
Fabio Meirelles
Miriam Abramovay
Raimunda Núbia Lopes da Silva