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Que heranças sua escola está deixando para as próximas gerações de alunos?

Por vezes, optamos por soluções mais imediatas para atender os problemas e necessidades da escola. Mas a longo prazo, o que estamos deixando para os nossos alunos?

POR:
Camila Zentner
Crédito: Porvir/Rodrigo Zaim - R.U.A Foto Coletivo

Adultos geralmente estão preocupados com o futuro das crianças. “O que você vai ser quando crescer?”, perguntam frequentemente. Quando a criança dá trabalho, logo questionam: “o que será da vida desse menino?!”. E assim vão prevendo médicos, advogados, artistas, professores, jogadores de futebol entre outros tantos futuros que consideram bem-sucedidos ou não – além de casamentos, filhos, viagens e toda uma vida...

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Na escola não é diferente. Nela também estão preocupados com o futuro de cada um e, às vezes, também fazem suas previsões. Mas o fato é que, independente delas, os educadores não medem esforços para garantir que as crianças tenham sucesso adiante, já que, para muitos, a escola pública é a única oportunidade para um futuro melhor.

Infelizmente, o futuro não necessariamente se dá da forma que a gente almeja. Lançamos a semente, mas não sabemos como (nem quando ou mesmo se) vai germinar. O que pode ser uma angústia, mas também pode, por outro lado, ser uma grande possibilidade de sonhar e vislumbrar o que queremos para nossos alunos e – por que não – para as próximas gerações.

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Com a correria da escola, talvez você possa não perceber, mas suas ações de hoje podem trazer belos frutos lá na frente. Nem sempre temos paciência para esperar, queremos soluções imediatas para resolver os problemas. Desejamos que todos se alfabetizem rapidamente, sejam respeitosos, excelentes em Matemática, que saibam ouvir e esperar a vez para falar, que não briguem, não sofram... E, por não encontrar ações que tenham esse efeito instantâneo, geralmente nos frustramos. Às vezes, até resolvemos a urgência do momento, mas não alcançamos o objetivo esperado a longo prazo.

Crédito: Porvir/Rodrigo Zaim - R.U.A Foto Coletivo

A decisão de olhar para um futuro mais amplo
Há cinco anos, quando decidimos trabalhar a partir de uma gestão democrática, percebemos, a duras penas, que tudo que desenvolvíamos demorava muito tempo para surtir o efeito esperado. Tínhamos a sensação que para cada passo que dávamos à frente, voltávamos dois para trás. Afinal, tanto crianças quanto adultos não aprendem de uma hora para outra a participar efetivamente das decisões de um coletivo, por exemplo. Ser responsável e autônomo em suas ações, levantar a mão para pedir a palavra, aceitar críticas e ouvir opiniões diferentes das suas é uma aprendizagem que leva tempo. Apesar das dificuldades, cada vez que estudávamos mais sobre aquele ideal de escola e sociedade, aumentava nossa certeza de que era necessário seguir com esse trabalho.

Diante da pergunta: como formaremos cidadãos que sejam críticos e ativos na vida futura, se não proporcionamos desde pequenos o exercício da representatividade, do diálogo em busca do bem comum e não só do individual? Começamos a estruturar ações que poderiam nos ajudar a chegar no resultado. Primeiro, criamos o Conselhinho, um conselho formado por representantes de sala desde a pré-escola. Eles se reúnem periodicamente para participar junto à diretora de decisões da escola. Cada representante tem que realizar uma conversa prévia com sua turma, pois no Conselhinho só poderão ser discutidas as reinvindicações da turma a qual representa, nunca opiniões pessoais. Dessa forma, aos poucos, crianças vão aprendendo a participar, saber dos seus direitos e deveres, localizar canais de fala e escuta entre outras coisas... é um processo continuo: retomando, explicando de novo, fazendo junto com as crianças, com os novos professores que chegam, com as famílias...

Sendo o futuro imprevisível, não conseguimos ter a certeza de que uma ação como essa pode contribuir para fazer toda uma sociedade melhor. Contudo, acreditamos que ela por si só já faz da escola um lugar mais acolhedor e pertencente a todos, já que melhora as relações no ambiente escolar, desenvolve valores como respeito, responsabilidade e autonomia, busca alternativas de melhoria do espaço, das formas de aprendizagem, convivência... e isso basta para continuarmos nossa gestão democrática.

Crédito: Porvir/Rodrigo Zaim - R.U.A Foto Coletivo


As heranças das crianças para os futuros alunos
Nesse movimento de dar voz as crianças, elas também nos surpreendem com essa vontade de querer deixar algo melhor para as futuras gerações. Há um tempo atrás, uma turma de alunos dos 4º e 5º anos, ao discutirem possibilidades de criar novos espaços de estudo dentro da escola, encontraram em um barranco aos fundos de uma sala de aula, um lugar que poderia ser transformado.

As crianças fizeram vários projetos para ocupar o local e escolheram, por votação, o melhor desenho, que seria transformar parte do barranco em um “Bosque de Leitura”! Ali poderiam ler histórias, estudar e conversar com amigos, ao som dos passarinhos, embaixo da sombra de uma árvore, comendo até fruta no pé.

Aos finais de semana os professores, pais e alunos cavaram, capinaram, plantaram árvores e deixaram o espaço do jeitinho que planejaram. As árvores eram ainda pequenas mudas, vão dar frutos só daqui alguns anos. Também não há sombra, nem um grande tronco de árvore para recostar e fazer suas leituras. Mesmo assim, a turma toda vibrou muito com a conquista.

Eles não tiveram a oportunidade de usufruir do bosque como sonharam, uma vez que era o último ano de muitos deles na escola. Não importava, estavam felizes com o que realizaram e o bem que deixaram para todos os alunos da escola, inclusive aqueles que ainda estavam por vir – isso bastava para eles.

No fundo cada um de nós sabe, desde o momento que escolhemos essa profissão, que vale a pena o trabalho que realizamos. Ele não é pequeno, tampouco sem efeito, como às vezes, pode parecer. Fazemos diferença na vida de muitas pessoas, sem ter a dimensão de quantas, já que o que se faz hoje na escola, pode beneficiar estas e outras tantas lá na frente! Não esmoreça, não se deixe sucumbir pelas pressões do dia a dia, das frustrações. Não deixe de seguir adiante, independente do que o futuro guarda para nós. Mantenha-se alegre, contagie quem está a sua volta, faça do presente um lugar melhor para ficar e gerar as heranças que a gente quer deixar na escola e quem sabe por onde mais! Termino com a força e as palavras de Paulo Freire: “A esperança não é um cruzar de braços e esperar. Movo-me na esperança enquanto luto e, se luto, com esperança, espero.”

Um abraço,

Camila Zentner

Camila Zentner Tesche é formada em Pedagogia com especialização em Educação Infantil pela Universidade de São Paulo (USP) e está na coordenação pedagógica da Escola da Prefeitura de Guarulhos Manuel Bandeira há nove anos. A EPG atende a Educação Infantil e o Ensino Fundamental I e, desde 2015, faz parte do mapa de escolas inovadoras do MEC.

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