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Que tipo de experiência os gestores têm proporcionado aos professores?

O diretor Cláudio Neto fala sobre a percepção da equipe docente sobre os gestores e do reconhecimento da profissão na história da Educação Básica brasileira

POR:
Cláudio Neto
Crédito: Getty Images

Assim como muitos colegas que atualmente exercem a função de gestor escolar, eu iniciei a minha carreira na Educação como professor. Esta fase da minha trajetória profissional durou 16 anos. Dela, eu guardo boas e más recordações. Arrisco-me a dizer que muitos colegas se tornaram gestores por inspiração de excelentes profissionais que cruzaram os seus caminhos. Comigo, também foi assim. Inspirei-me em alguns exemplos, mas reconheço que aprendi também com aqueles que eram o contraexemplo de uma prática inspiradora. Sobre esses eu dizia a mim mesmo: se eu não agir desta maneira e não cometer esses mesmos erros, eu serei um bom gestor.

Ao longo da minha carreira docente me deparei com gestores de perfil mais burocrático e gestores com práticas que conciliavam os aspectos administrativo e pedagógico. Os de perfil burocrático demonstravam ser responsáveis apenas pelas atividades-meio do processo educativo e demarcavam a clássica divisão do trabalho em administrativo e pedagógico, de modo que a eles cabia apenas administrar. Já aqueles que tinham melhor compreensão da natureza do trabalho da gestão escolar assumiam que lhes cabia também a corresponsabilidade pela atividade fim da Educação. Eles, portanto, se ocupavam da tarefa de assegurar o pleno desenvolvimento do educando, conforme reza o Artigo 2º da Lei 9.394/1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

O gestor tem sido reconhecido na história da Educação brasileira?
É inegável a existência de um discurso que valoriza a função de gestor escolar no Brasil. Ele existe desde os primeiros trabalhos do saudoso professor José Querino Ribeiro (1907–1990), especialmente com o texto intitulado “Introdução à administração escolar”, publicado em 1968. Apesar disso, se reconhece que ainda há uma escassez de estudos a respeito da natureza desse cargo e de sua importância no processo educativo – mesmo a atuação do diretor sendo considerada uma variável intraescolar quando se analisa a qualidade do trabalho educativo.

A função do gestor é socialmente valorizada. De acordo com o professor Vitor Henrique Paro, implica em maior responsabilidade na hierarquia da organização escolar, à qual cabe assegurar um dos direitos sociais mais importantes da cidadania.

A fim de conhecer um pouco o perfil dos gestores escolares da cidade de São Paulo, eu fiz uma pequena pesquisa entre professoras/es para saber o que elas/es pensam da atuação desse profissional. Para isso, os professores responderam a quatro perguntas que foram enviadas por e-mail:

  1. Qual é a percepção que você tem do/a gestor/a escolar?
  2. Quais características são importantes para o exercício dessa função?
  3. Você acha que o cargo de gestor/a é importante na escola? Porque?
  4. Que tipo de problema você já enfrentou com os/as diretores/as de escola com os quais já trabalhou?

O que pensam as/os professoras/es?     
Sobre a percepção do gestor escolar, as respostas variam consideravelmente. Uma professora relatou que passou por experiências distintas e que, na sua percepção, o gestor “é uma pessoa mais distante da parte pedagógica. Alguns por terem muitas questões burocráticas para resolver e outros por desinteresse mesmo. Essa distância gerava uma sensação de vazio, lugar não ocupado, em alguns momentos”. Por outro lado, esta mesma professora afirma que “havia também aqueles que eram assíduos, porém, em alguns casos essa presença significava mais controle do que parceria e apoio”.

Para outra professora, as características de um bom gestor é saber escutar a todos (independentemente da sua posição na tribo), reconhecendo a importância da participação de todos no processo de construção daquela comunidade e conseguir compartilhar sua sabedoria pelas suas falas e pelas suas ações”. De maneira semelhante, uma terceira professora acha que o gestor escolar “deve se colocar no papel de líder, sempre com a intenção de aumentar e estimular o crescimento de seus colaboradores e alunos. Acompanhar o desenvolvimento de atividades junto aos professores e alunos”.

Em relação às qualidades de um gestor/a, foram destacados: a escuta, o respeito às instâncias de decisão da escola; o trabalho afinado com o pedagógico e a autonomia aos parceiros da gestão; a discussão dos problemas da escola e de possíveis soluções com todos da equipe docente/gestora e estudantes de tempos em tempos; e a abertura para novas experiências de ensino e aprendizagem.

Todas as pessoas que responderam à pesquisa disseram que o cargo de gestor escolar é muito importante. A justificativa é de que “dependendo da visão dessa pessoa sobre Educação e da habilidade de lidar com as pessoas, toda uma escola pode se transformar. Gestores despreparados adoecem pessoas. Gestores parceiros enchem de força e empolgação para continuar o trabalho”. Por conseguinte, a maior parte dos entrevistados compartilha da ideia de que as questões administrativas e pedagógicas devem coexistir na prática desse profissional, como informou uma professora ao afirmar que a função do gestor “vai além de questões burocráticas e financeiras. Creio que seja um cargo desafiador, uma vez que ele precisa estar em contato direto com coordenadores, professores, alunos, pais e fornecedores, etc.”

Um professor respondeu que a função do gestor é “fundamental para a organização, funcionamento e sucesso de uma escola. Pois ele é o grande articulador entre a comunidade e a unidade escolar, a escola e parcerias externas, organizador e facilitador de um espaço propício para a construção de projetos que surjam dentro da escola”.

O que tenho a considerar
A gestão escolar não é apenas uma função a mais a ser exercida na escola. Isso fica evidente nas respostas dos professores. Ao contrário, ela se constitui em um campo de saberes com fundamentos e princípios voltados para a organização da escola, bem como para a elaboração e sistematização de conhecimentos didático-pedagógicos que orientam o sucesso escolar dos estudantes. Esse campo de saberes preserva a sensibilidade e tem feições democráticas, pois como afirmou um professor, o gestor deve ser “democrático e promotor de democracia; mediador; crítico; inovador e que realmente acredite e se engaje na Educação. Um humanista, acima de tudo”.

Em suma, a gestão escolar é responsável pela administração competente da escola, sendo que esta é, aqui, compreendida como “a utilização racional de recursos para a realização de fins determinados”, como definido por Vitor Paro. Com isso, é possível assegurar às crianças, jovens e adultos o acesso aos conhecimentos veiculados e/ou produzidos na escola.

De acordo com as percepções dos professores entrevistados, a construção da autoridade do gestor passa a ser uma grande questão. Pelo que apuramos, os fundamentos dessa autoridade dizem respeito à legitimidade da liderança, a qual passa pela capacidade de articular os aspectos administrativos e pedagógicos. Além disso, é necessário considerar uma dimensão política da função da gestão escolar que consiste na construção coletiva de uma proposta educativa.

Esses postulados da boa gestão reluzem em muitas escolas no Brasil. Não são poucas as unidades educacionais – especialmente as da rede pública – que têm buscado a inovação pedagógica como alternativa para superar as dificuldades geradas pela frágil e deliberada política educacional que vigora há muito tempo no Brasil. O que essas escolas têm em comum é a presença de gestores que compartilham da concepção de gestão aqui considerada.

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  1. Planejar bem

Não basta apenas fazer relatórios e apontamentos sobre as aulas dos professores, o coordenador deve saber também como comunicar com qualidade e a frequência com que deve fazê-lo. Por isso, planejar reuniões semanalmente garante o acompanhamento constante do projeto pedagógico e formação dos professores, abrindo espaço para a escuta destes e suas próprias reflexões. As reuniões também permitem o aprendizado coletivo, ao se discutir e compartilhar o que acontece na escola e nas disciplinas com toda a equipe docente. Caso costume trabalhar com planejamento mensal ou bimestral de formações, é sempre importante revisá-lo e adaptá-lo de acordo com o que é observado semanalmente. Vale checar se algum ponto, por exemplo, precisa de maior tempo para ser aprofundado ou se os professores já mostraram dominar determinado tópico nas formações anteriores.

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  1. Dialogar também com a comunidade escolar

Para poder formar bem os professores, o coordenador deve dialogar igualmente com funcionários de apoio, alunos, pais e responsáveis. O respeito pela diversidade e boa comunicação possibilita criar um ambiente harmonioso para todos. Com a experiência adquirida ao trabalhar com cada faixa etária e classes diferentes, o coordenador prioriza as diferenças de aprendizado de cada aluno e pode desenvolver com o professor novas estratégias educativas que respeitem essas diferenças. Assim, o coordenador pedagógico deve fazer cumprir o papel social da escola. “Desenvolver uma prática pedagógica que resulte na aprendizagem significativa das crianças e jovens requer o envolvimento de toda a equipe escolar nesses processos, de modo a constituir comunidades de aprendizagem”, afirma a professora Marli Eliza.

PARA SABER MAIS

PARO, V. H. Administração Escolar: introdução crítica. 16. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

PARO, V. H. A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 36, n. 3, p. 763-778, 2010. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ep/v36n3/v36n3a08.pdf. Acessos em 15 de agosto de 2019.

RIBEIRO, J. Q. Introdução à administração escolar. In: TEIXEIRA, A. S. et al. Administração Escolar. Salvador: Anpae, 1968, p. 17-40. 

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