Como lidar com funcionários resistentes a mudanças
Tem sempre alguém para dizer que algo não vai dar certo. Saiba como é possível transformá-lo em um aliado
POR: Laís SemisVocê, gestor, pesquisa e apresenta uma ideia de projeto para implantar na escola. No meio da apresentação, alguém se pronuncia com a famosa frase: “Ah, mas isso não vai dar certo” ou “Já fiz e não funciona”. Além de ter que lidar com a saia justa na frente da equipe, essa resistência a novas propostas ou mudanças em relação aos processos podem também desestimular os colegas e gerar uma descrença do impacto do que está sendo proposto. Como para o bom desenvolvimento de qualquer atividade é preciso garantir o engajamento e suporte de toda a equipe, é importante desconstruir esse posicionamento ou ressignificar as experiências negativas relacionadas.
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Há quem pense que essa resistência seja mais forte entre os docentes com mais idade ou tempo de casa. Mas não é bem assim que acontece na prática. “Muitos professores recém-formados também não abraçam a mudança. Em geral, essa resistência está associada à insegurança e não a um perfil específico”, explica Célia Senna, formadora de professores da INovAÇÃO. “A resistência parte do medo de não dar certo, de não conseguir”. Para ela, isso também se conecta com o imaginário de que o professor precisa ser um detentor de todo o conhecimento. “Quando ele sai desse papel e assume que não precisa saber tudo, mas está disposto a aprender, é muito mais fácil instaurar novas práticas”, diz.
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Os temas geradores desse sentimento são os mais diversos possíveis. Propostas de dar mais voz aos alunos, mudança na organização dos espaços, modelo de formação, avaliações, novos combinados com horários e regras da escola. Mas há um que tem assombrado as salas de aula nos últimos anos: a tecnologia. O tema é um bom exemplo de como o desafio do novo pode impedir que ele se torne uma prática.
“A tecnologia veio para nos ajudar, mas muitos ainda acham que atrapalha”, afirma Iran Frank da Silva, diretor do Colégio Estadual Ernani Vidal, em Curitiba (PR). “Não trabalhamos com imposição, mas sabemos que os que não têm domínio, acabam não usando. Por isso, nossa equipe pedagógica faz um acompanhamento para ajudá-los a se sentirem mais confortáveis com a tecnologia”, conta Iran.
Para Willmann Costa, diretor do Colégio Estadual Chico Anysio, do Rio de Janeiro (RJ), cabe também aos gestores tirarem o professor desse papel de “detentor do conhecimento”. “Sempre digo que não é desmérito não saber e não é preciso ter medo de saber menos que o aluno. O docente é especialista em uma disciplina, não precisa dominar todas as outras. Mesmo em sua disciplina, ninguém espera que ele seja um Google”.
Quando alguém diz “Ah, isso eu já fiz e não funciona”
A primeira atitude diante de um comentário como esse é calibrar a linguagem corporal e tomar cuidado com a reação para não expressar indignação, espanto ou partir para o confronto. A melhor estratégia é tentar entender o que deu errado na época em que o processo foi implantado, qual era o contexto e quais poderiam ser as soluções para os pontos que não deram certo. O ponto chave é valorizar a experiência do profissional naquela situação. “É o mais importante, mesmo que a experiência tenha sido negativa. Quando alguém é pessimista, mas tem conhecimento que pode acrescentar, vale a escuta ativa”, pondera Célia Senna. “Às vezes, a verdade é que não deu certo mesmo e não porque ele não quisesse, mas porque alguma condição não permitiu. Então, ouvi-lo também é importante para o desenvolvimento da ação”.
O tom dessa conversa deve ser tranquilo, nunca de imposição. Além de ouvir, vale trazer sugestões que podem ser caminhos para o educador está apontando como problemáticos. “Falo que é importante experimentar porque podemos estar falando de uma outra escola em uma realidade diferente ou mesmo da mesma em outras variáveis de contexto. Mas é um diálogo, vamos conversando, esclarecendo e pensando em como avançar no assunto”, conta Iran. Nessa conversa, ele esclarece as motivações da proposta e os resultados esperados e, se muitos da equipe não concordam, pede para refletirem sobre a ideia e voltam a conversar dentro de alguns dias para discutir a melhor solução para a questão. Quando fica visível que se trata de estar em uma posição mais confortável para o professor individualmente, Iran procura dar visibilidade para as consequências que virão se não for feito. “Trabalho a questão de que a escola não tem que se moldar às necessidades individuais do professor, mas é ele quem precisa se moldar às da escola. E se fica combinado, vamos fazer. Temos que ser flexíveis”, fala.
Entender resistência ajuda a aproximar
Ao se aproximar do educador e colocá-lo como um agente experiente que pode colaborar com a proposta, as desconfianças iniciais sobre a proposta podem ser quebradas e desaparecer. Cabe avaliar até onde a discussão deve ser feita no momento, publicamente, e quando é hora de parar. A exposição do educador pode desgastar a conversa e dificultar seu engajamento na atividade. “Quando o professor vem com muitas questões ou quando percebo que ele está nervoso, evito discutir no grupo. Chamo ele para conversar sem pressa em outro momento”, diz Willmann Costa. E não é para dar bronca, diz. “Volto a falar sobre o tema, mas tentando entender em que posso ajudá-lo”. A reação pode ser também uma consequência do estresse e do sentimento de estar sobrecarregado – ou ainda estar associado à sua trajetória com experiências negativas em relação a mudanças em outras gestões. Ao se colocar à disposição, o profissional se sente acolhido. “A melhor ferramenta do diretor é ouvir”, considera Willmann.
É importante não jogar a culpa nem acusar professores ou funcionários mais resistentes a mudanças – seja numa conversa coletiva ou individual – por algo que não deu certo no passado. “Ao fazer isso, eu o afasto, em vez de aproximá-lo”, diz Célia, com sua experiência de formadora. Segundo ela, a pergunta “Por que essa pessoa é resistente?” deve ser feita a si mesmo. “Será que a formação dele, no curso de Pedagogia ou licenciatura, o preparou para mudar? Será que a formação continuada deu conta de suprir as necessidades dele para colocar um projeto assim de pé? Será que ele não teve apoio em outra ocasião e ficou sobrecarregado? É preciso se perguntar para ampará-lo e dar subsídios para a mudança”, aponta.
Decidido que a ideia sairá do papel, envolver as pessoas mais resistentes a mudanças pode ser um bom caminho para mostrar que a transformação a partir daquela proposta é possível. No entanto, colocá-lo em uma posição de protagonismo do projeto pode expor o educador, caso não se saia tão bem e até mesmo colocar uma proposta a perder. O ideal é colocá-lo com um par já experiente no tema ou uma pessoa que se sinta mais confortável com a proposta para apoiá-lo no desenvolvimento do projeto.
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