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Grazia Gotti fala sobre escola leitora

Pesquisadora italiana sugere estruturas e programação diferentes para as turmas de idades variadas

POR:
Beatriz Santomauro, GESTÃO ESCOLAR
Grazia Gotti. Foto: Raoni Maddalena
Grazia Gotti. Foto: Raoni Maddalena

As crianças da Educação Infantil podem frequentar a mesma biblioteca que os jovens do Ensino Médio? Podem, mas, se os lugares dedicados aos livros forem pensados e adaptados especialmente para atender às características de cada público, a chance de atrair leitores - e mantê-los - aumenta bastante. Essa é a opinião de Grazia Gotti, pedagoga e pesquisadora italiana que já foi professora de creche e dos anos iniciais do Ensino Fundamental em seu país. Desde 1983, quando fundou a Cooperativa Cultural Giannino Stoppani, que integra livraria, editora e escola de formação, em Bolonha, ela se dedica a estudar o comportamento dos jovens leitores e os espaços dedicados a eles.

Grazia escreve diariamente no blog Zazie News - Almanaque de Livros para Jovens e, em 2013, publicou A Scuola Con i Libri - Avventure di Una Libraia Maestra (180 págs., Ed. Rizzoli, sem tradução para o português). "Meu objetivo é que o jovem leitor se torne um explorador capaz de descobrir o mundo comodamente deitado em sua cama ou desajeitado numa poltrona, debaixo do guarda-sol na praia, à sombra de uma árvore ou sentado no ônibus ou no metrô", resume. Na entrevista abaixo, confira como ela indica que essas metas sejam alcançadas.

Quais as características de uma escola leitora?
Grazia Gotti Ela é feita pela postura das pessoas que a frequentam: se os professores são leitores apaixonados e convencidos de que os livros são os principais instrumentos de renovação cultural, o mais difícil já está feito. Infelizmente, muitos docentes não têm essa característica - e isso acontece em todo o mundo - porque eles próprios vêm de escolas que não conseguiram formá-los como leitores. Quando se tornam profissionais, reproduzem o mesmo modelo.

O que torna uma biblioteca atraente?
Grazia Ter obras variadas - clássicas originais e adaptadas, biografias, ficção científica, aventura, romance, terror, poesia etc. - ajuda, mas não é suficiente. É preciso um espaço onde sejam desenvolvidas atividades ligadas à leitura, à escrita e à promoção da Educação da escuta, com conversas com especialistas, estudiosos, críticos e escritores. Importante também é esse ambiente ser agradável e ter visibilidade, com móveis, disposição e iluminação, tudo muito bem pensado. A ordem e a maneira inteligente de apresentar os livros, colocando-os em prateleiras abertas e deixando as capas à mostra, transformam o lugar.

Como deve ser uma biblioteca para crianças até 5 anos?
Grazia A presença desse espaço específico em creches e pré-escolas já evidencia que a pedagogia do lugar se fundamenta em relações, narrações, escuta, troca e na indispensável escolha dos livros como instrumento primordial de aculturação, no senso cognitivo e estético. O ideal é que as obras fiquem bem visíveis tanto para as crianças como para os pais. Em uma escola de Bolonha, em vez de parede, foi construído um complexo de estantes para separar o pátio do refeitório. Funciona como uma grande biblioteca em que os pais também podem pegar obras para ler em casa, marcando uma continuidade educativa entre a instituição e a família.

E para crianças do Ensino Fundamental?
Grazia Ao longo da vida escolar, os alunos se deparam com dois tipos de biblioteca: a de classe - em que o professor escolhe os exemplares da estante de acordo com o seu planejamento - e a da instituição. Para que essa última tenha sucesso, é necessário um trabalho coletivo e um consenso de sua importância e centralidade. No meu livro, conto uma experiência que deu ótimos resultados ao transformar uma escola triste do ponto de vista arquitetônico em um lugar vivo e estimulante. As fases de criação da biblioteca envolveram professores e estudantes. Foi decidido que ela seria montada na sala mais espaçosa do térreo para facilitar o acesso. Depois de mobiliada e ocupada pelas obras, pensou-se no layout e na forma de comunicação com os usuários. Sem tecnologia à disposição para fazer cópias das capas mais bonitas e colocá-las na parede externa, as crianças - assim como teriam feito os aprendizes de um antigo ateliê de arte - as reproduziram manualmente, aprendendo diferentes técnicas gráficas. Essa decoração teve a intenção de fazer com que todos compreendessem que se tratava de uma sala mágica, cheia de tesouros. Hoje, com tantos recursos disponíveis, pode-se colocar telões posicionados na frente do local para divulgar o acervo. Esse tipo de mensagem em vídeo é bem familiar a todos, mas é pouco explorado para promover livros.

Como atrair o público do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) para esses espaços?
Grazia Para os jovens, a biblioteca deve ser de livre consulta e, se possível, gerida por eles mesmos. Assim, desenvolverão atividades de seu interesse, como a organização de encontros com autores. O essencial é ajudá-los a compreender que uma obra como Apologia de Sócrates, de Platão, é tão contemporânea quanto uma história em quadrinhos ou de suspense. Não se pode subestimar o gosto dos jovens. Por sua vez, um espaço para estimular os adultos a começar a ler, ou a ler mais, deve ser confortável, com luzes apropriadas e, sobretudo, que conte com a presença de outros adultos que os apresente ao prazer de ler. A paixão deve ser contagiante.

Como é a realidade das escolas italianas em relação à leitura?
Grazia Há exemplos luminosos e zonas de sombra. Ainda é evidente uma grande diferença entre o norte, rico e organizado, e o sul do país, muito mais pobre e atrasado. Nas áreas mais desenvolvidas, o hábito de fazer feiras do livro dentro das escolas, organizadas pelos professores e pelos pais, permite que parte do dinheiro arrecadado seja utilizada para a compra de novos volumes para a biblioteca. A experiência de adquirir uma obra - ter de escolher o título, pesquisar preço etc. - pode levar a uma maior consciência do ato. Há também áreas menos favorecidas, onde não existe um sistema bibliotecário eficiente nem presença de livrarias, e o encontro com os livros é muito difícil. Mas as coisas estão mudando, até porque a consciência do papel da cultura e do conhecimento como matéria-prima para o futuro tem ficado mais nítida. Há instituições que dedicam muita energia criativa para a promoção da leitura.

* Beatriz Santomauro, de Roma