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Coordenador, você não sabe de nada!

Essa é uma certeza que todo coordenador precisa ter em mente ao começar o ano

POR:
Joice Lamb
Aprender com os erros dos outros vai fazer você entender os problemas da escola e compreender os colegas   Foto: Getty Images

Então o Ano Novo traz uma função nova, numa escola nova (ou não) e junto com ela um montão de desafios. Será que vou dar conta do recado? Já estive nesse mesmo lugar e poderia, se vocês tiverem interesse, compartilhar alguns erros e acertos que aconteceram comigo.

Primeiramente tenha uma certeza em mente: “Você não sabe de nada”. Se for uma nova escola, você não sabe nada porque não conhece a escola, se é na mesma escola na qual você lecionava antes, não sabe de nada porque não olhou para sua escola do ponto de vista da coordenação.

Não estou dizendo que você não sabe de nada porque não tem qualificação para a função, não é por aí. Estou dizendo que você precisa aceitar que não sabe de nada e que não vai chegar com a solução mágica para os problemas de ninguém. Ninguém está esperando que você chegue com essa possibilidade, mas sim, com desconfiança, cautela e até talvez, quem sabe, um pouco de esperança.

Aceitar que não se sabe de nada nos faz mais humildes, mais próximos e muito mais capazes de olhar para o entorno sem preconceito, além de fazer-nos ansiosos por descobrir e conhecer toda a comunidade escolar. Não creio que eu soubesse disso na época em que comecei. Fosse esse o caso, talvez tivesse evitado que muitas ideias que borbulhavam na minha cabeça fossem desperdiçadas em projetos que não tiveram adesão, nem conclusão.

Aceitar que não se sabe de nada não é gritar aos quatro ventos que você não sabe o que está fazendo lá, nem por onde vai começar. É uma disposição interior, um compromisso que você assume consigo mesmo de que vai entrar nessa permitindo que os outros se mostrem, que a comunidade lhe acolha, sem derrubar sobre eles todo o seu conhecimento e sabedoria, erguendo um muro muitas vezes intransponível.

Entendido isso, você precisa de informação. Busque em sites especializados os índices da escola na Prova Brasil, no Ideb, Ana, índices de aprovação, reprovação e evasão. Organize os dados de forma que você compreenda se a escola evoluiu ou não, se a dificuldade maior está em Língua Portuguesa ou Matemática, em que séries a escola mais reprova, e tudo mais que passar por sua cabeça. Essas informações são públicas e qualquer pessoa pode ter acesso. Dessa forma, você constrói uma imagem da escola. Mas lembre-se: mesmo com todas essas informações, você ainda não sabe de nada porque atrás desses dados há pessoas, que estavam fazendo o seu trabalho e tomaram certas decisões que levaram a estes números. Positivos ou negativos não importa. Os números não são nada sem as pessoas.

Na secretaria da escola também é possível encontrar muitas informações úteis, tanto nos arquivos como com o próprio secretário. Se a escola não possui um sistema prático que organiza os resultados de cada ano, você pode dar uma olhada nas atas finais dos últimos anos letivos e ver qual o perfil dos alunos que estão sendo reprovados, a distribuição de turmas e quais os índices de aprovação de cada professor.

Depois de conhecer todos os dados da escola, o próximo passo é estabelecer uma parceria com seus colegas na equipe pedagógica. Na rede na qual trabalho, os gestores começam a trabalhar antes dos professores o que dá um bom tempo para que a equipe se conheça, converse e estabeleça como vai trabalhar. Nossa equipe na escola tem reuniões semanais para discutir e tomar decisões. Ninguém deve estar sozinho, nem a coordenação, nem a direção, muito menos alunos e professores. Uma equipe segura consegue conduzir a escola com tranquilidade e o coordenador é uma parte importante dessa equipe.

Quando os professores chegarem, você e sua equipe já devem ter as primeiras reuniões programadas. É neste momento que você se apresenta e começa a conhecer os colegas. É importante realizar atividades que permitam que todos possam falar e opinar sobre a escola a partir do seu ponto de vista, quais são os pontos positivos e o que pode melhorar. Também seria importante mostrar a todos a análise que você fez a partir dos índices da escola. Sei por experiência própria que geralmente esses números não são levados em conta pelos professores. Em muitas escolas, nas reuniões iniciais, são discutidas algumas metas para o ano letivo. Participe desta discussão e aceite as decisões feitas coletivamente. Se você for um bom observador conseguirá compreender como as decisões são tomadas, quem participa mais, quem aparenta ter mais poder, quem se omite. Lembre-se novamente que você não sabe de nada e que precisa compreender as relações que se estabelecem, sem julgar ou tomar partido.

Durante o ano letivo, uma de suas funções será planejar e organizar as coisas para que as metas sejam atingidas e o processo seja avaliado. Fazer uma parada no meio do ano para avaliar o que está sendo realizado sempre é positivo. Se você busca ajudar a construir uma escola democrática e autônoma, precisa que todos participem dessa avaliação: alunos, professores, funcionários e pais.

Lembre-se de que nenhum projeto ou meta se estabelece no primeiro ano. Se sua escola já tem uma caminhada positiva em relação ao desempenho dos alunos e uma identidade constituída fica mais fácil, mas não menos trabalhoso. Se sua escola ainda está lidando com resultados negativos, não se desespere. Continue conhecendo e aprendendo sobre/ com os colegas e alunos, sempre tentando configurar alguns índices e parâmetros para demonstrar o desenvolvimento ou a estagnação do trabalho.

Se existe uma dica que eu tenho prazer em compartilhar é esta: colete, analise e divulgue dados. Tanto os dados oficiais externos, como dados coletados dentro da própria escola. Por exemplo, identifique o nível de escrita e leitura dos alunos ao final de cada ano do ciclo de alfabetização e compare com os outros anos ou compare as avaliações dos alunos no meio e no final do ano letivo. Assim fica mais fácil identificar os problemas. Precisamos trabalhar a partir de problemas reais da escola para alcançar mudanças que possam ser mensuráveis.

De resto, só posso desejar boa sorte e lembrar mais uma vez que a gente não sabe mesmo de nada e só começa a conhecer quando se permite olhar para fora e para dentro, sem preconceito.

Joice Maria Lamb é professora da rede municipal de Novo Hamburgo-RS desde 1991 e já teve turmas em quase todos os anos do Fundamental I e II. Atualmente, atua como coordenadora pedagógica da EMEF Profª Adolfina J. M. Dienfenthäler. É formada em Letras, tem especialização em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica e foi uma das 50 finalistas do Prêmio Educador Nota 10 2017.

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